MAIS UM CREPÚSCULO EM INGLESIDE

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INTERLÚDIO

Hoje, o vento de um sonho
Soprou no rouco jardim;
Ouvi um riacho medonho
Aos risos abaixo de mim.

Senti as gotículas d'água
Tamborilando-me a fronte,
Sei que o vento carrega a mágoa
Para muito além do horizonte.

Eu vi uma luz praiana
Em meio às dunas prateadas,
Onde a areia emana
A magia das noites enluaradas.

Eu vi um navio sombrio
A caminho do litoral,
E senti em meu lábio frio
Um beijo sentimental.

Caminhei novamente ao lado
Da Noite, feiticeira bandida,
Até o amanhecer dourado
Trazer de volta a alegria perdida.

Oh, vento do sonho, continue a soprar,
Pois na minha lembrança se demora
A pressão fantasmagórica a evocar
Aquele beijo de outrora.

Walter Blythe



Jem Blythe:

- Fico pensando se o pobre Walter chegou a beijar uma garota na vida.

Faith Meredith, baixinho:

- Sim, ele deu um beijo de adeus em Una antes de partir.

Rilla Blythe:

- Mas esse poema foi escrito antes disso, então devia ser um beijo fantasioso.

Susan Baker, entristecida:

- Lembro-me do dia em que ele escreveu isso, lá naquele bosque de bordos. Eu o reprimi por estar perdendo tempo enquanto Ian Flagg o desbancava nos exames de aritmética. Ah, quem dera eu não o tivesse reprimido!

Nan Blythe:

- Não chore, Susan. Todos fazemos coisas que desejamos não ter feito. Eu também costumava perturbar o Walter porque ele escrevia poesia.



VENHA, VAMO-NOS

Campos agradáveis que a primavera toca,
Repletos de sombras e da paz que ela evoca;
Ovelhas brancas repousam nos morros verdejantes,
Jardins que abundam de cores vibrantes;
Jardins antigos, prazenteiros, delicados,
Há tanto tempo profundamente amados.

Pinheiros encobertos pela neblina matinal,
Vales e praias de beleza colossal,
Brisas passageiras que ronronam e cantam
Ao lado do rio sob o ocaso encantam,
E um lugar silencioso próximo a um riacho escondido
Que abriga um sonho jamais esquecido.

Uma trilha pontilhada por estrelas prateadas,
Descendo até os prados de pastagens sombreadas,
Onde as bétulas brancas como a lua brilham
Como damas prateadas que suas harpas dedilham,
Até uma casinha onde poderei de bom grado
Viver por um tempo no passado.

E eu sentirei, enquanto caminho lentamente,
O perfume das violetas sob o sol poente,
Ouvirei quando parar à porta aberta
O chamado das ondas que nas praias desperta,
E sei muito bem que saudade não sentirei
Do beijo que no vento litorâneo dei.

A noite gentil será boa comigo,
A varanda coberta de hera será meu abrigo,
Na velha escada de pedras e no peitoril da vidraça
A esperança da juventude não se faz escassa,
E eu hei de encontrar nos degraus sob o breu
O segredo de paz que o mundo perdeu.

Anne Blythe



Doutor Blythe:

- Você estava pensando nos tempos de Avonlea quando escreveu isso, não estava, Anne?

Anne:

- Em partes... E em partes no segredo de paz que o mundo perdeu. Nada é o mesmo desde a guerra, Gilbert. Nada mais voltará a ser o mesmo.

Os Poemas dos Blythes Onde histórias criam vida. Descubra agora