Capítulo XXV - Convocatória

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             O Duque de Lerna viu as notícias com desconfiança, seu rosto era impassível durante o conselho de guerra.
 
             Valtryek estava lá, junto dos condes de Duyrn, Dewfort, Sagrief e Dentestrela(um novo), e também dos duques de Tregônia e Messaria, o rei esbravejava com fúria.
              - COMO ESSE MALDITO BASTARDO CONSEGUIU ENTRAR EM VESTROYA E MATAR MEU FILHO E TANTOS GUARDAS?! QUERO QUE O HOMEM DELE CAPTURADO SEJA TORTURADO SEM SER MORTO, QUERO QUE ELE DEFINHE POR TRINTA ANOS!- Berrava batendo na mesa, o gordo e incapacitado demônio estava louco de dor.
            Nenhum dos nobres tinha qualquer coragem de o enfrentar, não parecia que qualquer um deles arriscaria ter a cabeça saudando os imigrantes vindos pelo Portão de Trigendolf. Mas Valtryek era uma exceção.
            - Vossa Graça e meu senhor, peço paciência e uma análise fria, sei que a dor da morte de um primogênito é inigualável...- Seus filhos estavam mortos, mortos naquela cada vez mais amaldiçoada guerra. - Ainda temos notícias boas que podem acalentar seu coração tomado pela perda...-
             Henfrid não respondeu por um bom tempo, mas pareceu se acalmar. Cerrou os punhos com força, mas cedeu com uma boa taça de vinho para acalmar os seus nervos.
             - Diga-me, diga-me qualquer motivo para afastar de minha mente a perda de Erlokyn.- Seus lábios tremiam, e Valtryek sentiu uma pena inestimável pelo amigo, por mais que quisesse ele próprio ter matado o príncipe.
             O novo Conde de Dentestrela, Azren da Estrela, se adiantou para dar as notícias. Era um homem corcunda e narigudo, sua boca tinha dentes em falta mesmo que ainda não tivesse passado dos trinta anos.
            - Vossa Graça, a Princesa Aranya foi recuperada durante o ataque à Vestroya, ela esteve participando dos ataques com o odioso bastardo provavelmente sob coerção.
               " Coerção? Ela ama aquele rapaz mais do que amava o irmão, imagino que foi um sacrifício..." Com Anya em casa, queria saber oque ela via naquele rapaz, queria saber o porquê dele conseguir aliados mesmo entre os seus inimigos.
                 - Anya será recebida discretamente, não quero nenhuma cerimônia levando em conta os rumores. Porém, quero que uma estátua de Erlokyn seja construída ladeando o portão para o palácio, acompanhada por uma estátua minha.- Essas eram as ordens, e ninguém se atreveu à contrariá-las, mesmo que os cofres reais não estivessem bons o suficiente para estátuas grandiosas.
                 - E como fica Vestroya, meu senhor? Temos uma guarnição forte por lá, quinze mil legionários, mas é necessário um comandante...- Disse o Duque de Tregônia, era o mais sensato dentre todos aqueles covardes ou estúpidos. Apesar disso havia sido derrotado por Darkus Darkrym perto de Duyrn, oque lhe tirara credibilidade.
                 - Mandarei Valtryek, creio que ele saberá manter a cidade que conquistou. Recomendo que a mantenha à qualquer custo, entende? Não perdoarei mais nenhuma falha...- O rei ameaçou, mas Valtryek viu a verdade que faltava ali.
                  O rosto do Duque de Lerna se endureceu, mas sabia que seria bom voltar à ativa, mesmo que sem o seu exército. Era duro, seu próprio amigo estava tentando fazer suas tropas esquecerem dele.
                   - Levarei como escolta um séquito de quarenta, não precisam ser legionários. Quero também o bruxo...- Exigiu o duque, as nobres pareciam incrédulos com esse ato desrespeitoso.
                    O Rei Henfrid pareceu ficar furioso, ao ponto de só conseguir aceitar a exigência com um mero aceno rígido de cabeça. Valtryek não esperava nada mais do que isso, fez uma profunda mesura e se retirou.

