Presentes

53 8 4
                                    

Estava tão imersa nos meus pensamentos que não notei quando Sheeva se aproximou.

"Minha Senhora. Quem ousou magoar a rainha? Me deixe vingá-la." Ela disse com raiva.

"Ninguém, Shokan. Vá embora."

"Me perdoe, mas não posso ir embora até saber quem a feriu! Há hematomas em seu corpo!

"Não me toque!" Eu gritei e pouco depois voltei a chorar.

Sheeva insistiu e contei tudo a ela. Retirei um peso enorme dos meus ombros depois de desabafar.

"Eu também tenho uma confissão a fazer senhora. Eu confesso que nunca me simpatizei com o falecido rei Jerrod. Ele nunca se importou com nada além de Edenia... Mas me simpatizo menos ainda com Shao Kahn, ele é mil vezes pior, é um tirano. Corte minha língua se quiser, mas ele é um monstro e o que tentou fazer confirma isso."

"Não importa Sheeva, não podemos fazer nada."

"Podemos reagir, podemos lutar!"

"Propõe uma traição ao império?"

Sheeva ficou desconcertada.

"Sheeva você é jovem, vem de um povo guerreiro que resolve seus conflitos com a força física. Eu admiro isso, mas receio que em Edenia as coisas sejam mais complexas. E mesmo que fossem simples, ninguém é páreo para aquele déspota.

Sheeva me convenceu a me banhar nas águas termais do santuário, aquelas com propriedades curativas. Servas me trouxeram roupas e alimentos. Tive vontade de chamar Kitana, mas não queria que ela me visse assim. Dormi reclusa em dos quartos das sacerdotisas, enquanto Sheeva me vigiava.

Pela manhã acordei melhor. Vesti um traje modesto para disfarçar os hematonas. Ouvi que Shao Kahn havia saído novamente e fiquei aliviada. Me arrumei e planejei sair um pouco com minha filha e assim que Shao Kahn chegasse, eu iria evitá-lo ao máximo. Sheeva e outros guardas vieram conosco até o lago da corte, há alguns quilômetros do castelo.

Minha filha notou a minha tristeza, até me perguntou o que havia acontecido. Me limitei a dizer que estava cansada e enquanto ela nadava à distância, eu me deprimi ainda mais. Minha filha e sua doce infância, completamente corrompida por memórias falsas.

"Majestade... Já faz algum tempo que imperador voltou e ainda estamos aqui." Sheeva chegou até mim.

"Se eu pudesse jamais o veria."

"A Senhora não é a única que não quer vê-lo."

Sheeva disse com uma malícia no olhar tão forte que achei impossível aquilo ter sido um simples deboche.

"Vou perguntar de novo, propõe uma traição ao imperador, Sheeva?"

"Apoiaria uma traição ao imperador, minha rainha?"

Eu fiquei em silêncio. Sheeva era esperta demais. Aquilo poderia ser um blefe, poderia ser um convite para um contra-ataque ou poderia ser um truque para me acusar de traição e me matar.

Voltamos ao palácio ao entardecer. Kitana estava exausta. Eu planejava ir para o quarto com ela e dormir lá, quando Shao Kahn nos recebeu na porta. Meu coração saltou e eu estremeci me lembrando do que havia acontecido, respirei fundo e me apeguei a um detalhe: Shao Kahn não havia consumado seu ataque por completo. Ele devia estar frustrado pois sua fantasia doentia não se tornou realidade, pelo menos não totalmente. Repetia isso na minha mente para me manter firme e não fugir dele ali.

Ele cumprimentou Kitana com um carinho raro de se ver e a entregou um presente. Dois belos leques com lâminas de aço, disse que queria vê-la lutando com os leques tão bem quanto ela dança com eles. Kitana ficou fascinada pois sempre gostou de leques e agora, tinha sua própria arma exclusiva e pessoal. Ela me mostrou entusiasmada e fez alguns movimentos.

"Cuidado para não se machucar filha, mantenha as lâminas longe de você e próximas dos inimigos, como se elas fossem feitas de fogo." Eu a aconselhei.

"Me mostre o que você sabe fazer, filha." Shao Kahn a provocou.

Os dois começaram um pequeno combate. Kitana tentava acertá-lo mas ele desviava e se defendia de todos os golpes. Em um momento ele deu uma rasteira nela. Não gostei de ver aquilo e quase intervi, mas ele impediu. Shao Kahn era muito mais rígido do que eu e Jerrod. Odeio assumir isso, mas a rigidez dele dava resultados melhores que os de Jerrod. Num ato desesperado Kitana balançou os leques e fez uma rajada de vento mágico. Shao Kahn não caiu, mas a incentivou a treinar aquilo até ficar mais forte.

Depois ele se virou para mim e me entregou um belo colar com uma pedra branca, muito parecida com o quartzo. Colocou em meu pescoço com todo o cuidado e beijou o meu rosto. Em seguida esmagou uma planta venenosa bem perto de mim. A pedra atingiu uma coloração mais escura.

"Consegui de um mago, ao norte. Como pode ver ele detecta veneno. Não tem mais com o que se preocupar. Está segura comigo."

Eu permaneci em silêncio.

"Me perdoe pelo o que eu fiz. Eu estava fora de mim, a desejei e tive raiva porque você ainda pensa em Jerrod e eu quero ser melhor do que ele, em tudo." Ele acariciou meu queixo e meus lábios, senti meu rosto corar.

"Obrigada pelo colar." Eu me limitei a dizer.

"Pode dormir com a sua filha se quiser. Eu não vou buscá-la, mas a esperarei."

Ele beijou meu rosto. Naquele momento eu notei que Shao Kahn não queria apenas conquistar Edenia ou a Exoterra.

Ele queria conquistar a mim, completamente.

Segredos VenenososOnde histórias criam vida. Descubra agora