Capítulo Final - Raiva

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Nove luas depois de surgir, a misteriosa doença de Kohan começou a desaparecer; como uma maldição que caía por terra. Ninguém soube de onde veio e nunca souberam para onde foi. Dias depois de ter se perdido em meio a floresta, o médico superior do templo retornou a capital. Suas roupas estavam rasgadas e sujas, além de seu cavalo, junto com o motivo de ter entrado em tal lugar profano, ter se perdido em meio as árvores. Diferente do que era esperado, seu corpo não tinha um único arranhão e a grande cicatriz em seu rosto havia sumido. Além disso, estava mais forte, pouco mais robusto que ao dia em que saiu. Ao entrar no castelo, o seu rosto, junto com todos os segredos que escondia, nem mesmo pelos clérigos do templo, foi visto novamente.

Fronteira de Konet, dez quilômetros da capital

Em cima de uma colina, o rei e o seu conselheiro aguardavam dois de seus generais. Ambos observavam a marcha longínqua do exército de Wolfhi vindo em sua direção. Montados a cavalo, os dois então solitários mantinham suas armaduras kohanianas para esperar pela batalha que se iniciaria. Virando o rosto para o lado a favor do vento, o imperador olhou dois de seus exércitos. Fileiras de soldados armados com suas espadas e arcos, vestindo grossas armaduras, hora ou outra dando espaço para catapultas e outras armas de cerco para combate terreno. A frente deles, um pequeno e organizado grupo de cem homens, com armaduras quase escassas e largas, feitas de uma faixa de metal e couro ao peito, calças comuns e uma capa; todas grandes o suficiente para soldados bem maiores. A frente deles, um único, vestido da mesma forma, mas segurando uma grande espada claymore e montado em um cavalo com a bandeira de Kohan. Cada uma das unidades aguardava o comando, desta vez, de seu próprio rei.

Galopeando sobre a grama, os dois generais aguardados chegavam aflitos pelo chamado do rei. "Majestade", cumprimentaram ambos.

— Senhor. — iniciou um dos que estavam afoitos — Ambas nossas tropas foram mobilizadas, assim como o senhor pediu. Os lobos negros estão chegando do norte neste momento e receio que uma batalha de frente não seja a melhor estratégia por agora, senhor.

O rei permaneceu parado sem dizer uma única palavra. Os dois suavam frio, temendo por algo que desconheciam. O outro general tocou a armadura do primeiro, depois apenas apontou ao horizonte. Assim que o segundo virou o rosto, pôde ver aquilo que apenas presumia. Incontáveis fileiras de soldados vestindo armaduras negras, cobrindo o centro do horizonte colinoso, cada vez mais próximas dos pequenos exércitos de Kohan. O aço escuro marchando em direção a hecatombe apenas fazia com que eles confirmassem aquilo que viam a cada nova batalha, o mesmo motivo que sempre os fez bater em retirada. Em números, aquela batalha estava perdida, havia pelo menos cinquenta homens para cada kohaniano que aguardava em campo. Aquilo já era motivo suficiente para que os generais retirassem as próprias tropas, mas desta vez, estavam obedecendo ordens diretas vindas de seu rei.

Suando frio, o segundo que observava a cena se virou ao imperador, agora enxergando seu rosto satisfeito e levemente sombrio. Aquilo era suicídio, seria impossível que ao menos um soldado aliado saísse de lá sem que recuasse. O rei estava louco. Todo o seu reinado foi repleto de perdas da mesma magnitude, sem que tivesse a chance de avançar, perdendo cada vez mais terreno, fazendo a população sofrer sem que os deuses os ajudassem.

— Senhor... — mesmo com muito esforço, o primeiro não encontrava palavras para se dirigir a seu superior.

Os soldados com a estandarte vermelha, carregando o símbolo da espada e do machado davam meio passo para trás, obedecendo o instinto de fuga; se prendendo lá apenas pelas ordens que não podiam descumprir. Exceto pelo pequeno grupo a frente, os cento e um soldados sombrios de Kohan não mexiam um único músculo além de não falarem nada. Muitos deles eram desconhecidos pela maioria. Havia boatos circulando que todos voltaram dos mortos, por ninguém conhecê-los e várias fogueiras de cremação de soldados aparecerem vazias quando incendiadas. As poucas famílias que cobravam por respostas ao rei, eram recompensadas com algumas moedas de prata, em troca pelo sigilo e lealdade ao reino. Tudo isso não passava de histórias que iam de boca em boca, apenas para encobrir o vazio que as esposas tinham ao perder seus maridos e dos guerreiros aliados depois de verem as insanidades aos campos de batalha. Tudo aquilo era como uma fantasia, mas algo sombrio e misterioso ainda estava sobre aquele pequeno conjunto a frente.

A Lenda de KohanOnde histórias criam vida. Descubra agora