                   - Você forjou um rei em Aledrac, meu senhor, mas terá a chance de o enfrentar em Vestroya. Vê como os deuses levam os acontecimentos para rumos irônicos como esse?- Comentou Tyesgard, enquanto cavalgavam calmamente fora da cidade.
                    Estavam próximos das grandes lavouras de Trigendolf, no exterior das grandes muralhas ao redor. Atravessaram também o portão secundário, pois o Alto Portão só era aberto para receber hostes ou as liberar, tão grande era que demorava para ser aberto e novamente trancado.
                     - O que quer dizer com forjar um rei? Eu matei dois naquela batalha, Gerald de Elizaet e o Rei Aledracos, ou pelos menos matei com ordens. Cavalgava com roupas simples de lã, preparava sua comitiva para partir. Tyesgard trazia sua habitual gaiola, mas agora cheia de corvos.
                    - Darkus Darkrym se tornou uma real ameaça, ameaça que vai crescer mais e mais. Você o forjou ao dá-lo uma Vontade em Aledrac, também colocou uma Marca entre ele e seus soldados. Também uniu você e aquele garoto sob uma outra Marca.-
                     - Marca e Vontade? Não venha com esse tipo de termo, bruxo, não sou conhecedor deles e não gosto de me sentir estúpido.- Repreendeu rispidamente, o Duque de Lerna franziu a testa. O bruxo deu uma risada maliciosa.
                   - Não foi minha intenção, meu senhor, posso lhe explicar. Na magia, existem dois poderes distintos que podem ser usados por seres não intencionados na magia, são esses a Marca e a Vontade. A Vontade é o desejo de uma alma, é sua determinação e oque ela quer, essa Vontade move o indivíduo e o torna quem ele é. Há indivíduos com Vontades mais fortes do que outros, e isso dependente unicamente de sua bravura.-
                " A Marca é o resquício de uma Vontade, já que da Vontade surgem as magias. Uma relação, gerada pela Vontade, pode ser considerada uma Marca, já que esta forma um elo entre dois ou mais indivíduos. Uma Marca pode conferir características mágicas para algo e até interferir na Vontade, sentimentos entre duas pessoas podem ser uma Marca e podem interferir em seus desejos."
                  Valtryek parou um tempo para pensar, sentiu o farfalhar da grama e das poucas árvores errantes. Fechou o punho enquanto segurando as rédeas de seu cavalo, um animal grande e forte para aguentar seu peso e armaduras.
                  - São apenas nomes esquisitos para coisas comuns... não sou estúpido por não os conhecer.- Concluiu Valtryek, um tanto de forma precipitada. - Quero os escravos preparando minha nova armadura, entrarei em Vestroya com ela no corpo.
                     Tyesgard sorriu e o fitou longamente, seu sorriso se intensificou por um momento e, talvez para disfarçar, o bruxo fez uma mesura. Gritou isso para um criado junto com algumas ofensas e o pobre coitado foi de pronto obedecer.
                     - Isso será feito, meu senhor, sua armadura será vista como mais inexpugnável do que qualquer castelo. Os Homens vão ver o grande Senhor de Lerna em seu auge, sob toda sua glória....- Enalteceu, e Valtryek fez pouco caso dessa bajulação, esporeou o cavalo e saiu à trote. Ouviu o mago o seguir, como sempre com seus olhos atentos.
                     - Tens alguma ideia do que vai fazer quando chegar em Vestroya? Para quem irá pedir reforços?- Perguntou o bruxo, curiosamente ávido.
                    - Não haverão reforços, creio eu, com o grande exército tendo sido retido em Trigendolf. Não há outras regiões disponíveis, mas pretendo buscar alguns reforços pequenos.- Declarou o Duque de Lerna, sua barba negra balançando enquanto cavalgavam pelo campanário, chegaram nas terras de uma plantação de cevada e de uma de trigo.
                   - Há uma outra legião, cuja participação na guerra ainda não começou. Eu poderia a convocar, é a Legião de Villia.- O tom de Tyesgard era ansioso e sedento, como o de um homem faminto ou mergulhado em abstinência.
            - De que tipo de legião você está falando, bruxo? Não gosto da forma com que você fala...- Até o demônio sentiu medo, se afastou e percebeu que o mago descobriu seu temor.
            - Do tipo mais poderoso, do Poder Antigo e esquecido pelos monstros atuais em função das armas dos Homens. Não somos Homens, somos uma Horda...a memória de Saheer deve ser preservada, e eu tenho algo do poder dele...-
               O braço vermelho se ergueu para o alto, e os corvos se agitaram dentro da gaiola apontada para cima.
               - O que é você?- Perguntou Valtryek, sem parar o seu cavalo, sentiu seu rosto se torcer em uma face de surpresa.
                 Tyesgard gargalhou e entoou uma série de nomes estranhos, nomes que fizeram a cabeça do demônio doer. Os corvos ouviram isso e alçaram voo para cumprir qualquer busca que tivessem sido designadas.
                - Maetrix! Gaetrix! Cthelion! Villia! Sallor!- Crocitaram as aves negras, indo cumprir desígnios seu mestre maligno. 
                - Respondendo sua pergunta, meu senhor...eu sou Tyesgard de Villia. Um bruxo e detentor das artes ocultas e do passado esquecido, pois eu SOU esse passado!- As escleras dos olhos do bruxo se tornaram negras e profundas, suas pupilas viraram brancas e opacas, por entre os dentes de seu sorriso malicioso escapava um líquido preto semelhante à sangue.
                  Valtryek havia se aliado à um mal que não conhecia o poder e que não poderia domar. Mas era sua última esperança, não venceria tudo isso sem ele.

 
                   
       
            

A Coroa do Domínio - Livro DoisOnde histórias criam vida. Descubra agora