Did you miss me?

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O prédio espelhado da Scotland Yard refletia o sol quase inexistente daquela tarde. Não que fosse novidade que Londres fosse mesmo aquela coisa aguada e nublada a maior parte do ano, com garoas frequentes e o tom de cinza que tomava conta da paisagem justamente naquela época do ano. O terno cinza e a gravata azul contrastavam com os olhos que misturavam as mesmas tonalidades do chefe de Departamento de Crimes Cibernéticos daquela que era considerada uma das melhores polícias do mundo.

Louis Tomlinson não tinha do que reclamar aquele dia. Sua meia hora de almoço — apesar de não parecer suficiente para que um ser humano consiga, de fato, ter o mínimo de paz para sentar e comer — foi suficiente para aquele prato de salada e peixe de um de seus restaurantes preferidos no centro da capital inglesa. Seu celular já havia apitado o alarme duas vezes o lembrando de fazer uma ligação específica que precisava e continuava arrumando desculpas internas para adiar.

Olhou novamente a tela acesa de seu iPhone enquanto alcançava o guardanapo de pano branco para limpar a boca. Suspirou naquela mescla de cansaço e frustração: mal tinha terminado de almoçar e apenas queria aquele momento para olhar pro nada, bocejar e ficar feliz por ter feito uma refeição decente naquela semana; já que o máximo que tinha conseguido era comer um sanduíche em seu escritório, uma barra de cereal ou uma fruta qualquer.

A pressão estava chegando a níveis insuportáveis para Louis, que evitou recorrer fazer o que deveria ter feito no primeiro dia. Mas ele não era o tipo de homem que cedia com facilidade e gostava mais quando as ordens partiam dele mesmo. Mas um mês já havia se passado e o caso não estava nem perto de ser resolvido. Nas redes sociais e nos jornais já estavam chamando o famoso hacker de "Limpador", por literalmente estar limpando contas bancárias de três bancos diferentes usando apenas o serviço de internet banking das próprias agências bancárias. Mais do que um profissional, estavam lidando com um homem que tinha descoberto uma maneira de apagar completamente seus traços digitais.

— Tomlinson. — Ele atendeu o celular rendido à situação. Ele baixou os olhos e massageou as têmporas e, mesmo sem querer, deixou transparecer na voz a pouca vontade de atender.

— Estava aguardando sua ligação, agente. — A voz do outro lado da linha ele conhecia bem. Seu chefe, o superintendente Oliver Declan, igualmente parecia impaciente e não prestando muita atenção no fato de parecer estar sendo inconveniente.

— Eu sei, senhor. — Ele respondeu mais respeitoso dessa vez. — A reunião com a equipe está marcada para amanhã a tarde, será bem-vindo caso deseje estar presente. — Ele disse fingindo uma cordialidade que na verdade deixava clara a obrigação de convidar apenas. A última coisa que ele precisava era de seu superior presente na reunião que ele presidiria para atualizar sua equipe sobre os progressos no caso do Limpador. Obviamente ele não fazia ideia do que iria dizer.

— Não tenha dúvidas que estarei lá. — Declan não fez questão de esconder a pressão na voz naquele momento. Louis mordeu a parte interna da bochecha e sentiu a refeição, mesmo que leve, remexer em seu estômago.

Antes que ele pudesse se despedir, ouviu seu chefe desligando do outro lado da linha. Ele levantou da mesa de canto em que estava, numa parte mais iluminada do restaurante, ajeitou o terno fechando o primeiro botão e a gravata antes de andar até a saída do local. Ele passou a mão pelo rosto assim que o ar gelado tocou sua pele e arrependeu-se de não ter trazido seu cachecol, mesmo que o caminho até o prédio da polícia metropolitana da Inglaterra fosse há poucos metros de onde ele estava.

Já estava na Scotland Yard há quase cinco anos como chefe de departamento e, apesar da seriedade e até da frieza em determinados momentos que não se relacionavam apenas com o pré-requisito que a profissão pedia, ele era muito querido dos colegas de trabalho, apesar de seu círculo de amizades pessoais ser bem menor e restrito do que aparentemente todos pensavam. Contava nos dedos — de uma mão só — as pessoas em quem confiava.

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