Capítulo III

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 - ... E ele tem os pés virados para trás, então os caçadores seguem suas pegadas e se perdem no meio da floresta. Aí, quando o Curupira aparece com seu cabelo de fogo- - Uma criança me interrompeu bem no final da história.

- Tia S/n, mas o cabelo do Curupira não bota fogo nas árvores sem querer? - Perguntou, e as demais, que estavam sentadas em meia lua em minha frente, concordaram com a cabeça.

- Ahn, bom... Não. Porque é um fogo mágico.

- Aaaah! - Exclamaram em uníssono, e outra continuou. - Então ele é tipo um Madrigal! Também tem alguma casita mágica?

Pensei por alguns segundos, então neguei com a cabeça para enfatizar a resposta.

- Não, mas a Cuca é uma bruxa que mora em uma gruta e dorme por um dia a cada sete anos.

- Ooh!

- Pois é, e ela adora perseguir criancinhas para jogar no caldeirão... - Sussurrei de um jeito assustador, gesticulando minhas mãos enquanto contava. - A Cuca sempre canta uma música quando está por perto procurando por crianças teimosas.

- E como é a música?! Como é a música?! - Perguntaram todas juntas outra vez, mas quando eu ia começar a cantar, fui interrompida de novo. Dessa vez por Camilo, que se aproximava com uma criança atracada em suas costas e outras duas segurando cada uma de suas mãos.

- Tenho certeza que os pais não querem ter crianças assustadas na hora de dormir, S/n. - Riu, então os dois meninos com ele saíram correndo para se juntar as minhas crianças, e Camilo ajudou a menina a descer de suas costas.

- Meh! - Zombei, vendo os olhinhos curiosos em minha frente. - Você só está com ciúmes porque quase todas quiseram ficar aqui comigo ao invés de brincar com você.

- Isso foi uma traição! - Fingiu estar ofendido, se jogando ao meu lado com o rosto emburrado.

- Camilo, cala a boca, a tia S/n estava prestes a cantar a música da bruxa pra gente. - Uma menininha metidinha repreendeu, fazendo com que o Madrigal a olhasse indignado.

- Crianças, acho que o Camilo tem razão. Os pais de vocês não vão gostar se ficarem impressionados de noite, é melhor parar as histórias por aqui. - Todas começaram a reclamar, algumas até chateadas com o pobre do Madrigal que disparou a fazer cócegas nos mais reclamões.

Ficamos brincando com as crianças por mais algum tempo, com Camilo se transformando em um homem alto cada vez que a peteca ficava presa nos galhos da árvore em que estávamos escorados antes. No fim da tarde, os pais começaram a chamar por seus filhos e foi de um em um indo correndo para suas casas até que no final restou apenas eu e o metamorfo.

- Você faz isso todos os dias? - Perguntei enquanto andávamos um ao lado do outro, e rodei meu pescoço que estava quase implorando por um estalo. - Elas são elétricas, ainda mais aquele baixinho viciado em café. - Camilo riu, confirmando com a cabeça. - Então você é meio que... - Enrolei para completar, mas não achei palavra melhor do que a óbvia. - A babá?

- Eu não sou uma babá, eu faço porque eu gosto.

Lancei um olhar quase cínico até ele, mas me controlei.

- Você é a babá. - Afirmei, vendo-o revirar os olhos.

- Tá, tá, mas então agora você é babá junto comigo. E aí? - Estalei a língua, fazendo-o rir outra vez. - Você vai para casa agora?

- Acho que não tenho mais nada pra fazer além disso. - Paramos de andar, e eu encarei o caminho até a minha casa que não estava muito longe. - Hoje foi legal. Se a sua abuela perguntar, diz que gostei de te ajudar.

- Pode deixar, colega. - Deu um soquinho no meu ombro, sorrindo. - A gente se vê amanhã?

- Com certeza.

***

Assim que entrei em casa, a primeira coisa que eu vi foi uma carta no chão que deve ter sido passada por debaixo da porta. Me abaixei para pegar o envelope, notando o selo do Brasil na mesma hora.

Mãe... Logo imaginei que fosse dela, e tive a confirmação ao ver o remetente. Sentei-me no sofá e rasguei a lateral do envelope, puxando um papel de dentro dele pronta para lê-lo.

''Querida filha,

À essa altura você já deve estar instalada em Encanto, como combinamos. Entregou a carta que dei para você levar? Imagino que sim. Agradeça aos Madrigal por mim, e diga a Bruno que mando um abraço. Assim que possível me juntarei a você. As coisas estão um pouco complicadas aqui, mas vai dar tudo certo. Fique bem.

Beijos, 

Mamãe.''

Bruno Madrigal, sabia que o nome me era familiar. Voltei a dobrar o papel, ficando de pé, um tanto intrigada com o conteúdo da carta que eu devia ter entregado a ele e não o fiz. Mas é melhor assim. Suspirei desanimada, querendo que tudo se resolvesse e que minha mãe viesse logo ficar comigo. Espero que ela esteja mesmo bem.

Metamorfosis (Camilo x S/n)Onde histórias criam vida. Descubra agora