Momentos de paz? Zero

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Na festa de quinze anos do Nathan eu cometi a minha maior loucura dos meus quatorze anos de vida: entrei na mansão num dia de festa e contrariei os chefes da minha mãe pela a primeira vez.

Todos os amigos dele de escola dele estavam lá, até mesmo Júlia que na época era somente um interesse secreto que meu amigo guardava à sete chaves. E eu devia estar sendo a certinha e colocar meu foco exclusivamente no ballet que os pais de Nathan pagavam ― e faziam sempre questão de me lembrar que o faziam ― e ficar em casa estudando repertório ou me alongando.

Mas eu não ia fazer isso, já que quinze anos é uma data de aniversário importante. Quer dizer, que tipo de melhor amiga eu seria se faltasse?

Então coloquei meu melhor vestido saí pelos os fundos da mansão e depois dei meia volta para dar de cara com a entrada da casa. Não queria que ninguém soubesse que eu era filha da empregada, gente rica te trata diferente no momento que percebe que você é de uma classe inferior e essa era a minha única certeza da vida.

Lucas atendeu a porta e estava estonteante como sempre, nós trocamos olhares e algo em mim acendeu: ele está diferente ou me tratando diferente? Ele me ofereceu uma bebida ali outra lá e quando percebi já estava bêbada pela a primeira vez, flertamos porque eu estava mais solta mas por algum motivo sentia que estávamos fazendo algo proibido com todos os olhares, ele me tratava com uma certa distância ao falar, mas seus gestos diziam completamente o contrário. Em um momento decidi ir ao banheiro e ele me seguiu, nunca vou esquecer de como antes de me puxar para si o seus olhos analisaram todo o local para saber se estávamos sozinhos.

O beijo dele tinha gosto de pressa ― se é que dá para chamar isso de gosto ― com uma intensidade que nunca tinha experimentado. Quando ele se afastou de mim e nos encaramos e ele foi embora para o lado de outra garota sem parar com os flertes eu tive uma certeza: me tornei seu novo segredo.

― A garota mais bonita da praia ― fala Lucas quando me vê

Saio dos meus pensamentos e reparo em como é muito louco que certas coisas nunca mudam apesar do tempo. Lucas continua com aquela mesma faceta de mauricinho de sempre, e é quase ridículo ver a camiseta formal dele com apenas três botões abertos. Mesmo ele sendo um clichê ambulante de ficção adolescente eu o puxo para um abraço. Sinto o cheiro comum de cigarro em sua roupa azul e ele me aperta com força de volta.

― Desculpa por te chamar tão tarde

― Sempre tô livre pra você, Maiazinha

Faço uma careta. Esse apelido com toda certeza me traz flashbacks de guerra então eu saio de seu abraço e aposto que meu rosto explica tudo que ele precisa saber sobre o que estou pensando, mas mesmo assim falo:

― Eu odeio esse apelido

― Eu sei ― ele ri e dá de ombros ― Vai me contar o que aconteceu?

Solto um suspiro.

― Eu sou uma idiota

― E cadê a novidade?

Dou um soco leve em seu braço.

― Babaca.

Lucas passa seu braço por cima do meu ombro e aponta com a mão para frente.

― Vamos e aí você me conta o que fez de tão ruim

Balanço a cabeça assentindo e tento acompanhar seus passos. Tem poucas pessoas na praia, e apesar de ser tarde da noite escuto barulho de crianças brincando. A lua está minguante e enquanto vai passando o tempo e me sinto mais calma, o céu parece mais estrelado e mais bonito.

As Coisas Que Nunca SentimosOnde histórias criam vida. Descubra agora