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O restante da manhã havia passado como um borrão estressante e corrido, com dois casos novos; a finalização do acordo pré-nupcial do terceiro casamento da ricaça Sra. Stevens, que fizera questão de estar presente enquanto eu fazia os termos – o que me custara muito mais tempo do que o normal para terminar devido as histórias que ela me contava sobre seus casamentos anteriores e sobre como este iria ser completamente diferente –, mas que no fim acabara sendo um tempo muitíssimo bem aproveitado e que colaborou para que eu desconstruísse o pré-conceito que havia firmado sobre ela. Tivera também a tentativa de otimização do meu tempo, substituindo meus horários reservados para trabalhar no caso do Sr. Watson para o caso dos pais que gostariam de adotar, que ficaram mais do que felizes em ir até o escritório no início daquela tarde, mesmo sendo muitíssimo em cima da hora.

Quando menos notei, já passava de uma da tarde e eu sequer havia conseguido almoçar, o que me forçou a pedir um delivery com uma porção generosa de salada e salmão grelhado, com um copo de chá preto batido com gelo e limão, que eu fiz questão de comer na tranquilidade do terraço do prédio. Faltava mais ou menos uma hora para o horário em que havia combinado a reunião com os futuros pais e eu me permiti tirar esse tempo para pegar um café na cafeteria localizada no térreo do complexo da NYCLC, enquanto respondia as inúmeras mensagens em meu celular e fumava tranquilamente um ou dois cigarros nesse intervalo de tempo.

O vento morno da tarde levava consigo o peso do estresse causado naquele início de dia, mas deixava o resquício da tensão em meus ombros, que não apenas doíam, mas que pareciam queimar a cada movimento que fazia.  Mas ainda assim eu tinha plena consciência de que não eram os imprevistos do trabalho, o meu chefe como sempre sendo escroto ou o meu almoço que havia atrasado que me causavam tal estresse... entretanto, eu me recusava a dar devido crédito ao real causador da minha inquietação.

O cappuccino, que havia pedido para viagem devido ao copo de plástico reutilizável que a cafeteria havia lançado como promoção para futuros pedidos, havia se tornado o par perfeito para a nicotina que faltava em meu organismo. Dupla, esta, que viera a calhar mais que oportunamente com a notificação que chegara na minha barra de mensagens, sinalizando que minha irmã mais velha havia escrito para mim.

"Mana, não querendo me intrometer em sua vida, mas já fazendo... Acho que seria uma boa você ligar para a mamãe. Ela está surtando desde sexta-feira quando não recebeu a sua ligação."

Porra, a ligação semanal... Eu havia esquecido por completo da ligação semanal que deveria fazer para minha mãe em troca da paz de espírito que eu tanto buscava em Nova Iorque.

"Ugh... em uma escala de zero a dez, o quão ruim está a situação?" respondi, fazendo uma careta de desgosto enquanto digitava a mensagem.

"Vinte, eu diria. Ela estava considerando pegar o primeiro voo até NYC se não recebesse notícias suas até o fim do dia..."

"Vou ligar para ela agora mesmo. Obrigada pelo aviso!"

"Uau... isso tudo é medo de acordar na manhã seguinte com a mamãe na porta, maninha? O que você tem aprontado aí pela costa leste para não a querer pelas redondezas?"

Tenho transado com um homem casado... e, pior, sofrido por ele. Pensei eu.

"Você sabe que não precisa muito para Tisha Puente surtar. Sem falar que tenho trabalhado bastante e mal tenho tempo para mim."

E não era exagero. E obviamente eu não havia esquecido de fazer aquela ligação simplesmente de graça... Tudo o que eu menos precisava era conversar com a minha mãe enquanto minha consciência pesava por estar de coração partido por um homem casado.

"Foi o que falei para ela. Mas não posso julgá-la pois tenho certeza de que agiria igual caso Ana Paula, Paco ou Santi decidissem ir para o outro lado do país. Aliás, eles sentem sua falta, sabe... os seus sobrinhos."

Let me love youWhere stories live. Discover now