Sem rumo, concentrei-me no diálogo que prosseguiu entre os rapazes.
Nathan estava enfurecido com a quantidade de animais, místicos e normais, que haviam morrido nessa invasão. A água, fria e solitária era a única parte não contaminada do cenário de horror. Tantas mortes, tanta destruição.
Não havia nada reconfortante naquilo. A penumbra já revelava pequenos brilhos estrelares. O vento pelas árvores trazia uma sinfonia melancólica.
A morte tem várias faces.
Uma delas é Enrico.
As outras? Eu estava muito perto de descobrir.
Coloquei meu capuz, e me arrependi em seguida.
A pouca visibilidade me tirou a atenção de uma armadilha que acertaria Rafael em cheio. Digo acertaria porque por instinto parei o tempo.
A lâmina lançada contra seu peito atingiria meu braço em questão de segundo. Fui imensamente irracional. Era só desviar.
Estava cansada demais para ficar muito tempo naquele congelamento temporal, mas tive que aguentar o suficiente para desviar outras lâminas que iam em direção dos outros. O tempo voltava a se mexer lentamente, eu estava exausta.
Me joguei no chão após desviar a última e rezei para que só fosse isso. Sentia o gosto do sangue em minha boca. A lâmina rasgou meu ombro e saiu pelo outro lado. Tive que puxar, e foi nessa hora que o tempo se normalizou.
No susto, os meninos se entreolharam antes de me procurarem no seu campo de visão. Caída ajoelhada cobri o ombro com a capa e fiz questão de engolir qualquer ruído de dor.
Adiantou? Obviamente que não.
- O que aconteceu aqui? - Kenny perguntava espantado olhando para as lâminas nas árvores estre nós.
- Mia... - Nathan me encarou vendo sangue no chão.
- O que você fez? - Rafael se ajoelhou na minha frente puxando meu rosto para cima.
- Me devem suas vidas agora. - respondi em um sussurro tentando parecer brincalhona e segurando a cara de dor.
- Está ferida! - Nathan exclamou vindo até mim.
- Foi de raspão. - menti.
- Não é o que parece. - concluiu Kenny com o olhar mais preocupado do mundo.
- É verdade, pessoal. Porque eu mentiria? - tentei disfarçar.
O sangue descia pelo meu braço. Era quente, não doía tanto ainda, mas logo seria insuportável.
- Preciso resolver algo ainda, vamos em frente. - sinalizei o caminho com a outra mão.
Após recusar os protestos de todos em me cuidar, seguimos relutantes e calados. Era óbvia a raiva deles para comigo. Eu não era uma boa mentirosa, e eles queriam só cuidar de mim.
No entanto, qualquer segundo que perdêssemos seria uma vitória a mais para Enrico, e eu só queria que ele apodrecesse.
Mas como era esperado, meu braço começou a queimar e latejar. Eu não tinha mais noção da minha realidade. Onde estava? Passado? Presente? Futuro?
Pelo visto, fortes emoções conseguem facilmente tomar o controle sob mim. Isso era terrível.
Devo ser mais forte, afinal, essas visões sugam muito da minha vitalidade.
Uma doce e familiar voz sussurrava em meu ouvido, e como uma escritura, pronunciava frases desconexas.
''Filha de um amor impossível, essa terra, dessa forma, foi concebida.
Destinada a recuperar o equilíbrio, a pequena estrela entregou sua vida. Não havia nela arrependimento, não havia nela qualquer dúvida, não havia nela qualquer dor. Não havia ninguém a sua volta, nenhum público, nenhum aplauso, nenhuma comemoração. Se sentiu apenas sozinha. Ascendeu e transcendeu. Não se igualou, mas superior foi.
Muitos tinham coragem, muitos tinham vontade, muitos tinham força. Mas ninguém era esse espírito de justiça. As vezes, vingança e justiça se confundem, mas ali ela os diferenciou.
Morrerá sozinha, sem aplausos, sem plateia, sem amor. Mas renascerá rainha, com uma coroa e um propósito maior que o que está escondido atrás de frívolas histórias de sangue e rancor.
Morrerá sozinha, Mia. Mas não vai sentir medo, não vai sentir a dor da vida saindo de seu corpo, não vai sentir arrependimento. Tudo se tornará nada, e o nada se tornará tudo.
Morrerá sozinha por carregar o legado, a promessa e a profecia''.
Ao menos, era essa a profecia.
Você exigiu nascer.
Eles exigiram sua morte.
A vitória era inevitável. Já as consequências da vitória...
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Uma fuga pra Floresta Branca
FantasyMia é uma jovem moradora de um universo chamado Suezul,um mundo onde existem fadas,seres mágicos e um guardião.Obrigada a uma terrível vida foge para a Floresta Branca,um lugar proibido onde ninguém se arrisca . Lá encontra o príncipe perdido (ou n...