Capítulo XXXI - Batalha de Vestroya: Parte Três

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          Dentro e fora da cidade, a batalha ardia e parecia que as hostilidades estavam em seu auge. Ou pelo menos, perto do estouro total do barril de pólvora.

              Os cavaleiros galoparam ardentemente pela ponte de pedra. Era um caminho muito mais largo do que o imaginado, pavimentado com paralepípedos e ladeado por parapeitos altos de um metro de altura. Pilastras tão grossas quanto torres sustentavam a ponte na qualidade de vigas, construídas à partir da rocha nas encostas do abismo, os rochedos castanhos já ocultos pela sombra e solidão, bastiões ocultos da segurança da passagem.
             Com montanhas à sua visão na direita e esquerda, toda a vanguarda se direcionou para os lanceiros que cobriam a frente. Eram legionários segurando grandes escudos retangulares, ostentando uma grafia desconhecida por Darkus e o símbolo de uma serpente de duas cabeças. Suas lanças eram longas e destinadas à parar os cavalos, sua formação de escudos parecia tão consistente quanto a que enfrentaram na subida do monte.
                 - Às lanças!- Ordenou Darkus, enquanto se aproximavam, flechas cortaram o ar em sua direção e foram vistos homens nas muralhas circulares da cidade. As ameias estavam atulhadas de arqueiros e lançadores de dardos, e a cavalaria quase fraquejou, os cavalos caíam e a formação tinha que saltar sobre os aliados caídos para prosseguir.
                   - Darkus! Cuidado!- Aella o fez se abaixar e agarrar o dorso do cavalo. Uma nuvem rápida pareceu passar ocultando o céu, e rodopiando velozmente uma grande pedra atingiu homens atrás com um estrondo. O bastardo olhou para cima e viu uma catapulta já sendo preparada para um novo tiro.
               " Eu não estava errado em crer que eles iriam com tudo que tinham...." Pensou o bastardo, entregando a lança para uma Aelin confusa. O rapaz puxou Trono de Ossos da bainha novamente, a espada negra reluzindo na expectativa, o cabo esquentava muito rapidamente em sua mão.
                - Você pretende usar uma espada contra os lanceiros? Parece tolice...- Aelin o censurou, mas Darkus não respondeu de imediato. No momento do choque, Darkus se protegeu com o escudo triangular e ergueu a espada acima da cabeça antes de a descer com toda a força em um arco, como quem golpeia com uma maça.
               Uma lança entalhou seu escudo, outra atingiu dolorosamente em um dos ferimentos já feitos por Erlokyn e uma arrancou um bom pedaço de carne de seu cavalo. Mas a espada...pareceu que um raio havia atingido os legionários, defesas se partiram e demônios voaram contra as muralhas ou abismo ao fundo.
               - Se eles estão usando tudo que possuem... então também use seus truques...- Darkus disse, meio risonho e arfante, sentia o cansaço e a dor em cada parte de seu corpo. Aella cuidou de o ajudar à ficar no cavalo, e Aelin e Boros lutaram vigorosamente em seu lugar por um tempo.
              Darkus olhou para explosões vivas de chamas estourando ao lado, e impactos jogando homens de armas contra os parapeitos ou escuridão. Direcionou seu olhar para Aella, que portava Trono de Ossos para derrubar todos os adversários do próprio senhor da espada.
               - Não se adequa à mim...é muito pesada e trás uma sensação um tanto esquisita. Como você consegue carregar ela tão levemente?!- A cavaleira exclamou durante os golpes, Darkus reparou que a espada nada emitia enquanto Aella a portava.
                 " Parece que a espada se acostumou com um senhor...." Pensou agradecido, colocou o elmo novamente depois do descanso e de enfaixar o pescoço do cavalo. Esporeou e foi até a amiga, a ajudando ao cravar uma lança no peito de um errante.
