A Noite Que Esfriou White Lake City

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- Meu Deus... - Espacejou as palavras através da fala enfraquecida - Que vergonha...

- Você está bem?

Apesar da exclamação no tom de Serena, a amiga foi incapaz de conter o riso que escapou de seus lábios. As pequenas mãos espalmavam sobre o jeans manchado pela poeira das escadas, na tentativa de limpar os resquícios de uma memória indesejável.

April estava inibida, mas as gargalhadas de Serena dispersaram-na do incômodo. Mais tarde, se pegou ruminando sobre a vergonha ainda que tentasse expeli-lá através dos movimentos petrificados enquanto balançava o corpo.

Quando já distante de Serena, acenou para a amiga de fios cróceos recusando o convite lhe feito através dos artelhos.

O embaraço que abraçava o talhe da loira a baldava de legar seus passos.

- Por que você não tenta trazê-la pra cá?

O semblante de Serena estava confuso, seu corpo dançava rente ao de Franklin mas as vistas estavam presas na efígie encadeada de April. Girou o rosto em busca dos lábios dele exigindo uma resposta.

Franklin, por sua vez, se encontrava semoto. Até que as pupilas, antes divagadas, aterrissassem sobre a fulgência do olhar invasivo da loira a sua frente.

- Alguém chegou primeiro. - Denotou com a ponta do dedo antes de voltar sua atenção para o bar.

Serena fisgou por entre as caixas torácicas o volume que seus seios expeliram. Era a desordem de seus sentimentos que bailavam descompassadamente quando avistou Alana tocando os braços de April.

Primeiro banzou-se por avista-la ali. Depois sentiu uma queimação que lhe subiu as entranhas até que secasse a saliva da boca. Não havia nada sugestivo na maneira como elas dançavam, apenas a euforia que pincelava os lábios sorridentes da amiga de cabelos acobreados.

Recompôs a expressão desatenta quando encontrou as mãos de April acionando, seus lábios rosados deram espaço para os dentes polidos. Principalmente quando suas vistas tropeçaram no breu que a fitava de volta.

Quiçá aquela noite fosse por certo mágica. Assim como a imagem de Alana extasiou de vez o bem querer de Serena, insolitamente ao lado de fora a corrente de ar assobiava arrojadamente. White Lake City havia esfriado imperscrutavelmente.

As luzes cintilantes pesaram as pálpebras de April, o torso já estava pendido pelo relaxamento dos músculos. Alisou os olhos com as costas das mãos e chacoalhou-se boquiaberta.

- Você bebeu? - Serena indagou após se aproximar.

- Você me assustou. - April retrucou indolente enquanto o coração desacelerava compassadamente.

- Já estamos indo?

Franklin surgiu logo atrás de suas palavras, os olhos rodopiavam entre ambas buscando expelir uma reação.

- Já está tarde, precisamos ir. - Serena ponderou.

Os olhos de Harris estavam intrigados, ajeitou a gola da camisa polo antes de pigarrear e escorregar os dedos por entre o topete empalhado pelo gel.

- Serena, querida...

Pausou cautelosamente quando a sombra de Alana cercou as costas da loira que o observava concentradamente.

- Eu posso levá-las embora, caso você queira ficar.

Diferente de horas atrás, Alana soava cordial. Terminou de puxar o pano da camisa aberta alinhando-a rente ao corpo antes de guiar os olhos de Franklin de volta para o bar.

- Vamos. - Ordenou com a mão antes de distanciar sua presença com passos largos.

- Não se preocupe, querido. - Serena tranquilizou Franklin ao tocar suas mãos inquietas - Me avisa quando chegar em casa?

- Claro, minha linda Serena.

Tomou as mãos miúdas em seus lábios antes de voltar a prender seu olhar sobre as íris claras que lhe fitavam mansamente. Já do outro lado do salão, Alana enrugava os traços da face os observando.

- Obrigada... Mais uma vez.

Serena manifestou alegria apesar de seus olhos afadigados salientarem o contrário. Quando o motor do carro desligou, as vistas claras buscaram pela janela o vento que vociferava contra as folhas da Willow Tree perto da garagem.

- Ela te contou que caiu nas escadas?

Tentou conter o divertimento antes de encontrar as íris atenciosas de Alana, como uma última súplica pelo fim daquela taciturnidade imponente.

- Ela ficou tão sem graça...

Encostou a cabeça no banco e suspirou, expelindo o último riso ao buscar a morena pelo canto do olho.

Inalou o ar com protuberância outra vez, se sentia inquieta com o silêncio de Alana. Destravou o cinto de segurança e jogou o cabelo para o lado enquanto desprendia as costas do banco, urdindo sair do carro quando seus lábios moderadamente preenchidos dispararam seu desejo de ser ouvida.

- Obrigada por ter feito a noite da April melhor.

Seus dedos delicados seguraram a maçaneta do carro prontamente.

- É isso? - Alana desrosqueou os dedos da chave na ignição.

- Como assim? - Serena se virou confusa.

- É com esse tipo de moleque que você sai? - Arqueou as sobrancelhas alardeando seu desconforto.

- Eu não saio com moleques - Titubeou antes de puxar o ar e a força do seu timbre - Digo, não saio com muitos moleques, aliás, Franklin não é um "moleque"  - Esticou a pele do rosto ao arregalar os olhos - Não estou entendendo o rumo dessa conversa.

Alana diligenciou por calma quando suspirou pausadamente, batalhava arduamente contra a intolerância de seu temperamento. Não queria assustar Serena com suas inquirições impetuosas.

- Então se vai começar a sair com moleques, - Respondeu provocativa - escolha melhor.

Remexeu-se sobre o banco e entrelaçou suas vistas carquilhadas sobre a doçura cismada que exalavam daquelas íris de mel, contemplou o repouso das argumentações de Serena por breves minutos. Seus olhares provocavam atrito, mas estavam magnetizados por alguma razão.

- E o que você sabe sobre escolher alguém melhor?

- Como?

A entonação na voz de Alana fez com que Serena bulisse sobre o banco confrangida.

- Você julga o Franklin como se tivesse mais a oferecer.

Recuou imperceptíveis milímetros quando tudo o que conseguiu respirar foi a presença tão próxima de Alana a fuzilando por entre as retinas.

- E eu tenho. Ao contrário do que você pensa, eu sei como tratar uma mulher quando ela está comigo.

Percorreu o olhar espesso pelos detalhes minuciosos daquele rosto petrificado rente ao seu e Serena sentiu-se invadida pelas palavras duras sem que tivesse sido tocada.

- Pergunte à sua amiga.

O sentimento desconhecido que ferveu seu sangue expôs seu desconforto através das linhas que desenhavam o pequeno rosto. Serena não era boa em se abster de expressões faciais, mesmo quando essas entregavam seus pensamentos.

Considerou petulante a atitude de Alana, mais uma vez. Não que a exuberância com que a mesma buscava as palavras afim de afligir-la de alguma forma lhe fosse estrangeira. Alana estava menos reptante já havia um tempo, era verdade, mas a grosseria ainda estava lá.

O vento gélido que atravessava sua pele parecia confortar sua aflição, era melhor lidar com ele do que com as insolências da ex irmã. E apesar da fugacidade que suas pernas curtas encontraram naquele caminho de pedras até a porta, sentiu-se presa entre a lentidão dos ponteiros do relógio. O tempo havia corrido tanto quanto seus passos, mas em sua cabeça deitada sobre o travesseiro de penas de ganço ainda estava dentro do carro de Alana.

O Verão Em White Lake CityOnde histórias criam vida. Descubra agora