- Não tem PORRA NENHUMA aqui. - Valentino grita do meu lado.
Estávamos a uma tarde atolados em papel na secretaria, Echo tinha chegado a umas horas para ajudar, Leith estava com outro dos livros de registros na sua frente, ele também parecia cansado. Não tínhamos achado a lista completa de itens roubados, estavam entre artigos decorativos caros a armas trazidas do estrangeiro, no total estava faltando, até o momento, 36 objetos de contêineres diversos, em alguns eles só tiraram um objeto mas de outros ele tiraram mais. No começo achei que eles queriam só as armas, mas pelo visto eles tinham outros planos.
Havia mentido para os caras quando disse que não reconhecia o símbolo pichado.
Eles não tinham que saber o que significava. Pelo menos não agora.
" Droga. Eles chegaram antes do previsto. "
Itens pessoais que eu havia comprado também foram levados, itens que não estavam nos arquivos, mas que eu sabia em que contêiner iria chegar. Isso era péssimo, tinha dado um trabalho do caramba para conseguir, e agora se foram, eu não sabia como eles tinham descoberto o lugar que estariam, mas provavelmente eles tinham alguém lá dentro, terei que falar com Leith depois.
Daria um jeito nisso.
Deixo-me cair nas costas da cadeira e os observo.
Val do meu lado estava em uma posição que não favorecia a coluna, estava sentado na ponta da cadeira e suas costas no meio dela, ele tinha a mania de fazer isso quando estava entediado - ou cansado. Todos estávamos. As olheiras de Leith estavam começando a aparecer e Echo esfregava a têmpora esquerda. Acho que de todos ali eu era o menos cansado. Nenhum deles tinha o costume - ou paciência - de ficar longos períodos sentado, fora Leith que duas vezes na semana tirava para a contabilidade, nenhum dos outros dois gostavam de parar por longas horas.
Eu não me importava com aquele trabalho, não que eu gostasse de ficar parado, mas estava mais preocupado com o que foi roubado do que que horas fora minha última refeição. Mas eu sabia que eles já não aguentavam mais aquilo, então sugeri:
É melhor pararmos por hoje, ninguém aguenta mais.
Todos eles largam os livros ao mesmo tempo e se sentam para trás se encostando na cadeira.
Val olha para o teto e diz
- Obrigado. - ele sussurra - meu deus, eu não aguento ver tanta letra na minha frente.
- Como você saiu com o diploma do colégio? - digo brincando
- A mamãe me obrigou, lembra? - ele diz piscando e sorrindo, enquanto abaixava a cabeça entre os braços cruzados sobre a mesa.
Val era um dos caras mais agitados que conheci em anos. Ele era persistente e leal demais, um dos meus melhores amigos, meu irmão mais novo, na verdade todos que estavam ali eram. Havia conhecido ele e Leith juntos, eu tinha entrado em uma área periférica, assim que me tiraram das forças armadas. Tinha 17 anos, falido, e sem lugar para ir, acabei parando em uma zona bem pesada de Verilian, Leith tinha minha idade e Val 14.
Estava em uma esquina quando eu ouvi um tumulto, tinham uns caras mais velhos querendo as compras que eles tinham feito, não eram muita coisa, umas três sacolas não muito cheias, os caras queriam elas e o dinheiro que eles tinham com eles eram quatro contra dois. Val era pequeno, franzino na época, usava regata branca e shorts muito grandes para ele - como hoje so que hoje são do tamanho certo ou quase todos são - tinha o cabelo mais comprido e usava chinelos, ele parecia assustado, os caras eram mais velhos e maiores que ele, Val se escondia atrás de Leith e segurava uma das sacolas com as duas mãos, Leith na sua frente usava uma blusa de manga curta e short, também de chinelos, seus cabelos eram mais compridos que os de Val e sem corte, ele estava na frente do cara maior, seu rosto era uma máscara sem expressão que lhe dá um grande crédito no meio em que atuamos hoje - pra não dizer que ele e quase tão bom em tortura quanto Val. O cara de jaqueta gritava com ele e o ameaçava, eu não conseguia dizer bem o que era, mas pelas expressões do Val era coisa feia. O cara fez outra ameaça e Val se desesperou, quando ele ia entregando a sacola pro cara, Leith o fez parar, pra mim naquele momento Leith ganhou meu respeito, ouvi bem o que ele disse:
" Não posso e nem vou entregar nada a você, nem meu irmão vai. Essa comida é para mim e minha família, você não pode e não vai ficar com ela."