                   - Suponho que queira essa coisa de volta, senhor, não faz meu tipo...- Ela arremessou a arma na direção do bastardo, que a agarrou e sentiu o calor retornar.
                   - Não faz o tipo da maioria das pessoas...- Riu-se, e retornou para a batalha com força total. - Preparar o aríete! Lançar escadas! Avancem os arqueiros!-
                Os soldados na ponte, eliminados ou reduzidos, não puderam fazer grande coisa à não ser implorarem para que os portões fossem abertos à sua passagem. A maior parte dos cavaleiros os ignorou e começou à esperar a vinda dos imensos troncos de madeira.
                Os portões rangeram no primeiro golpe, mas não cairiam com a mesma facilidade dos do Forte Cinzento. Flechas e óleo se seguiram, e após três golpes a arma estava entrando em chamas, foi despejada no abismo rapidamente e substituída por outra. As duas forças trocaram nuvens de setas e dardos, e as catapultas disparavam inutilmente e apenas avariando de forma pouco eficaz a ponte.
                 - Atacar!- Ordenou Adelard, e foi atingido dolorosamente por uma flecha no braço, mas sua ordem foi cumprida. O aríete golpeou mais uma vez, e por mais duas vezes o aríete lutou até ser incendiado, soldados perderam a paciência e arrombaram a porta em pedaços com a própria força.
                 - Segunda barreira trespassada...chegou a hora de entrar em Vestroya!- Ordenou, os homens próximos jubilaram e se uniram para usar o terceiro aríete para arremessar fortemente contra os muros, os mais habilidosos tentaram escalar as muralhas através do tronco mesmo quando as escadas de corda foram lançadas.
                 Os milhares de cavaleiros, no entanto, voltaram à cavalgar vigorosamente pisando os destroços do portão. Darkus foi com eles, e deixaram as muralhas sendo atacadas vigorosamente pelos invasores que subiam às ameias. Estavam em um campo verde à alguns metros de distância entre os muros e as primeiras casas, mas já vinham monstrios para os parar.
                - Não desistam! Lutem pela honra do nosso povo, pela união do exército! Vamos recuperar a ponte!- Exclamou Darkus Darkrym, e os soldados gritaram seu nome em resposta. O jovem estufou o peito e deu um grito de guerra, os cavalos empinaram e as lanças apontaram para o céu em saudação. Duzentas trombetas voltaram à soar, pois o exército estacionado no Forte Cinzento vinha se juntar à batalha com a passagem pela ponte liberada.
                 Adelard de Hangleton sacou sua espada e gritou pelo nome de seu senhor, e avançou com sua armadura dourada para a luta, não foi mais visto até o fim dela.
                Os monstrios começaram à quebrar quando centenas de homens emergiram do fórum, e com eles estavam elfos lançando magias. Agora os cavaleiros começavam à derrotar a tentativa de interceptação, e o Bastardo de Primavera os incitava à avançarem.
              Aparou um golpe de machado usando sua espada negra, e liberou uma nova carga de energia que arremessou seu adversário e outros oponentes muitos metros além. Se virou para um morimbundo que tentava o apulhalar e o rasgou de cima para baixo, mas a pequena lâmina forçou entre os anéis da malha cinzenta.
                - Estamos chegando ao fórum pelo visto, meu irmão, seria bom que chegássemos antes que Baltair seja morto..- Comentou Aelin, também estocando com sua lâmina curva.
                - Não sei se há necessidade de grande pressa, afinal temos novos aliados chegando...- Murmurou Boros, o velho já parecia exausto e ferido, mas não desistia de acompanhar o exército.
                   O Bastardo de Primavera virou a cabeça para a frente e viu, entre as chamas que começavam à brotar por todas as construções ao redor do centro, uma companhia de lanceiros chegando com o estandarte de Cromwell. As trombetas soaram avisando a chegada.
