O dia do meu pesadelo chegou, eu estava impecável naquele vestido, Tia Bertha choraria se me visse daquele jeito. Eu ansiava pela presença dela nesse casamento, queria a ver ali sentadinha enquanto eu dizia as palavras que eu não queria. Eu precisava de um rosto familiar ali.
-Você está linda. - Olhei para o reflexo de Sam no espelho e sorri.
-Obrigada, mas eu queria estar bem feia. - Dei uma risada e me virei. - Eu pensei seriamente em sair correndo e morar no meio da mata, mas tem coisas nesse castelo que eu preciso descobrir.
-E depois? - Ele perguntou curioso com meus planos.
-Depois nós vemos o que vai acontecer. - Sorri e me sentei para terminarem de arrumar meu cabelo.
-Eu posso entrar na igreja com você, para não entrar sozinha. - O olhei feliz com essa ideia.
-Não, eu faço isso. - Arthur apareceu ao seu lado. - Ela é minha futura nora, gostaria de ter essa honra.
-Não me incomodo em entrar sozinha. mas se faz questão. - Sorri para ele que se aproximou e colocou uma flor no meu cabelo.
Me olhei no espelho e reconheci aquela flor, Tia Bertha sempre colocava várias delas no meu quarto para eu poder sentir minha mãe comigo.
-Como sabia? - Toquei a flor e o olhei. - Era a flor favorita da minha mãe.
-Essa flor é especial para mim. - Ele me olhou com um brilho nos olhos. - Vamos? Está na hora.
Todo o caminho até a igreja foi acompanhado por câmeras e por moradores locais, todos estavam ali para me ver, como se eu fosse alguém importante. E eu era, a nova princesa. Eu vi rostos conhecidos por toda parte, pessoas que eu reconhecia da escola, pessoas que iam na loja e amavam meus chás. Tinham rostos mais familiares do que eu esperava. Me senti feliz naquele momento.
Entrei nervosa na igreja, mais nervosa do que imaginei que iria ficar. Todo aquele momento pareceu estar acontecendo em um sonho e eu estava vendo de cima, Will parecia muito feliz e eu também, me surpreendi comigo mesma. Mas ninguém estava mais feliz do que o rei, ele irradiava alegria e felicidade que contagiava qualquer um à sua volta.
Por várias noites eu pensei que não conseguiria beijar Will na hora do beijo, mas aconteceu e eu mal percebi, estava emocionalmente anestesiada.
A festa estava tão linda quanto a igreja, todas as pessoas da escola estavam lá, as meninas que me odiavam pareciam me amar, os garotos que me chamavam de estranha agora parabenizaram Will pela bela esposa. Eu estava cansada daquilo.
Após cortarmos o bolo, eu me retirei e fui para o castelo, não iria aguentar por muito mais.
-Para onde está indo? - Me virei e encarei Will.
-Para o quarto, pode curtir toda a atenção apenas para você agora. - Falei tentando não ser grossa.
-Terei de aprender a dividir. - Ele sorriu e se aproximou.
-Você aprender a dividir? - Perguntei rindo. - Isso é uma piada?
-Não é piada. - O sorriso saiu do seu rosto, ele pareceu magoado.
-Eu não quero atenção. - Me virei para voltar meu caminho para o quarto e o senti segurar minha mão.
-Me dá uma chance de provar que sou bom? - O olhei e senti a sinceridade no seu olhar.
-Will, eu estou casada com você, quer chance maior? - Toquei seu rosto de leve e fui para o quarto.
Levei um tempo para tirar aquele vestido sozinha, peguei minha bolça com as roupas que eu costumava usar e coloquei uma blusa e a minha calça de moletom. Aproveitei que todos estavam se divertindo na festa e fui até o quarto pessoal da Alexa, aquele que ela não divide com o Rei.
Comecei a procurar por qualquer coisa que parecesse não pertencer a ela, olhei em gavetas, embaixo de móveis e encontrei escondido em cima da estante, um belo esconderijo para quem não sabe procurar. Puxei o pacote dali e desembrulhei, um livro que apenas bruxas conseguiam ler. O que Alexa fazia com isso?
Levei para o quarto comigo e escondi dentro da caixa de ervas que a tia Bertha me deu. Ninguém procuraria ali.