E ele continua assim até hoje, o cara mais família que eu conheço, ele faz qualquer coisa, qualquer coisa mesmo para defender a família, ele passaria fome por nós, morreria por nós, e digo com certeza que ele mataria por nós.
Então o cara se descontrolou e deu um murro na cara dele, cara aquilo deve ter doído, por que ficou roxo de primeira. Val deixou cair a sacola que segurava, mas Leith não baixou a cabeça, ele continuou firme e com seu rosto inexpressivo, Aquilo deixou o cara de jaqueta irado, gritou para que o outro segura-se Val, o cara pegou ele agarrando seus braços fazendo ele ficar imóvel. O cara deixou a frente de Leith indo para onde o cara e Val estavam, Leith começa a se deslocar e os outros dois o seguram.
O cara maior deu um soco no estômago do Val, ele bufou e gemeu de dor, sua cabeça pendeu para um lado, Leith do outro lado esperneava para se soltar dos outros, mas sem resultado.
E eu estava ali, parado, olhando aquela situação nojenta e a pontada de ódio ainda crescendo dentro de mim.
Eu estava frustrado, cansado de toda a merda que o D.P. tinha feito injustamente comigo, cansado daquela gente esnobe que não sabe o que é lutar para ter o mínimo de voz possível, cansado das mentiras que contaram sobre mim, cansado de me esforçar para o meu melhor aparecer e ninguém dar a mínima, cansado de ser esquecido.
A partir daquele momento a Ruby Tear nasceu, a partir do meu punho cerrado que se chocou com o rosto do cara que ia dar outro soco no Val, a partir do momento em que Leith se soltou e chutou um dos caras e socou o outro, a partir do momento em que Val juntou suas forças para dar uma cabeçada no cara que o seguravam ... a partir do momento em que quatro homens foram surrados por três adolescentes.
Quando acabamos estávamos os três estourados, cortes, lábios inchados, olhos roxos, hematomas... mas estávamos felizes. Não falamos nada depois, eles começaram a juntar as compras que não estavam estragadas, eu ajudei, ainda em silêncio. Quando terminei entreguei a sacola a Leith, Val me olhava de esgueira mas parecia agradecido, Leith não aceitou a sacola e pedido para que levasse ela para sua casa, porque seu braço estava machucado.
Descemos a rua em que estávamos, o cara de jaqueta tinha sumido e nos deixou com os outros três para trás.
Chegamos em um conjunto de apartamentos detonados e subimos dois
lances de escadas, paramos na frente de uma porta, ela parecia gasta e só tinha a letra "A"na frente, sem números. Quando Leith ia colocar as chaves a porta abriu e uma garotinha de uns 10 anos saiu de dentro, usava um vestidinho simples mas bem costurado era vermelho e combinava com os cabelos pretos longos e estava descalça, ela olhou para eles e para mim e tirou a vista novamente para eles e gritou:
- MÃE, OS ELES ARRUMARAM BRIGA DE NOVO.
Nesse momento decidi que era hora de dar o fora dali. Mas Leith segurou minha camisa e me fez entrar no apartamento, era simples, um quarto, um banheiro, cozinha junto com a sala e uma pequena varanda. Uma mulher saiu do quarto e foi até nós. Quando ela nos viu ... bem, nunca levei um esporro tão grande na minha vida - nem dos coronéis - mas eu acho que eles já haviam levado uns bons. A mulher alta, de traços finos e longos cabelos negros e pele fina pálida usava uma calça legging e blusa folgada. Era Luísa Salles, mãe de Leith e Loren e mãe adotiva do Val e daquele dia em diante, minha também.
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Lost Between Lives
FantasyPor quase um ano Verona Recci tem trabalhado o dobro do que consegue. A melhor medica a domicílio que Verilian Hall tem, vem cuidando de dois lados inimigos do que seria uma guerra civil por território entre os Ruby Tears e o Departamento. Os dois...