                  - Os dois exércitos se encontraram... conseguimos....- Murmurou Darkus, a batalha estava ganha àquela altura. Em êxtase, ergueu a espada para o alto e incitou o avanço, logo estavam irrompendo os últimos homens no caminho e passando pelo parapeito que dividia a cidade dos campos amarelados, chegaram às ruas de pedra e às casas onde os cidadões se refugiavam.
                 A guarnição começou à lutar nas ruas agora contra o exército de Darkrym e de Cromwell, e a luta seguia frenética nas vielas e praças da velha Vestroya. Darkus marchou com seus homens na direção do fórum com determinação, atropelando qualquer um que ficasse no caminho.
                Chegaram na praça do fórum em meio ao pandemônio, pois agora a guarnição da Fortaleza Aredhel havia recuado para se reunir com a da cidade, e agora combatiam determinados. Os jardins e a piscina quadrada eram manchados de sangue, e homens lutavam na entrada do fórum, os mortos rolando pelas escadarias e os duelistas combatendo para subir os degraus de ardósia.
               Outros brigavam entre as grandes colunas de mármore, brancas e pretas em uma bela alternância cheia de desenhos e histórias, que sustentavam o teto plano e retangular e ofereciam uma distração da estrutura vermelha. As portas do fórum estavam escancaradas, feitas de bronze e pouco seguras nas dobradiças.
                 Perto dele quem lutava era uma criatura monstruosa, e os homens fugiam dele. Sequer montava um cavalo, mas em sua armadura parecia ser maior do que um homem montado, as placas negras eram feitas de noite e seus arabescos brilhavam rubros emitindo luz como se estivessem em brasa. Não havia uma única parte descoberta pelo metal, e o elmo era aterrorizante com suas três fendas horizontais para os olhos que não mostravam nenhuma expressão, os chifres brotavam do elmo e dois círculos vermelhos queimavam em brasa enquanto a fera erguia a maça e atacavam com monstruosidade um escudo e arrancava a madeira da estrutura.
                  - É o Duque de Lerna! É o Duque de Lerna!- Gritaram soldados em fuga, enquanto todos no alcance de Valtryek de Lerna eram lançados aos ares apenas com a força bruta.
                  " É claro que é o Duque de Lerna..." pensou Darkus, cerrando os dentes e focando a visão totalmente no monstro de trevas. Ouviu um grito de aviso e, quando foi se virar, o cavalo relinchou de dor e o chão veio beijar o bastardo.
                   Caiu estatelado no chão pavimentado, seu cavalo morto por uma lança e vingado de imediato por algum homem de armas. Darkus fez uma tentativa de se levantar e identificou cabelos vermelhos ao longe e, para seu horror, viu o homem morto nos pés da escadaria do fórum.
                   Aeron Cromwell jazia com o peito esmagado por um golpe de maça, e sangue cobria sua testa se misturando de forma aterrorizante com os cabelos ruivos. Seu tabardo da águia era uma ruína rasgada, sua capa protegia o chão de sua ruína. Viu Azuria ali, refletida em Aeron, o irmão da mulher que amava estava ali estirado morto.
                  - Valtryek de Lerna!- Berrou Darkus Darkrym, se levantando do chão e erguendo o escudo e a espada. Ficou cara à cara com o demônio, olhou para sua face coberta e Valtryek olhou para a sua.
                  - Rapaz de Darkrym... talvez se o mundo fosse diferente...- Lamentou o duque, e logo depois se preparou para o combate. Fogo brotou dos dois círculos na base de seus chifres, e uma galhada flamejante se formou. Pareciam os galhos de uma árvore crescendo, tomando ramos que se estendiam e paralisavam até formarem uma galhos inteiros em brasa.
                 Darkus correu até Valtryek e aparou seu primeiro golpe de maça, o desastre foi imediato. O carvalho rachou e o braço do jovem doeu horrivelmente com o impacto, o escudo do próprio duque golpeou o queixo do oponente e o lançou longe. Um segundo golpe da cabeça de ferro errou por pouco o bastardo cambaleante.
