The beginning

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S/n LeBlanc

Solidão. Desde pequena esse foi meu maior medo. Talvez pelos meus traumas de ser órfã. Ou até mesmo pela exclusão que eu sofria no ensino fundamental. A vida é engraçada, atualmente meu maior desejo é ficar sozinha e esquecer a existência de outros seres humanos. As pessoas já se distanciam de mim naturalmente, eu não preciso fazer muito esforço. Vovó diz que é culpa do meu jeito mal humorado de levar a vida, mas nem dou ouvidos. Prefiro ser autêntica e expressar minhas reais emoções do que fingir estar feliz para agradar os outros.

Eu realmente achava que nunca daria para piorar minha situação. Uma dica: Nunca diga nunca. Quando vovó descobriu o câncer eu fiquei arrasada. Percebi que existia um nível de solidão que eu não queria conhecer. Aquele de perder a sua única fonte de amor.

Eu iria perdê-la se não arranja-se o dinheiro do tratamento. Nesse momento cheguei numa conclusão drástica. Eu precisava conseguir dinheiro, independente de como e com quem. Me aliei a traficantes de drogas... Eu repassava os produtos aos clientes. A gangue sempre colocava mulheres nesse serviço, isso diminuía as suspeitas da polícia.

A merda foi eu ter me envolvido com o chefe. Ele dava encima de mim toda hora, mas eu sabia que ele era apenas um galinha safado. Só fiquei com ele para tentar aumentar meu salário e receber mais vantagens do que os outros funcionários. O que não aconteceu...

Não aguentei por muito tempo. Eu fazia todo o esforço de aguentá-lo e mesmo assim não tinha nenhum benefício. Então atingi meu limite... Fugi daquela organização criminosa.

(...)

Corri descontroladamente, o metrô estava fechando as portas. O próximo embarque demoraria mais de meia hora, seria péssimo perder todo esse tempo. É como os empresários ricos dizem, "tempo é dinheiro".

Merda!Exclamei irritada. A porra do metrô foi embora! Não alcancei por dois segundos. Esmurrei o portão automático irritada. Ótimo jeito de começar o dia. Caminhei na direção do banco e me sentei inquieta batendo meu pé continuamente no chão.

— Tem um minuto?Falou um homem vestido de forma elegante com um terno cinza. Ele apoiava sua maleta preta no banco e dava indícios de que iria se sentar ao meu lado.

— Depende.— Falei o fitando. Tenho teorias do que ele possa querer de mim... Mas não vou dispensá-lo, ele parece ser rico e eu preciso de dinheiro.

— Quer jogar um jogo comigo?— Convidou enquanto alisava a maleta de couro preto.

Jogar? Que tipo jogo?— Perguntei tentando entender o que ele queria de fato. O cara abriu a maleta e mostrou o compartimento lotado de notas de 100 dólares. Meus olhos arregalaram-se involuntariamente.

— Jogue comigo. Sempre que ganhar, te darei 100 dólares.— Explicou erguendo dois cartões, um vermelho e outro azul.

— A senhorita já jogou esse jogo antes?— Questionou ainda mostrando os cartões. Apenas assenti com a cabeça.

— Se você ganhar, te darei 100 dólares. Mas se eu ganhar, terá que me dar 100 dólares.— Contou se levantando do banco agilmente. Era uma boa chance de conseguir uma grana, porém... E se eu perdesse? Não tenho dinheiro para ficar apostando.

— Não tenho dinheiro.— Afirmei encarando a parede. Claro que eu queria jogar, mas apostar é uma forma fácil de perder. Não estou num momento estável para arriscar. O homem é claramente experiente. Deve ter ganhado essas notas dos outros burros que aceitaram jogar com ele.

— Pode me pagar com o seu corpo.— Disse simples. Já esperava algo do tipo. Homens...

Analisando minha vida atual, fica explícito que ignorar oportunidades de ganhar dinheiro está totalmente descartado. Se não vou ter chances de sair devendo... Vou aceitar. Por mais nojento que seja. Pela vovó, apenas por ela.

— Certo.— Aceitei levando meu olhar até ele.

Que cor vai querer?— Perguntou balançando os cartões, um vermelho e outro azul.

— Azul.— Respondi e tomei o cartão de suas mãos.

— Pode começar.— Ofereceu dando espaço para eu arremessar o cartão e tentar virar o dele. Me curvei minimamente e joguei o cartão com toda minha força. O cartão vermelho nem se mexeu.

— Minha vez.— Avisou se abaixando para pegar o cartão vermelho. O cara jogou de forma habilidosa e virou o cartão azul com facilidade.

Ferrou... O homem começou a se aproximar de mim. Fechei os olhos precavida. Meus olhos não queriam presenciar o que está prestes a acontecer.

Senti meu rosto arder. Ele... Deu um tapa na minha cara? Que idiota! Quem ele pensa que é?

— Aí! Por que você fez isso? Filho da puta!— Reclamei indo revidar, entretanto ele bloqueou qualquer ação minha.

— Foi o combinado. Você me pagou com o seu corpo. Cada tapa vale 100 dólares.— Disse sorrindo sem mostrar os dentes. Fiz uma expressão confusa e continuei calada.

— Que cara de surpresa é essa? O que esperava que  eu fizesse?— Indagou em forma de provocação. Aquele malandro tinha feito o duplo sentido de propósito.

— Outra rodada!— Falei zangada me abaixando para pegar o cartão novamente.

(...)

Jogamos diversas vezes, perdi tanto que saí com o rosto bem vermelho. Porém... Consegui 1000 dólares! Ganhei dez vezes e devo ter perdido umas vinte. Dobrei o bolo de dinheiro animadamente e fui guardar no bolso da minha jaqueta.

— Dá para ganhar muito jogando por alguns dias.— Comentou enquanto eu guardava o faturamento.

— Gostaria de tentar?— Propôs me encarando.

— Qual o propósito disso? Você não ganha nada por bater na minha fuça.— Perguntei reflexiva. Quando a esmola é demais, o santo desconfia.

— É algum golpe, né? Mas você pegou a mulher errada. Não sou tão ingênua.— Acusei me levantando do banco. O homem fez a mesma coisa e parou na minha frente.

— S/n LeBlanc, 19 anos. Filha de mãe americana e pai imigrante brasileiro. Estudou a vida inteira no colégio Westfield. Ficou entre os primeiros lugares para cursar em Stanford, mas não entrou pelo preço da mensalidade. Os pais morreram num acidente de carro quando tinha apenas 1 ano. Desde então é criada pela avó materna, que descobriu um câncer no fígado recentemente. Não tem condição financeira para pagar o tratamento de quimioterapia e nesse ritmo a idosa mal durará 3 meses.— Narrou minuciosamente.

— Quem é você? Como sabe da minha vida detalhadamente?— Perguntei assustada. Ele retirou um cartão do bolso do terno cinza.

— Mais da metade das vagas já foram preenchidas. Se tiver interesse ligue de imediato.— Falou entregando o cartão. A frente do papel possuía símbolos geométricos e o verso tinha um número digitalizado e outro escrito à mão.

— Tem dois números aqui. Qual eu deveria ligar?— Questionei confusa.

— Ligue para o impresso se quiser participar do jogo.— Explicou saindo do local.

— E o escrito à caneta?— Falei desentendendo o sentido de haver outro número.

— É o meu pessoal.— Se virou piscando um olho só. O mesmo entrou no metrô e partiu. Permaneci paralisada processando os últimos acontecimentos.

Squid game- Louis PartridgeOnde histórias criam vida. Descubra agora