A manhã estava quente como de costume naquele mês de abril, o mormaço fazia a pele exposta de Serena arder. Mas nem mesmo a vermelhidão em resposta ao sol impediu que mantivesse o teto do carro aberto.
A velocidade com que as rodas deslocavam-se era compassada porém não refreou a direção inconstante do veículo.
Naquela rua vazia da Fifth Street apenas o pequeno jipe branco desfilava atordoadamente por entre as duas faixas.
- Serena, - Alana fez uma pausa seguida de um suspiro fatigado - você tem que ficar na faixa da direita.
- Eu estou na faixa da direita. - Retrucou enquanto uma das mãos mexia no cabelo esvoaçado pelo vento.
Alana virou seu rosto em direção a loira ao seu lado com o semblante enrugado, o sorriso discreto estava escondido na carquilha.
- Se você continuar dirigindo no meio das duas faixas pode acabar colidindo com outro carro. - Tomou o volante com uma mão e guiou-o até que saíssem da contra mão - Mantenha o carro aqui, nessa direção. - Esticou o braço e direcionou o caminho com a mão aberta.
- Não seja tão dramática, Alana.
As pupilas arreliadas de Alana encontraram aquelas íris claras lhe fitando de volta. Não havia preocupação naquele olhar desafogado; mesmo com a falta de aptidão iminente para dirigir.
- Olhos na pista. - Ordenou após desprender-se do dulçor daquele mel cintilante.
- Mas eu estou olhando pra pista! - Serena bradou impacientemente, suas mãos apertavam o volante.
- Então por que seus olhos ainda estão sobre mim? - As íris escuras procuraram a efígie de Serena pelo canto do olho enquanto continha a diversão que emanava de seus lábios.
Serena franziu o cenho em resposta e voltou seu olhar colérico para o volante.
O silêncio entre as duas era constantemente interrompido pelo barulho esganiçado dos freios em conjunto com as repreensões de Alana. Por algumas vezes, o canto dos pássaros atenuava o clima soalheiro.
- O que achou do novo visual da April?
Alana manteve seus olhos na rua, o semblante sério não expressava nenhuma reação além do olhar condensado.
- Quer que eu elogie seu projeto de barbie? - Inquiriu sem empolgação na voz.
- Bom... Não necessariamente. - As mãos delicadas puxaram os fios fulvescentes perdidos pela face.
- Então você está admitindo que ela é um projeto seu? - Alana voltou sua atenção para Serena novamente, desta vez sua sobrancelha estava arqueada.
- É claro que ela é um projeto meu, Alana. - Serena a mirou com obviedade no olhar - Ainda não respondeu minha pergunta.
- Sabe... - A morena desviou o olhar rapidamente enquanto um riso desconexo escapava-lhe os lábios - As vezes eu fico incerta sobre a benevolência de suas intenções. - O canto de seus olhos captaram as íris confusas de Serena - Serena, olha pra frente!
A loira bufou e deixou que sua frustração se materializasse em um tapa sobre o volante, o que arrancou um riso contido de Alana.
- O que você quer dizer com isso, Alana?
- Quero dizer que você controla a vida dessas meninas, não acha isso errado?
- Eu estou ajudando a April, algo que você não entenderia afinal fez pouco caso da garota.
Seus olhos castanhos demoraram para visualizar o semblante convicto de Serena, mas o debique em suas palavras já havia feito-lhe entender.
Deslizou a ponta da língua pelos lábios secos enquanto os mantinha selados afim de reter seu sorriso. Não conseguia evitar a diversão com a entonação de represália que Serena transmitia sempre que queria alfineta-la.
- O que foi? Por que está me olhando assim? - Serena olhava-a inquieta - O que é tão engraçado?
- Mas eu não estou rindo!
- Você acha que eu não conheço a cara lerda que você faz quando quer rir de mim?
O semblante enraivecido não assustou Alana, que a olhava ostensivamente. Deixou que seus dentes grandes expelissem por fim o sorriso reprimido.
- Você gostou ou não gostou do visual da April? - As vistas açodadas de Serena estavam presas em Alana.
- Por que é tão importante o que eu acho? - Contraiu a testa antes de atentar-se ao olhar de Serena - Será que você pode olhar pra frente?
- Ela é meu projeto desse ano, oras! - Esbravejou após obedecer Alana.
- O projeto beneficente da senhora Adams?
- E qual mais seria afinal? - Serena tentou olhá-la através do retrovisor.
Alana virou seu torso em direção a Serena, o olhar estava estarrecido.
Serena era boa em vencer as argumentações pelo cansaço mas isso havia ultrapassado o limite de suas habilidades comunicativas.
Estava confusa pela incredulidade de seus pensamentos e apesar da vontade de rir, manteve-se congelada no semblante enigmático.
- Você só pode estar brincando.
- Bom, não estou.
- O projeto beneficente da senhora Adams é uma arrecadação de doações para os menos afortunados. Você sabe o que isso significa?
- Alana, - Serena fez uma pausa buscando mansidão para suas palavras - achei que projeto beneficente se tratasse de ajudar alguém.
- Exatamente. Ajuda-se com doações, não brincando de boneca. - Retrucou com firmeza.
- Você sabia que construir uma imagem social também é importante? - As íris claras buscaram pela figura de Alana - Não que você entenda sobre isso, quer dizer... - Interrompeu suas palavras com um sorriso de lábios crispados acompanhado do olhar arregalado que expressava irrefutabilidade - Eu só estou dizendo que muitas doações já estão sendo feitas e April McKay precisava de minha ajuda. Então por que não torná-la meu projeto? Afinal, ele não se trata disso?
Serena estava entretida demais com sua imagem no espelho retrovisor para notar os traços aturdidos de Alana. E apesar da confusão explícita em seu olhar, não pode conter a risada anedótica que cantarolou de sua boca.
- Você precisa parar de assistir desenho Serena. - Alana retomou o ar ainda com resquícios de seu riso incontrolável - Já tentou assistir o jornal alguma vez?
- Lá vamos nós com esse assunto de universitária intelectual outra vez - Serena revirou os olhos e captou Alana através de seu olhar pregueado - Não preciso assistir o jornal, tenho todas as informações que preciso na revista que assino mensalmente.
Os olhares cruzados de ambas impediram que avistassem a placa vermelha, o que causou um impacto abrupto da cabeça contra o banco ao ter o carro freado instantaneamente.
O rosto de Serena estava escondido por entre os fios dourados enquanto suas mãos apoiavam sobre a própria cabeça.
- Serena! Você se machucou? - Seus dedos longos tocaram os ombros trêmulos da mesma.
Lentamente, a cabeça de Serena se ergueu e por entre os cabelos desordenados sobre a face havia seu olhar pudico. Os lábios estavam comprimidos.
- Está vendo por que tem que olhar pra frente? - Alana sonorizou-se predominante, fazendo com que os lábios rosados de Serena se entortassem desconcertados - Eu vou dirigir de volta pra casa, chega de aula por hoje.
Serena não gostava de ser contrariada, muito menos por Alana, mas não fez objeções ao sentar-se no banco passageiro. Suas pernas ainda tremiam e as maçãs do rosto acerejadas imitavam o carnícula que o sol de White Lake City estimulava.
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O Verão Em White Lake City
RomanceSerena Thompson é uma típica cheerleader superficial, rica e socialmente bem sucedida no colégio Conrad Bleu Liberty High em White Lake City. Mas naquele verão de 1995, Serena descobriu que tentar controlar o destino poderia acabar eventualmente mu...