capítulo nove

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Valéria estava cansada. Ela queria deitar e dormir, mas não sabia se era a quantidade ─ que pra ser sincera não era tão alta ─ de álcool em seu organismo, ou a vontade de provocar Davi, que a fazia querer dançar a noite inteira. Mas não ia conseguir com esses sapatos. Ela havia separado um par de salto altos com tiras finas pretas. E ao contrário de sua beleza, os calçados não eram confortáveis, não para dançar no piso de cerâmica da sala da casa de Jorge.

─ Vou colocar um chinelo ─ murmurou para Bibi, que mexeu a cabeça, como se estivesse dizendo "ok".

E assim foi, nem percebeu que havia subido as escadas até se deparar com o corredor enorme. Ela tentava se lembrar onde colocou seu par de chinelos, e foi testando cada porta, até avistar a sacola de papelão no terceiro quarto. Ela andou na direção dele, nem percebendo a cama. Então caiu em cima da cama.

─ Ai! ─ Exclamou uma voz.

Valéria se levantou, encarando Eleonora. Ela podia jurar que a menina não estava ali cinco segundos atrás. E ela reparou bem na outra, enquanto Nora arrumava os fios castanhos de cabelo. Ela era realmente muito bonita. E estava usando um vestido de camurça verde, que acentuava suas curvas. Valéria não entendeu direito o que estava sentindo pela outra menina. Quer dizer, ela nunca havia sentido isso por outra menina.

─ Oi ─ a outra menina sorriu.

─ Oi ─ respondeu de volta. ─ Desculpa te incomodar, vim só pegar meu chinelo.

─ Ah, ok. ─ Eleonora sentou na cama, encarando Valéria com seus olhos castanhos-escuros. A outra menina engoliu em seco. ─ Está tudo bem?

─ Sim ─ deu de ombros. ─ Meus pés estão doendo, só isso.

─ Senta aqui.

A de vestido verde deu tapinhas no edredom do seu lado, e Valéria obedeceu. Logo começou a tentar tirar seu salto, mas estava difícil. Nora deu uma risadinha e começou a ajudar a ficar descalço. O primeiro do par saiu com um pouco de insistência, mas o segundo estava impossível.

─ Vai puxa! ─ Valéria falou, enquanto Nora puxava seu salto.

A menina estava com a perna esticada no colo da outra, enquanto segurava o outro calçado com uma das mãos. A força com que Eleonora puxou foi tanta que quando saiu, o salto voou para o outro lado do quarto. Valéria se endireitou e começou a rir junto da outra, e antes que percebesse, as suas bocas estavam conjuntas, e logo as línguas. Ela deixou o salto que segurava cair no chão.

Elas foram interrompidas por Alícia e Maria Joaquina, que fez algum comentário sobre o arquinho de arco-íris que Valéria costumava usar quando menor. Rapidamente, as duas meninas se desvencilharam, mas era tarde demais. A prima de Eleonora já tinha visto tudo. Nora estava com um semblante assustado no rosto.

─ Não é o que parece ─ começou Valéria.

─ Ao que me parece você estava enfiando a língua na garganta dela. ─ Maria Joaquina falou, se divertindo.

─ Tá, foi exatamente isso ─ a garota concordou, fazendo todas rirem.

─ Não conta pra ninguém, por favor ─ a prima da skatista pediu.

─ Claro que não ─ a expressão de Alícia se suavizou e sentou do lado da prima, a abraçando. ─ Mas você sabe que não tem problema algum, né?

─ Eu sei, ─ ela retribuiu o abraço. ─ Mas é que não estou pronta ainda, estou me descobrindo...

─ Sem problemas. ─ Maria Joaquina falou, estendendo a mão para Alícia. ─ Temos que continuar nossa perseguição.

faz de conta ➵ paulíciaOnde histórias criam vida. Descubra agora