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Querido diário, a faculdade é um inferno propriamente dito.
Subtraia todas as coisas legais que vemos em filmes (como festas, bebidas, pegar todo mundo...), e você estará preso dentro de um pesadelo.

Era quase sempre assim, mas sempre existem exceções. você pode achar que festas de faculdade são um clichê, e elas são mesmo. Todas as sextas, um dos grupos de veteranos cedia seu apartamento e dava uma festa. Imagine as festas de faculdade que você vê nos filmes e substitua as drogas por mais bebida e o sexo por karaokê e verdade ou consequência - não que o sexo nunca acontecesse, mas era raro.
Essas eram as festas da CTU, e só de ter lido "karaokê", você deve imaginar que eu estava em todas.

Sobre Alexa, ela se mostrou uma colega de quarto com uma presença bem marcante, literalmente. Ela enchia o quarto com música e o cheiro de incenso e creme de cabelo estava impregnado. Apesar disso, lidar com ela era fácil, não conversávamos muito na época e nossos horários não batiam. Sempre que uma chegava no quarto, a outra já estava dormindo, mas havia algo nela que eu queria desvendar, ela era um livro que eu queria muito ler.

Meus horários também não batiam com os de Angelo, então se tornou ocasional que passássemos alguns dias conversando apenas o básico por mensagem e nem nos víssemos no campus. Aquilo me irritava, não porque ele era meu namorado e tinha a obrigação de conversar comigo e me dar atenção como se eu fosse um bichinho de estimação, mas porque eu sentia falta do meu melhor amigo. Eu sabia que isso aconteceria em algum momento, a separação entre o Angelo Melhor Amigo e o Angelo Namorado. Talvez eu pudesse ter evitado isso, mas não consegui. Agora eu me via precisando de alguém para contar sobre como minha turma de Ética era uma piada, e eu sabia que o Angelo Namorado não entenderia, e ele era o único que eu tinha agora. Foi assim que me vi querendo me aproximar de Alexa, principalmente quando ela começou a aparecer em todas as festas que eu estava.

Éramos colegas de quarto, o natural seria que nos conhecêssemos bem, mas eu não sabia nada sobre ela além do seu nome. Eu não tinha muita experiência em fazer novas amizades, e não sabia o que dizer ou o que fazer para começar uma conversa com ela.
Numa sexta à noite, o aparelho de som havia acabado de ser ligado. As bebidas estavam sendo servidas e as luzes coloridas começavam a substituir a habitual luz branca. Eu olhava para o meu celular esperando uma resposta de Angelo.

Você vem?
19:53✓

Mas algo me dizia que eu não teria uma tão cedo. Stories de "Graças a Deus, é sexta feira" se repetiam constantemente. Já faziam quase três semanas que eu estava ali, e não tinha conseguido nada além de umas colegas de turma e me afastar de Angelo. As primeiras pessoas a cantar sempre eram as que ficavam bêbadas cedo e perdiam a noção do ridículo, depois vinham as realmente talentosas e por último, os que estavam a uma gota de distância de um coma alcoólico, que não sabiam a letra das músicas e muitas vezes vomitavam durante a performance.
Eu ainda não tinha me arriscado, não por falta de vontade, mas por vergonha. A única pessoa que já havia me visto cantar era Angelo.

Eu estava rindo sozinha de uma apresentação vergonhosa, onde um cara tentava fazer as duas vozes de "Somebody That I Used To Know" e se perdia constantemente, quando Alexa sentou ao meu lado no sofá gasto.
— Ele não tem a menor noção do que tá fazendo com a própria imagem — ela me entregou um copo vermelho.
— Não mesmo, talvez não estivesse tão ruim se ele tivesse escolhido uma música melhor...
— Você deveria mostrar como se faz — ela me cutucou com o cotovelo, de leve — Acho que você canta muito bem.
— O que?! Como você poderia saber?
— Você canta no chuveiro.
— Não canto, não?!
— Canta sim.
Eu não sabia onde enfiar a cara. Não adiantava continuar negando. Então apenas ri, e ela riu também.
— Fala sério, você detonaria nesse karaokê. Ia ser tipo aquelas cenas de filme quando a menina quietinha revela pra todo mundo que tem um talento escondido e sofre bullying por isso.
— Então quer que eu revele meu talento pra sofrer bullying?
— Não estamos em um filme, provavelmente sua popularidade cresceria se descobrissem do que você é capaz, mas...
— Mas não estamos no ensino médio, não é? Quem se importa com a popularidade nessa altura do campeonato.
— É, quem se importa.
Provavelmente, ela não iria falar aquilo, mas simplesmente concordou comigo.
— Ainda assim — ela continuou —, acho que deveria ir lá.
— A ideia de ficar no meio de todo mundo e me expôr, sozinha, não me atrai.
— Não precisa ser sozinha, eu poderia ir com você — ela sorria, tentando me encorajar. Percebi que seu sorriso formava covinhas fundas dos dois lados do rosto.
— Por que insiste tanto?
— Por que não?
— Odeio que respondam uma pergunta com outra.
Ela riu, então levantou.
— Minha proposta está de pé. Vou estar bebendo de forma irresponsável em algum canto caso mude de ideia.
Ela saiu, me deixando com as mãos e os pés formigando para ir atrás dela e concordar com a ideia. Ao invés disso, apenas encarei a porta.

O diário de Iris - A vida não é um clichê.Onde histórias criam vida. Descubra agora