Capítulo XIV - Os Peregrinos Verdes

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                  - Somos enviados pela Rainha Miya de Matarubra, Aethehyl, cavalgamos das nossas matas até Hyldren nos cavalos mais rápidos que Rowandir pôde nos oferecer. Uma companhia deles, liderada pela Rainha Eonora, foi quem nos deu notícias dos Homens.- Foi oque disse o líder do grupo, cujo nome era Anahein e o título era "O Darlo".
                     Raeron não gostava de ser chamado por um nome que não conhecia, mas ignorou. Eram elfos, e o príncipe os estava recebendo à luz da tarde no exterior de Hyldren, pois eles só quiseram falar sobre sua demanda depois de comerem.
                     - Me despertou muito o interesse a informação sobre o Bastardo de Primavera, já conhecido pelos elfos...- Continuou Anahein, depois de um gole da sua bebida élfica chamada verdejante. - Mas também tínhamos algo à cumprir, um dever de centenas de anos que permanece mesmo depois da Grande Traição.-
                      Alguns elfos cuspiram no chão gramado à menção dessa "Grande Traição", entre eles estava o chamado Yros, um caolho com cabelos prateados e pele branca, tinha dons mágicos e não gostava de humanos. A cabeça de Raeron fervilhava de dúvidas, essas ele resolveu tirar logo.
                    - O que querem com o Bastardo de Primavera, senhores? Ele foi para Aledrac e lá lutou, e talvez lá tenha morrido. E à que se referem com...Grande Traição?- Perguntou realmente curioso, esquecendo-se do dever para com ele.
                     Yros franziu as sombracelhas, era um elfo bonito como a maioria dos elfos, tinha uma pele quase tão branca quanto seus cabelos e seu único olho tinha uma cor azul e brilhante.
                      - A Grande Traição é algo que deveria ser lembrada pelo seu povo sujo até o seu último homem ser devorado por vermes. Os elfos foram amigos dos homens há séculos atrás, quando os homens depois de escurraçados do Sul pelos monstros foram cobiçar nossos reinos.- Sua voz era carregada de ira, como se isso tivesse sido feito contra si. - Caçaram nosso povo dentro de nossos próprios reinos e mataram milhares, tudo isso durante quase meio milênio! Arrancavam orelhas e às vezes...os olhos...dos que torturavam...- O elfo hesitou, e voltou à abaixar os ombros.
                      Raeron ficou boquiaberto, mais pela maneira que Yros contou do que pela história. Já a conhecia, mas esse nome era dado pelos elfos em seu ressentimento justificável. O rapaz se sentiu com remorso mesmo não tenho tido culpa alguma.
                      - O passado ficou no passado, ao contrário de nós que vivemos séculos os homens que fizeram isso estão mortos. Os humanos vão pagar sua dívida, mas alguns já recuperaram seu título de "Amigo dos Elfos", entre eles estão os hyldreanos que vivem no antigo reino do Aethehyl. Aethehyl significa "Rei do Rio" e foi o título dos reis élficos do Rio Relâmpago.- Contou Anahein, calmo e ponderado.
                       Os elfos, com exceção de Yros, passavam essa ideia de calmos e ponderados. Também eram cheios de saber, apenas uma conversa com eles podia deixar uma pessoa com a cabeça doendo de tanta informação sobre o passado. Eles viviam o passado, afinal chegavam facilmente aos trezentos anos de idade.
                      Raeron os havia convocado para fazer sua reunião no exterior de Hyldren, pois não se considerava ainda digno de entrar na cidade sem ser coroado. Montara uma mesa de madeira na grama, cheia de comida e bebida, apesar dos elfos tomarem apenas sua verdejante, um líquido de cor verde e gosto de menta e framboesa. Era a bebida favorita dos elfos e dos homens que os conheciam e deles tinham a amizade. Dos doze elfos, Raeron só tinha o nome de cinco: Anahein, Yros, Kiodan, Merendil e Raelora.
                       - E o que vocês querem comigo, senhores élficos? O que os trazem até Hyldren?- Raeron se recordou dessa pergunta após um clima desconfortável na mesa.
                         Foi Kiodan quem respondeu, o chamado Navegante, era o segundo elfo mais velho e possuía uma barba dourada e olhos cor de mel. No lugar de seu antebraço direito tinha uma magnífica prótese de ramos de madeira negra que funcionava como um membro normal, aquela demostração de magia deixou os homens de Hyldren inquietos.
                      - Normalmente a passagem por Hyldren seria apenas um banquete antes de seguirmos até algum passo nas Montanhas da Noite. Mas há uma profecia sobre um homem coroado como Aethehyl por elfos, e ele terá um navio que será uma espada marinha.-
                     - Uma profecia, senhor? Profecias geralmente são errôneas, e podem ser mal interpretadas. Tem certeza que....- Raeron não gostava de ter importância, a Coroa de Hyldren era somente seu dever.
                     - Sim, uma profecia feita há muito tempo e transmitida oralmente entre nós. Você é o rei, sentimos isso e nossa rainha o sentiu também, e então será coroado antes do navio ser colocado no mar. Estará pronto até o fim do inverno e zarpará para onde quiser, o destino lhe trará um propósito.- Foi oque Anahein disse, e bebeu boa parte da taça de verdejante.
                   Raeron Draegys ficou em silêncio, olhando incrédulo para o elfo. Ele ainda vestia a coroa de louros da madrugada anterior, e não parecia alterado pelas altas doses da bebida alcoólica. Ele tinha um anel dourado em cada dedo indicador, mas o da mão esquerda tinha uma pedra azul em forma de losango e o da direita um quadrado verde.
                    - E por que eu tenho de partir? Eu acabei de derrubar meu primo e recuperar Hyldren...eu não posso deixar meu povo sozinho. Os asgaetinos estão para cair, e quando isso ocorrer eu resistirei com Hyldren.- Soou um pouco arrogante, mas isso provocou reações variadas nos elfos. Yros murmurou indignado, Kiodan ficou boquiaberto e Anahein riu.
                      - Você vai descobrir um motivo para fazer oque deve fazer, e não abandonarás teu povo. A guerra não acabou, o Bastardo de Primavera uniu povos e agora tem um exército no Sul, e com isso é a esperança dos Homens. Você tem a oportunidade de levar Hyldren à guerra, e assim uma Aliança pode se formar.-
                      - Não entendo, os elfos geralmente não tem interesse algum nos interesses humanos, são isolados. O que mudou isso? O ódio pelos monstros?- Raeron olhou ao redor e recebeu uma taça de verdejante de Kiodan, bebeu sem questionar. Sentiu a garganta queimar e a visão clarear, era forte.
                       Anahein ficou sombrio, perdendo o tom descontraído. Kiodan desviou o olhar, Yros pareceu ter um arrepio e Merendil afagou a barba ansiosamente. Os outros elfos murmuravam entre si.
                     - Há algo sombrio por trás dessa guerra, Aethehyl, muito sombrio. Os monstros não são uma raça de trevas, ao contrário da crença, mas agora...algo maligno se ergue no Sul e fez seu baluarte em Trigendolf.- O elfo parecia com medo. - Essa coisa corrompe os monstros, assim como Maegoth e Saheer, os Altos Reis dos Monstros, formaram sua Horda.-
                       Raeron não conhecia o nome de Maegoth, mas Saheer era o nome da criatura cujos restos mortais jaziam aos pés do Forte Cinzento em Vestroya. Pensou por um longo tempo, recluso em sua própria mente a colocando para funcionar sob combustível de verdejante.
                       Deu sua resposta e então se ergueram da mesa, Emisrath foi trazida do navio até o campo.
 