               Darkus Darkrym desviou de um terceiro golpe e se abaixou para escapar de um quarto, o quinto golpe acertou uma pilastra do fórum e a deixou com um rombo tão grande quanto o de um canhão. Darkus aproveitou e golpeou com força o peito do duque, o choque do poder foi forte e o gigantesco monstrio urrou de dor.
                A maça atingiu o escudo terminou de o estilhaçar, as lascas de madeira voaram para todo o lado, aves castanhas fugindo do inverno naquele céu azul cada vez mais sangrento. Mas não havia inverno, o calor que cercava o Duque de Lerna era atordoante, sua presença emitia a sensação de se estar dentro de um forno. Darkus cambaleou e desferiu um novo golpe no ombro do demônio, ele dessa vez revidou com um golpe de maça que fez o crânio do rapaz doer como se tivesse se partido.
                  - Você matou meu sobrinho, rapaz, e eu não posso te deixar ficar com Vestroya. Terei de pedir desculpas à Anya...- Murmurou, perturbado, antes de golpear Darkus e o jogar contra uma pilastra.
                  -  Não vai precisa dizer nada à Anya...ela se sacrificou para que estivesse aqui e eu não vou falhar. Anya é uma pessoa muito melhor do que você!- O bastardo cuspiu as palavras, ofegante e sentindo dor.
                Valtryek girou a maça na mão, e parou perturbado antes de tentar atingir Darkus. As chamas em sua grande galhada se enfraqueceram e ele parecia querer dizer algo, mas logo depois sua fúria voltou e as galhadas se tornaram mais firmes do que nunca, florescidas em um inferno.
                - Eu sei que é...- Murmurou, como quem atingido por um golpe mais cortante do que o de uma espada.
                 Darkus Darkrym aparou o novo golpe com sua espada, mas dessa vez não fraquejou, se desvencilhou e golpeou novamente Valtryek no peito com toda a descarga de energia. Sentiu sua mente se enevoar completamente, mas creu que valia à pena quando em meio aos gritos de batalha ouviu o Duque de Lerna cambalear e se deixar cuspir sangue. Os gritos da batalha também eram um som presente, e pessoas caiam com baques surdos, o rapaz pensou escutar a voz de Aella no meio do pandemônio preocupada em algum combate solo.
                  Valtryek voltou com fúria redobrada, e novamente cruzaram golpes. Darkus recebeu o escudo contra o peito e o cabo da maça contra o braço quando Valtryek fez um golpe em arco com sua cabeça como destino.
             O bastardo passou por todos eles e olhou com os olhos vermelhos à flamejar, firmou a espada nas duas mãos e golpeou Valtryek onde já havia atingido antes. Sua espada percorreu o vento e a lâmina negra se enterrou profundamente na armadura, e ao invés de apenas atingir o demônio por dentro com seu impacto, o gume escuro se enterrou no metal e se separou quando o impulso fez o monstro cambalear. Os joelhos do demônio fraquejaram após alguns passos para trás, o gigante se dobrou e seu corpo derrotado caiu por cima dos degraus do fórum. Estava derrotado.
                 Darkus se aproximou dele e tirou o elmo, exausto. Segurou a peça e jogou longe, mirando o duque com seus olhos vermelhos vibrantes. Ergueu a espada acima da cabeça com as duas mãos, sério e prestes à executar o homem morinbundo, sentia seu corpo exausto e prestes à cair no chão.
                 - Olhe para mim...veja os meus olhos...- Ordenou, e Valtryek obedeceu. A espada desceu em arco, e a visão do Bastardo de Primavera escureceu, ouviu um grito de dor e nada mais viu além do total breu antes de apagar.
               
              
           
 
        

A Coroa do Domínio - Livro DoisOnde histórias criam vida. Descubra agora