-Vossa Alteza Real, estou aqui para acompanhá-la para seu novo aposento. - Olhei para a porta e vi uma jovem que nunca esteve aqui antes. - O príncipe ordenou que eu a levasse.
-Me dê só um minuto. - Sorri para ela e me levantei, peguei a caixa e minha mochila, não abro mão de nenhuma das duas. - O que vão fazer com esses vestidos? - Perguntei ao sair do closet e me juntei a ela no corredor.
-A senhora tem vestidos novos no novo aposento, não precisa se preocupar com esses. - Ela andava na minha frente e eu ia atrás sem pressa.
-Você é nova aqui? - Perguntei por curiosidade.
-Comecei hoje e é um prazer poder servir a senhora. - Não deveria ser um prazer servir a ninguém.
-É bom ver alguém amigável por aqui, as outras estão sempre de cara fechada. - Chegamos a um quarto bem maior do que o meu era, com uma cama gigante e espaço para dar e vender. - Coloquei minhas coisas na cama e me virei para a jovem. - Como se chama?
-Emilia, senhora. - Ela olhou para baixo evitando contato direto.
-Bom, Emilia, pode ir para seus aposentos agora e ter uma bela noite de sono. - Ela sorriu agradecida. - Nos vemos amanhã.
-Boa noite, senhora. - Ela fechou a porta e foi embora, me deixando sozinha naquele quarto.
Coloquei a caixa embaixo da cama e levei minha bolsa para o closet, os vestidos dali eram muito mais bonitos que os outros.
-Os vestidos ideias para uma futura rainha. - Ouvi a voz de Will vindo da porta do closet e me virei. - Espero que tenha gostado da cama grande o suficiente para que não seja necessário dormirmos grudados, mas se quiser eu durmo no chão. - Ele fez uma cara de quem não se importa mas eu sabia que se importava.
-Não é necessário, podemos dividir a cama. - Falei me direcionando para a porta e ele se afastou para que eu passasse. - Como foi a festa?
-Não sei, sai antes de terminar, mas ainda está acontecendo se quiser voltar. - Ele sorriu e se jogou na cama.
-Estou bem aqui. - Subi do outro lado da cama e fiquei o olhando. Eu estava casada com ele e não sabia quais eram meus sentimentos por ele. Mas sabia que o achava bonito, isso não posso mentir. - Vou dormir, se você tentar qualquer coisa eu te mato.
Me cobri e me deitei virando de costas para ele. Fechei meus olhos e deixei minha mente cair em um sono profundo e tranquilo. Acordei na manhã seguinte com o sol batendo em meu rosto.
-Bom dia, senhora. - Olhei com a vista embaçada e identifiquei Emily parada na porta. - O príncipe saiu com o rei e pediu que eu avisasse que estará de volta para um almoço especial com a senhora. - Ela tinha uma voz calma e serena que me fazia ter vontade de voltar a dormir, mas eu não podia.
-Emily, preciso que você vá a um lugar comigo, mas você não poderá contar a ninguém. - Ela concordou e procuramos o vestido mais simples para que eu usasse, só que o mais simples não era tão simples.
Demos um jeito de esconder o livro na saia do meu vestido para que ninguém percebesse, utilizamos alguns lenços que deu certo, mas a cada passo que eu dava tinha medo que caísse. Procurei por Sam mas não o encontrei, ele seria a pessoa perfeita para nos levar, mas tive que pedir a outro, que o fez sem questionar. Fomos para os subúrbios da cidade, onde Tia Bertha dizia que se quisesse encontrar algum bruxo, era só procurar lá.
Assim que desci do carro os olhares se direcionaram a mim, as pessoas olhavam e cochichavam entre si, isso me deixou bastante incomodada, mas não podia fazer nada, eu faria o mesmo se visse a futura rainha aparecendo ali.
Avistei uma jovem sozinha e me aproximei dela, ela se assustou com a aproximação mas logo abriu um pequeno sorriso.
-Perdão em lhe incomodar, estou procurando um rapaz chamado Peter, saberia me dizer onde encontrá-lo? - Ela balançou a cabeça positivamente e eu sorri em triunfo.
-Procure naquele bar. - Ela apontou para umas portas de madeira de onde vinha uma música alta.