                      - Raeron da Casa Draegys, Filho de Harion, Herdeiro de Vhagar, Senhor do Relâmpago e Rei de Hyldren...eu, em nome de todo povo élfico, começo a cerimônia de coroação...- Proclamou Kiodan, cuja família era a mais nobre entre todos. Seu ancestral forjou a própria Emisrath, e também projetou o Palácio de Tregon.
                     O rapaz estava ajoelhado vestindo roupas humildes, uma mera túnica esfarrapada e nenhum adorno. Estavam à beira do rio, todo o povo de Hyldren havia sido convocado para ver.
                      Anahein foi até o rio e encheu duas garrafas com a água do rio, uma delas misturada com verdejante e vinho aledraco e a outra com água pura e límpida. A límpida foi derramada sob a cabeça de Raeron, molhando seus cabelos.
                      - Assim como o sangue em seu corpo, o Rio Relâmpago corre velozmente e trás vida, rei. Mostre isso, mostre que é como o rio.- Foi oque Kiodan disse, e o Rei de Hyldren permitiu que abaixassem a manga da túnica e cortassem a palma de sua mão.
                       Seu sangue foi jogado ao rio, e a corrente o levou até que se dissolvesse e seguisse com ele. Agora parte de Raeron era o rio, o juramento estava quase completo.
                      - Bebei-vos, bebei o rio!- O cantil lhe foi levado aos lábios, e prontamente Raeron o bebeu. - E agora és, incontestavelmente, Aethehyl! Aethehyl en Hyldren!- A maioria dos elfos seguiu o clamor, e algumas pessoas também o fizeram.
                       Aethehyl, sob o clamor de seu novo título, montou em um cavalo que lhe foi indicado. Hesitou ao segurar as rédeas, mas esporeou a montaria.
                      Entrou na cidade à galope, não mais como rebelde mas sim como rei. Era o Rei do Rio.

A Coroa do Domínio - Livro DoisOnde histórias criam vida. Descubra agora