8. A Mãe de todas as coisas

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🌻 Capítulo 8 🌻

Quanto mais Ana andava colina acima, mais ela sentia a temperatura do ambiente aumentar. As flores do campo desapareciam aos poucos e, apesar do calor, o frescor do vento e a sombra das árvores protegiam Ana do sol escaldante, que já havia alcançado seu ápice. Quando a menina agachou-se para tomar água de um límpido córrego, ela escutou uma voz dizer seu nome baixinho: Ana, Ana, Ana — uma doce voz de uma mulher que a convidava a ir até ela. Porém, a voz vinha de todos os lados, suave a baixa; e ela não soube para onde ir. Toda a natureza ao redor parou para escutá-la: Os pássaros pousaram nos galhos das árvores, o vento parou de soprar, os pequenos animais diminuíram seus ruídos. Com isso, Ana também parou, mexendo somente o pescoço — ela queria saber de onde vinha aquela voz, mas não foi possível. Então, ela olhou para a terra sob seus pés, sentindo-a vibrar e pulsar como se ali, em suas misteriosas profundezas, houvesse um enorme coração que palpitava e dava vida a todos os seres da superfície.

Quando o vento voltou a soprar e o silêncio se desfez, Ana continuou caminhando até parar em uma clareira, cujo centro havia uma enorme árvore. Seu tronco era muito espesso e suas folhas eram largas e verdes, espalhando-se por seus galhos sinuosos e cobrindo grande parte da clareira. A menina pôde ver o Sol acima de seu topo; os raios dourados adentrando por entre as folhas e galhos, diminuindo o calor que fazia naquele momento. Sob a grande árvore, próximo ao seu tronco, havia diversas cestas de palha cheias de frutas. Ela sentiu a boca encher d'água, sentindo muita fome de repente. Ela correu até as cestas, e a primeira delas estava cheia de belas maçãs, todas muito vermelhas e brilhantes. Ana pegou uma delas e deu uma mordida, saciando sua vontade. Sentou-se ao lado das cestas, observando as outras frutas: mangas, morangos, bananas, laranjas, peras, uvas e muitas outras frutas que Ana não sabia os nomes, pois para ela eram desconhecidas até então.

Aquela maçã foi o suficiente para satisfazer a fome de Ana. Ela mal havia acabado de comer toda a fruta quando escutou aquela voz novamente — dessa vez deixando claro de onde vinha, pois estava muito próxima agora. A voz vinha da própria árvore, de seu tronco, seus galhos e suas folhas. Apesar de toda a força e imponência que aquele grande ser se apresentava, a voz continuava suave e sutil; baixa demais para os ouvidos desatentos e óbvia demais para aqueles que se recusavam a ignorá-la. Para os ouvidos da menina, que sempre adorou conversar com as árvores, foi impossível desprezar aquele som que não era apenas uma voz, mas todos os sons ao redor.

— Já esperava por você, pequena amante das estrelas — a voz disse. Ana olhou para cima, observando os extensos galhos e as frestas luminosas que vinham do céu. Ela terminou de mastigar a maçã rapidamente, pois era falta de educação falar comendo.

— Eu não sabia que as árvores falavam também — Ana disse.

— Tudo fala o tempo todo, querida Ana — a árvore disse. — Sabe disto, pois escuta a minha voz.

— Acho que tem razão — a menina disse. — Você é muito grande e bonita, senhora árvore. Deve ter muitos anos.

— De fato, estou aqui há anos. — afirmou. — Vi minhas irmãs-árvores nascerem, crescerem e algumas até definharem. Presencio a vida efêmera dos pássaros e das flores, as estações irem e virem, e sei apenas que o Sol e a Lua serão minhas únicas companhias eternas nesta ilha.

Ana olhou para as raízes que se sobressaltavam da terra.

— Então você nunca vai morrer? — perguntou.

— Minha matéria é mortal; um dia eu morrerei. Entretanto, tenho uma grande responsabilidade para com esta ilha, pois são minhas raízes que a sustenta. — a árvore contou. — Em contrapartida, os seres que aqui vivem garantem minha saúde e longevidade. É uma troca. Deve haver equilíbrio, respeito e amor por todos que por aqui vivem. Se isso não acontecer, a água secará, o solo deixará de ser fértil, a luz desaparecerá e eu morrerei. Antes disso, porém, verei todos partirem; sem a garantia do eterno retorno.

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