-Obrigada. - Agradeci e chamei a Emily para que fossemos juntas até lá. - Eu não entro ali sozinha nunca. - Falei baixinho perto de seu ouvido.
O bar estava cheio de homens que fediam a cerveja e vodka, não sei como conseguiam beber tanto a ponto de cair pelos cantos do bar, igual eu via um monte ali.
Avistei ele de lado e fui em sua direção, eu precisava de respostas e ele as tinha.
-Peter? - Chamei e ele se virou.
-O próprio. - Ele se levantou e fez uma reverência. - A que devo a honra da presença da futura rainha?
-Preciso da sua ajuda. - Peter parecia estar levando tudo na brincadeira.
-Quanto eu ganho por isso? - Óbvio que ele iria querer dinheiro. - Não precisa ser um pagamento em dinheiro, existem outras coisas que posso querer. - Cruzei meus braços e o encarei.
-Exemplo?
-A caixa que sua mãe deixou para você. - Como ele sabe?
-Nunca! - Falei imediatamente, não daria nada que foi da minha mãe para ele.
-Então vamos ficar com a opção do dinheiro, quero um valor que eu possa ir embora sem ter que me preocupar com dinheiro até o dia da minha morte. - Eu não tinha dinheiro nem para mim, quem dirá para ele.
-Não tenho tanto dinheiro assim. - Respondi num tom óbvio.
-Mas vai conseguir, e até lá, eu irei te treinar. - Ele sorriu e voltou a se sentar com a sua bebida.
-Como sabe? - Me sentei ao seu lado e puxei o copo da sua frente.
-Que você quer ser treinada? - Ele riu e pegou o copo de volta. - Você não sabe nada sobre o seu povo.
-Como sabe que eu vou conseguir o dinheiro? - Notei Emily atrás dele um pouco incomodada com os homens que começavam a se aglomerar em volta.
-Não sei, isso depende da sua necessidade em descobrir quem você é. - Ele bebeu o restante de sua bebida e se levantou. - Você pode começar parando de duvidar de si mesma. Primeira regra: o que uma bruxa quer, ela consegue.
-Quando começo a aprender as outras? - Fui atrás dele, que começou a andar pelo bar.
-Quando tiver pago. - Ele pegou a bebida da mão de um cara que não ousou reclamar ao se virar e ver quem foi.
-Não sou idiota, se eu te der o dinheiro, você some. Então você me treina primeiro e depois eu te pago. - Segurei seu braço para que ele virasse para mim.
-Eu dou minha palavra que não vou decepcionar você. - Peter segurou minha mão e me forçou a soltá-lo. - Palavra de bruxo.
-Sua palavra de bruxo não vale nada para mim. - Falei séria e procurei na minha mente uma forma de juramento que ele pudesse fazer. - Vamos fazer um pacto de sangue embaixo de um carvalho. - Eu li isso em algum livro que eu não conseguia me lembrar, mas foi a única coisa que me veio à cabeça.
-Um pacto de sangue embaixo de um carvalho? - Ele riu e eu me senti estúpida pela ideia. - Isso não significa nada!
-Para você! - Mantive a seriedade, não deixaria ele sentir um gostinho de satisfação. - Sei de um aqui perto.
Peter me seguiu pelos caminhos entre casas e lojas, não demorou muito para que eu encontrasse o carvalho, e eu agradeci por não ter me perdido, não fui muitas vezes até aquele lugar, apenas na companhia da minha tia. Parei embaixo do belo carvalho e tirei um grampo do meu cabelo.
-Já que não temos uma faca para fazermos um corte, teremos que usar isso. - Mostrei o grampo e fiz um furo na minha mão, que fez um pontinho de sangue. Passei para o Peter que ficou me encarando antes de fazer o mesmo.
-Você é esquisita. - Ele segurou minha mão.
-Agora prometa. - O encarei esperando pelas palavras.
-Eu prometo ajudá-la com os seus estudos bruxos. - Sorri ao ouvir suas palavras.
-E eu prometo dar o combinado depois que me ajudar. - Apertamos as mãos mais forte e as separamos para podermos nos limpar. - Agora você é obrigado a me ajudar. Começamos amanhã?
-Começamos amanhã. - Fiquei satisfeita em conseguir o que queria.
