Resolveu tirar o dia para visitar o seu Jair, arreou o seu cavalo e foi. Seu Jair morava numa casa branca simples, o carro dele estava debaixo da sombra de uma grande arvore e as janelas estavam abertas. Avistou dois cavalos amarrados ao poste de madeira ao lado da varanda. Foi se aproximando enquanto batia palmas e chamava por seu Jair. Seu Jair saiu para lhe receber. Parecia um pouco surpreso.
- Boa tarde seu Jair desculpe aparecer sem avisar, mas pensei em passar aqui e tomar um bocadinho do seu tempo para gente conversar.
- Ora, ora senhor Valter, mas que surpresa. Não esperava mais uma visita a essa hora. Mas já que está aqui senta e vem dar uma chupadinha – seu Jair deu um sorriso travesso enquanto mostrava uma cuia e uma bomba, o velho, como sempre, ri da graça de seu Jair.
- Não sou só eu né? Afinal tem dois cavalos aqui. Quem mais está aí? – Ao terminar de questionar apareceram os dois peões. Sebastião e Eliseu. – Ora, veja só quem eu encontro hoje, estavam sumidos senhores!
- Nós? Sumidos!? Imagina! Sempre estivemos por aqui na região, mas claro sempre ocupado e cheio de afazeres, né mesmo Tião?
- Sim, cheio de afazeres.
- Imagino, então senhores posso me juntar a conversa?
- Ora senhor Valter que cerimonia é essa o senhor é velho conhecido, por mim nem precisa pedir, né mesmo Tião?
- Nem precisa pedir.
Pedindo licença a seu Jair acomodou-se numa das cadeiras de varanda e começou a prosear juntos com os outros. O velho não perdeu o tempo:
- Ainda bem que sou bem recebido aqui. Vocês não vão acreditar, mas na loja da cidade se recusaram a me vender fiado, assim do nada! – Todos ficaram quietos e desconfortáveis com o que foi dito.
- Parou de vender para o senhor? – Questionou seu Jair.
- Sim. – Respondeu o velho enquanto dava um gole.
- Estranho! Ontem eu comprei fiado como sempre fiz.
- É verdade coisa estranha não e mesmo Tião?
- Estranho.
- Mas te contaram o motivo compadre? – Questionou Eliseu.
- Eles mesmos inventaram umas desculpas, mas me contaram que o coronel andou dando uma conversada no comércio da cidade – o velho gesticulava muito.
Os outros se olharam como se buscassem um consenso, seu Jair após alguns segundos resolveu falar:
- Pois é compadre então o senhor já está sabendo disso?
- O senhor já sabia seu Jair?
Enquanto seu Jair respondia enchia sua cuia com mais agua gelada.
- Ouvi falar, mas não dei crédito, o senhor sabe como é cidade pequena.
- Sei.
- É verdade seu Valter está um bum-zum-zum forte na cidade, mas não dei trela, não é mesmo Tião?
- Não dei trela.
- Faz sentido, mas isso não me preocupou muito. O que me chamou a atenção foi o fato do coronel contratar dois novos peões. É verdade?
- Percebe-se que o senhor anda muito bem informado. É verdade, mas o que tem demais né Tião?
Tião não respondeu.
- A princípio nada, mas o que me funde a cuca é uma dúvida, uma cisma que anda martelando na minha cabeça desde que eu ouvi o assunto. Porque diacho o coronel contratou dois novos peões de fora, sendo que tem um bocado de peão bom aqui na região?
- É suspeito – disse Tião seguido de um olhar assustado de Eliseu, e apenas com um olhar, Eliseu compreendeu tudo que Tião quis dizer.
- Tem razão Tião. Senhor Valter eu não sou de fofoca, mas como o senhor é nosso irmão de congregação, seria injusto não te avisar. Só peço, para ambos que não digam que fomos nós que avisamos.
- Tem minha palavra – disse seu Jair.
- Também a minha – disse o velho logo em seguida.
- Pois bem os senhores sabem que de vez em quando ajudamos o coronel com a lida do gado, e bem tivemos a oportunidade conhecer os dois sujeitos, né mesmo Tião.
- O conhecemos.
- Os outros peões disseram que os dois foram contratados recentemente pelo coronel, e que eram de outro estado, né Tião?
- Outro estado.
- Pensamos assim. Uau devem ser muito bons para o coronel se dá ao trabalho de tirar de onde estava e ficamos o observando, e uma coisa nos chamou a atenção.
- Não montavam bem. – Completou Tião, o velho o olhava e pensava consigo mesmo: "nossa hoje Tião está falador.".
- Isso mesmo Tião, não montavam bem e ficamos encucados. Porque também não eram muito bons nas atividades básicas, na verdade só ficaram mais é vendo do que trabalhando, na verdade não fizeram nada, estou errado Tião?
- Fizeram nada.
- Estou muito preocupado, o coronel anda tomando atitudes que me preocupam.
- Mas tem que preocupar mesmo seu Valter – falou Eliseu, o olhando mais sério e de forma intensa – seu Valter eu sei que o senhor é um homem inteligente, né Tião?
- Inteligente – concordou Tião.
- Então, o senhor já sabe o porquê do coronel fazer o que faz, não sabe?
- Éééé. Meu neto e a neta dela, pelo menos foi o que eu ouvi, e também desconfio.
- Pois eu te digo que é verdade, não sei se o senhor o alertou ...
- Alertei diversas vezes – interrompeu o velho – mas não sei se ele levou a sério ou não.
- Pois não levou, né mesmo Tião?
- Não levou.
- Certo dia estávamos eu e Tião, lidando com o gado quando vimos a dona Beatriz entrando com a égua dela num pedaço de mata. O problema é que logo atrás vinha outro, e pelas roupas me parecia o seu neto. Por curiosidade eu e Tião nos aproximamos e ali na beirada da mata os dois estavam no maior love, né mesmo Tião?
- Só love, só love.
- Vou te contar seu Valter, cada beijo que durava minuto, e a mão boba que de boba não tinha nada, né mesmo Tião.
- Mão esperta.
- E os dois estavam ali tão entretidos que nem perceberam a gente e eu acredito que ia além, mas ai alguém chamou a dona Beatriz ao longe, pararam o que estavam fazendo e ela foi ao encontro do chamado. Ela foi embora com o peão, depois de um tempo saiu o neto, mas ele não me parece que viu que tinha outro peão de olho na saída.
- Em resumo senhores, vocês viram os dois juntos, é isso?
- É – respondeu os dois.
- E o coronel já está ciente e seguindo os passos deles já faz um tempo, é isso?
- É - novamente respondeu os dois. Jair que só estava escutando ao final da história estava de olho arregalado não resistindo comentou:
- É seu Valter, me parece que o seu neto cutucou a onça com vara curta, como o senhor vai resolver isso?
- Não sei Jair, realmente não faço ideia, mas não creio que somente conversar vai resolver a merda que o guri fez.
- O fato do coronel cortar o seu crédito na cidade nem é tão estranho. O estranho é contratar dois peões de fora, e que segundo o Eliseu e o Tião não sabem fazer o serviço. Eu pergunto se não contratou para lidar com o gado para que contrataram?
Todos tinham essa dúvida, e por mais que saibam a respostas não se atreviam a falar o que vinham em suas mentes enquanto bebiam suas bebidas geladas.
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Um velho Antiquado
AventuraUm velho e um jovem, vô e neto. Após uma ligação de sua filha avisando das dificuldades que ela estava tendo para conviver com o filho ele resolve trazer seu neto para morar com ele. Em seu sítio os dois passam a viver e conviver um com o outro. Sua...