Prólogo

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Podia-se escutar as crianças brincando animadas na saída da singela escolinha da vila. É, o dia estava realmente bonito hoje, com o céu tão azul como nunca antes visto, e o sol brilhando imponente lá em cima. Uma brisa por vezes passava, entrando pela janela aberta da pequena casa amarela para refrescar seu interior.

A garota suspirou, deixando a vassoura cair de sua mão quando se jogou em uma das cadeiras postas na cozinha apertada. Finalmente havia acabado de arrumar a casa depois de três dias comprometida nessa faxina. O lugar era pequeno, mas parecia não ver uma alma viva há séculos.

Sua mãe nem imaginava que havia mudado os planos um pouquinho.

Knock-knock-knock

Suspirou outra vez e fez uma careta desanimada assim que escutou baterem à porta. Quem poderia ser? Não conversava com ninguém e, outra, toda suada e tão cansada que sentia as pernas bambas só por ficar de pé, mas ainda assim criou coragem e se encaminhou até a entrada.

- Pois não? - Quem estava do lado de fora era uma garota que aparentava ser um pouco mais velha, e não pôde deixar de notar os seus lindos cabelos longos tão bem hidratados que pareciam cintilar. Se sentiu até um pouco mal por estar tão descomposta.

- Oi! - Ela sorriu, dando um aceno. - Eu estava passando e percebi que a casa foi ocupada, então resolvi dar as boas-vindas. - De suas mãos vazias, cresceu um buquê das mais diversas flores. - Elas deixarão sua casa ainda mais bonita. - Estendeu o presente que logo foi aceito.

- Puxa... obrigada. - A outra piscou um tanto atônita, se perguntando se realmente viu as flores crescerem do mais absoluto nada. Eu tenho certeza de que ela estava de mãos vazias antes, pensou. - Muita gentileza sua.

- Eu sou Isabela Madrigal. Você não se apresentou para minha família ainda, não é? - Ah, os Madrigal... Lembrava de sua mãe ter lhe falado um pouco sobre eles logo ao partir. Algo sobre terem dons mágicos que ajudavam a fazer da vila um lugar seguro, o que explicava a loucura (não tão louca assim) do buquê. Ainda não havia encontrado tempo para conhecer os arredores, e foi mesmo uma surpresa uma Madrigal aparecer do nada em sua porta.

- Eu me chamo S/n. - Se apresentou também. - Eu não tive a oportunidade ainda de me apresentar à sua família, e também não sabia que precisava senão já teria ido assim que me mudei. - Deu uma risada sem jeito, aproximando o rosto das flores para sentir o cheiro. Cada uma delas tinha o perfume melhor do que a outra, sem dúvidas iam ficar perfeitas no parapeito de uma das janelas. - Como estou sozinha, não queria sair até acabar de arrumar tudo aqui dentro.

- Ah, não é bem necessário se apresentar aos Madrigal. - Isabela explicou com um ar de riso. - É que gostamos de receber cada um dos nossos moradores para que se sintam em casa, e ajudar no que for preciso.

- Obrigada mais uma vez, Isabela. Foi muito gentil. - Pensou por dois segundos, até que abriu espaço. - Quer entrar para tomar um suco? Sei lá, está bem quente hoje.

- Ah, não, não! Agradeço, mas, como eu disse, só estava de passagem. - A Madrigal colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha, com um olhar contente. - Hoje de noite vai ter a festa de noivado de minha prima Dolores. Vai ser um evento público, então se você quiser ir... E vai ser uma boa oportunidade de conhecer minha família. Enfim, você que sabe.

... Uma festa? Não gostava muito de festas, sempre acabava ficando deslocada. Por outro lado, não queria fazer uma desfeita às pessoas mais importantes da cidadela.

- Eu já acabei as coisas por aqui, então irei sim. - Sorriu agradecida, vendo a expressão satisfeita no rosto de Isabela.

- Legal! Então a gente se vê depois. - Acenou outra vez antes de se virar para seguir seu caminho. - Tchauzinho!

- Tchau. - Olhou para o buquê em suas mãos e fechou a porta voltando para dentro.

Pegou um vaso, encheu com água da torneira na cozinha e foi até a janela aberta da sala, procurando um canto ideal para botar as flores, onde o sol batia e o vento pudesse espalhar o perfume pela casa. Enquanto ajeitava algumas pétalas, teve a impressão de ouvir a voz de Isabela um pouco ao longe e ergueu o olhar na direção da qual achava vir. A Madrigal parecia irritada com um garoto que corria ao seu redor, agarrado às suas saias, fugindo de um bando de crianças que corriam atrás dele. Eles riam, ignorando o ralhar da garota. E, sem mais paciência, ela estendeu a mão fazendo com que uma planta escandente crescesse e se enrolasse nos tornozelos do menino, que caiu de cara no chão.

As pessoas desse lugar parecem tão animadas, pensou. Talvez hoje à noite não seja tão ruim assim.

Metamorfosis (Camilo x S/n)Onde histórias criam vida. Descubra agora