Capítulo 1 - Acolhimento

143 28 32
                                    

Você não vai conseguir me fazer ficar limpo.

Foi a primeira coisa que Mix disse ao se sentar no fundo da Kombi de Earth. Talvez não devesse sequer ser chamado de carro, apenas um amontoado de metal retorcido, sujo e barulhento ao qual era o lar de mofo e fungos no estofado. Já estava mais do que claro que a situação da suposta banda era de absoluta miséria.

As expressões de Earth demonstravam um nítido arrependimento em ter que ouvir o rapaz reclamando. A verdade é que não havia muita escolha; ou aceitavam o trabalho suicida ou paravam na rua. Contudo, talvez o preço de cuidar de Mix fosse maior do que a recompensa.

— Acredite, eu já tentei antes, é impossível! — cruzou os braços se recostando no assento empoeirado. — Uma vez dependente, sempre dependente.

— Pare de resmungar ou eu colo uma fita crepe na sua boca. — repreendeu Earth, apenas sendo capaz de enxergar a língua que recebeu como desaprovação pelo retrovisor. — Quantos anos você tem? Quinze?

— Vinte e três.

— E age dessa maneira? Pirralho... — Mix encarou-o bravo, cruzando os lábios sabendo que aquela discussão havia sido perdida.

A porta corrida do carro se abriu, revelando Drake e Aye que carregavam outra bolsa, diferente da anterior. Dessa vez uma preta, de couro. O sorriso estampado em seus rostos já denunciava do que se tratava, assim como o grito da mais absoluta alegria que Drake soltou, fazendo o clima que havia se instaurado quebrar completamente: — Gostei desse trabalho!

— Nammon disse que esse é um pagamento adiantado, por pegar o garoto. — falou Aye, sentando-se no banco da primeira fileira. — Não é muito, mas já dá pra pagar um jantar legal.

— Um jantar legal?! — esbravejou Drake. — A gente vai ficar rico!

— Não vamos nos precipitar. Estamos em um território perigoso, temos que ser cautelosos. Não dá pra sair torrando dinheiro por aí. — Earth respondeu, observando Drake sentar ao seu lado no banco da frente. — Antes precisamos dar um jeito naquele carinha ali. — apontou para Mix.

Todos o encararam, já sabendo do que se tratava; as roupas vergonhosas que usava estavam tão sujas que parecia ter rolado numa poça de lama. O olho roxo precisava de um toque forte de maquiagem, e sinceramente... seu cheiro era perceptível mesmo a metros de distância.










A vida em Bangkok é cara e arrojada. Ao menos é isso que se dá a impressão assistindo meia dúzia de lakorns. Mas todos os quatro sabiam que tal realidade estava um pouco fora do senso convencional.

Ruas estreitas e sujas, com sacos de lixo não retirados na calçada, ratos e baratas passando de um bueiro para o outro. Prédios alinhados com fios elétricos caindo, quase podendo tocar a cabeça de quem passasse por ali: se alguém tivesse coragem de fazê-lo a pé. Um cenário digno de filme cyberpunk ou steampunk. As periferias das grandes cidades tendem a ser as piores.

Escondiam o carro num beco. Era mais seguro do que simplesmente deixá-lo na rua e mais barato do que pagar uma garagem. A entrada do prédio era pelos fundos, numa estreita escada que levava até uma porta no topo. Não havia elevador.

De um péssimo engenheiro, degraus pequenos demais, suficientes para fazer qualquer desafortunado tropeçar. Earth riu quando viu Mix cair. A piada estava pronta; como um garoto tão estranho conseguia ser tão pouco acostumado com aquela situação?

O ranger da porta foi estridente o suficiente para fazer com que baratas saíssem correndo de dentro do apartamento. O cheiro era terrível, amônia pura. Havia restos de comida pelos cantos, com apenas 3 camas, uma em cada lado e ao fundo uma bateria.

Green Room Onde histórias criam vida. Descubra agora