Joaquim varreu a frente do armazém e guardou a vassoura embaixo da bancada onde ficavam algumas balas e coisas em conserva. O barulho da máquina de costura na sala, onde Benta costurava uma saia, ecoava pelo ambiente e Joaquim ligou o rádio de pilha para não ser incomodado enquanto limpava seu armazém.
Decidiu começar pelos copos, que só eram lavados três vezes por semana e a água do pote,onde eles se encontravam, já estava turva. O velho retirou os copos do pote e os colocou sobre a pia, em seguida jogou a água suja pela janelinha aos fundos, pegou mais água na torneira velha da pia e enquanto enchia a vasilha,ele começou a lavar os copos.
Cantarolava, desentoado, uma música da dupla Zeze di Camargo & Luciano quando alguém entrou no armazém. Joaquim virou-se e viu José Ludovico se aproximando do balcão.
— Bom dia Sr. Ludovico — disse o velho distraído, ainda cantarolando.
— Bom dia Joaquim — cumprimentou Ludovico, encostando na bancada.
Joaquim percebeu a seriedade na voz do homem e parou de cantar, fitando José.
— O que te traz aqui a essas horas? — Joaquim checou num relógio de parede velho que ficava na parede dos fundos do armazém — ainda nem são 8h moço.
— Quero conversar com você Joaquim — Ludovico pegou uma bala do pote a sua frente — sobre uma dívida.
— D-d-d-dívida? Que dívida? Você não me deve nada Ludovico!—Joaquim tremeu.
—Não brinque comigo Joaquim!— José tirou a pistola da cintura e colocou sobre a bancada, cautelosamente.
Joaquim ficou pálido.
—Você não me deve homem! Não deve nada! Eu não vou cobrar por essa bala...
—Eu não estou falando de bala maldito velho!—José estava ficando sem paciência—quero saber que direito você tinha de ir cobrar coisas em meu nome ao padre? Você perdeu o medo de morrer?
—Não senhor! É...eu achei...eu preciso do dinheiro...já faz três anos e eu achei que a paróquia ia me pagar.
—Você é o velho mais desgraçado e sonso que eu já conheci! Por que raios a paróquia ia comprar 15 mil reais em bebida? Em maldito...—Ludovico balançou o dedo no rosto de Joaquim, esbarrando sua pança e derrubando uma cadeira que estava ali próxima.
Joaquim juntou as mãos em suplica.
— Meu Deus! Não me mata José! Eu nunca mais vou cobrar nada...
—Agora já é tarde besta! Antoine já sabe da dívida e ele não vai acreditar que foi o Pontes.
—Mas não me mata!
—Eu não vou te matar, não assim, a sangue frio. Matar velhos que borram as calças nunca foi uma opção pra mim.
Joaquim respirou aliviado.
—Mas eu preciso ver aquele caderno que eu assinei.
—Eu posso buscar agora mesmo.
Mas antes que ele entrasse pela porta que dava na sala, Benta apareceu com um colar de miçangas nas mãos e levantou-o.
—Velha macumbeira! Sai daqui!— esbravejou José.
—Não! Sai você do armazém do meu irmão, ou eu vou soltar uma pomba gira aqui!
—Eu mato você e essa pomba gira!
Benta pronunciou algumas palavras indecifráveis para Ludovico. Ele gritou.
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Padre Antoine
RomanceVilinha é um simples povoado de Goiás, após a morte do padre Pontes, um novo padre é destinado para fazer o serviço religioso do local. Este novo padre é Antoine, um antigo morador do povoado e filho de uma das senhoras mais ricas da região. Antoine...