Bus stop

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S/n LeBlanc

Voltar pra casa de mãos vazias é indignante. Saber que me arrisquei por nada... Sou uma idiota. Vovó passou dias sozinha e provavelmente sofrendo de preocupação. Tudo isso para eu chegar sem um tostão. Que ódio! Em uma coisa aquele quadrado tinha razão, minha vida é medíocre.

Andei alguns metros até achar o ponto de ônibus mais próximo. Tive sorte de ter deixado uma merreca no bolso da jaqueta, era o suficiente para pagar uma passagem de transporte público.

Sentei na espera do ônibus, ao lado havia uma loja de conveniência aberta. Pensei em comprar algo para comer, mas o dinheiro não daria. Permaneci sentada observando a rua e acabei percebendo a presença de dois homens na porta do estabelecimento. Eles não me eram estranhos, fitei disfarçadamente e reconheci ambos.

Um deles era Finn Wolfhard, lembrei da apresentação no telão e de suas intervenções contra o grupo de mascarados vermelhos. O segundo era o indiano, não sei seu nome, apenas recordo da pergunta que ele fez ao quadrado.

Muito obrigado, senhor.— Disse o indiano se curvando diante de Finn, que fumava ao ver a cena. Ele agradecia por uma nota de dinheiro, pelo menos foi o que eu entendi.

— Eu não sou seu senhor, então pare de me chamar assim.— Finn afirmou ríspido. Tão delicado quanto um cavalo, eu diria.

— Desculpe. Obrigado! Muito obrigado!— Repetiu a reverência vergonhosa. Coitado desse cara, se humilhar assim por cinco dólares... E eu pensando que estava na pior.

Virei o rosto rapidamente quando o indiano andou na direção do ponto que eu me localizava. Não quero parecer bisbilhoteira. O homem sentou ao meu lado. Ele me encarava descaradamente, pelo jeito não sou a única bisbilhotando.

— Tá olhando o que?— Perguntei severa, aquilo já estava incomodando demais. O moreno piscou os olhos como se estivesse saindo de um transe.

— Desculpe! Não foi minha intenção. É que... Acho que te conheço.— Explicou meio perdido nas palavras.

— Se está em dúvida se eu sou a garota que levou uma surra de dois marmanjos antes de começar aquele maldito jogo. Sim, era eu.— Narrei sarcástica.

— Sabia que era você!— Exclamou parecendo desvendar uma charada. Continuei séria encarando a rua pouco movimentada.

— Se não for intromissão demais... Por que estavam batendo na senhorita?— Questionou de maneira formal.

— É intromissão demais.— Respondi fria.

— Desculpe! Eu não queria...— Falou demonstrando arrependimento excessivo.

— Você só sabe dizer isso? Não precisa ficar se desculpando por qualquer coisa.— Falei impaciente.

— Descul... Quer dizer... Ok.— Disse se embolando. Nos calamos e o clima constrangedor pesou no ambiente.

— Meu nome é Ravi Shastri. Qual o seu?— Perguntou puxando assunto.

— Não vou falar meu nome para um desconhecido.— Contei sem fazer expressões no rosto.

— Ah... Claro! Descul... Eita, é automático...— Explicou ao perceber que pediria desculpas novamente.

— É que minha vida inteira eu trabalhei para servir os outros. Na Índia eu sou um Dalit, a casta inferior. Aqui não foi muito diferente, afinal sou imigrante.— Contou tentando não soar triste, mas foi em vão. Assumo ter ficado com pena.

— Então não precisa ser assim comigo, também luto para sobreviver.— Falei diminuindo a firmeza.

— Nós lutamos para sobreviver... Literalmente.— Disse a última parte humorístico, apesar de não haver graça.

— Nós dois e outras 454 pessoas.— Adicionei neutra. Nesse momento o ônibus chegou. Levantamos simultaneamente e subimos no grande veículo.

(...)

Cerca de vinte minutos se passaram e o ônibus parou no local onde eu iria descer. Me levantei da poltrona e andei até o desembarque. Eu e Ravi éramos os únicos passageiros, o horário tarde justificaria esse fato. Dei meio passo indo descer os degraus, porém me virei de relance para encarar Ravi.

— S/n LeBlanc, esse é o meu nome.— Revelei ágil e saí sem esperar uma resposta do mesmo.

Desci do transporte e percorri o caminho de casa. Abri a porta lentamente na tentativa de não fazer barulho, pois vovó deveria estar dormindo. Fechei a porta de forma cuidadosa e fui surpreendida com as luzes da casa se acendendo.

— S/n! Onde você estava?!— Vovó surgiu desesperada.

— Eu precisei sair por um tempinho, mas agora estou de volta.— Expliquei retirando a jaqueta.

— Acha que é assim? Você passa dias sem dar notícias e depois volta como se nada tivesse acontecido!— Disse me dando tapas leves de repreensão.

— Quer matar sua avó de vez? Quase infartei de tanta preocupação!— Falou dramática.

— Foi necessário, prometo não sair mais sem avisar.— Contei transparecendo segurança. Eu não podia dar detalhes.

Suspirei rodeando a sala. Vamos recomeçar...

Squid game- Louis PartridgeOnde histórias criam vida. Descubra agora