-Amanhã, aqui nessa árvore, às sete horas. - Ele disse com um sorriso, parecia estar feliz com isso.
-Estarei aqui.
Me virei para ir em direção a Emily mas parei ao ouvir Peter começar a dizer algo.
-Existem pessoas que a cercam que são extremamente ruins, mas você vai descobrir por si mesma. - Me virei e sorri já imaginando de quem ele falava.
-E você não vai me dizer porque é contra as regras. - Pisquei para ele e dei alguns passos para trás.
-Que regras? Eu não vou dizer porque não quero mesmo. Não gosto de você a esse ponto. - Ele sabia que eu sabia quem era.
-A recíproca é verdadeira.
Voltei a me virar e fui até Emily, entrelacei nossos braços e fomos de volta para o carro. O caminho de volta para o castelo foi silencioso, não podia comentar nada na presença do motorista, tenho certeza que ele contaria para a Rainha.
Ao chegarmos, Emily se direcionou para a cozinha, dizendo ir preparar algo para que eu comesse, e eu fui para o quarto tomar um banho Coloquei um pijama bem confortável, aliás, não iria fazer mais nada de importante. Peguei uma grande bolsa chique que estava no meu closet e arrumei com algumas coisas para levar na manhã seguinte.
-Atrapalho? - Olhei para a porta e vi Sam parado lá.
-Claro que não! - Sorri feliz ao vê-lo.
-Imagino que tenha encontrado o Peter. - Ele falou curioso pela confirmação.
-Sim, e irei encontrá-lo amanhã. - Sorri e pela sua expressão eu imaginei que ele fosse querer ir junto. - Sozinha.
-É claro. - Ele ficou pensativo e eu não queria ouvir um sermão. - E se acontecer alguma coisa?
-É um risco que preciso correr. - Coloquei a bolsa do lado da cama e me sentei. - Tem coisas que ele só vai me contar se estivermos sozinhos, e eu prometo que te conto tudo o que eu descobrir. Sei que é importante para você.
-O que é importante é a sua segurança.- Não insite.
-Já disse que vou sozinha.- Falei decidida, ele não me faria mudar de ideia.
-Tudo bem. - Ele falou e saiu sem dizer mais nada.
Não dei importância a isso, Peter tinha essas atitudes estranhas às vezes. Fiquei o restante do dia sozinha no quarto, Will só apareceu na hora de dormir e mal falou comigo, parecia ter tido um dia difícil.
Acordei cedo no dia seguinte, era madrugada ainda, mas Will não estava na cama, e eu não ia procurá-lo. Troquei meu pijama por uma calça e uma blusa, peguei a bolsa e sai de fininho do quarto. Minha tentativa de ser discreta foi por água abaixo assim que dei de cara com Will perto da porta do quarto.
-Lisa? Aonde vai tão cedo? - Ele perguntou estranhando.
-Por que você está acordado essa hora? - Eu perguntei curiosa.
-Porque eu sempre acordo cedo. - Ok, resposta válida. - Mas aonde você vai?
-Preciso sair, tomar um ar. - Respondi com um sorriso, e a resposta não era mentira.
-Você mente mal. - Eu disse a verdade, mas eu mentia mal mesmo.
-Que bom que sabe. Agora, se me der licença... - Tentei me esgueirar e ele segurou meus ombros.
-Lisa, aonde você vai? - Ele parecia mais preocupado do que curioso agora.
-Eu preciso sair, confie em mim. - Apoiei minha mão em seu pulso e sorri para ele.
-Ok, eu confio em você.
Will me deixou passar e eu corri para fora do castelo, comecei a caminhada até lá que levou quase quarenta minutos, e cheguei dois minutos atrasada.
-Me lembre de acrescentar pontual a sua descrição. - Peter falou assim que apareci.
-Minha descrição? - Perguntei irritada.
-E que não entende ironia. - Ele estendeu uma grande toalha de picnic e nos sentamos. - Vamos começar com o básico, o início de tudo.
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A BRUXA
FantasiEsconder o passado não é fácil, agora esconder o passado estando dentro da realeza é mais difícil ainda. A jovem Lisa encara esse desafio com todas as suas forças quando se vê obrigada a casar com o Principe Will. Em meio a descobertas sobre sua lin...