1 - O que são as estrelas

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 🌻 Capítulo 1 🌻

Ana amava observar as estrelas da janela do seu quarto durante a noite. Ela ficava triste — muito triste — quando elas não apareciam, seja por causa da chuva ou porque as nuvens as escondiam. Naquela noite do dia seis de agosto, o aniversário de Ana, estava muito frio. Mas as estrelas estavam lá. Curiosamente, estavam mais bonitas e mais brilhantes que o normal, como um presente dos céus para a menina — que havia acabado de completar sete anos. Ela havia ganhado muitos brinquedos; o que significava que teria que doar alguns antigos, pois sua mãe sempre lhe dizia que havia crianças que não tinham condições de tê-los. Então, sempre que ganhava novos, procurava aqueles que ela não tinha mais tanta vontade de brincar. Ana costumava doar muitas bonecas, pois ganhava muitas. Ela tinha certeza de que outras crianças iam gostar delas, por isso sempre havia bonecas de diferentes tamanhos nas caixas de doação. Às vezes, ela colocava livros também, mas Ana tinha que admitir que era muito apegada àquelas histórias. Algumas daquelas obras ela lera tantas vezes que as folhas já estavam desgastadas. E, é claro, um de seus livros favoritos falava sobre as estrelas.

De tanto falar sobre elas (e pedir um telescópio de presente, mas disseram a ela que não era coisa para crianças), a menina ganhou pequenos adesivos de parede com formato de estrelas, cometas e planetas para colar no teto de seu quarto — e imaginou que as crianças sem dinheiro também adorariam aquilo, mas ela ficou sabendo que algumas delas não tinham quarto e nem paredes para colocarem seus adesivos. Ainda que fosse um presente muito legal — as estrelas de mentira brilhavam no escuro — não eram de verdade. Portanto, se Ana tivesse a oportunidade de vê-las da janela do seu quarto, ela veria.

Havia uma estrela em particular que Ana gostava muito. Era sua favorita, pois era a mais brilhante do céu. A criança percebeu que esta sempre era a primeira a aparecer — como se ela chamasse os outros astros — e sempre a última a sumir, como se fosse a mãe de todos eles. Naquela noite, ela estava mais brilhante que o de costume; bem próxima à Lua crescente, como se as duas estivessem tendo uma longa e animada conversa.

Ana colocou sua coberta amarela sobre os ombros, enrolando-a no corpo, pois estava realmente frio para ficar com as janelas abertas. Seu nariz estava gelado e seus pés eram pequenos cubos de gelo dentro das meias. Além disso, estava muito cansada, pois aquele dia fora de muita festa e muita gritaria de outras crianças, mas ela não se importou com o sono que sentia. Ana queria ver como estava o céu naquela noite. Subindo em uma de suas cadeirinhas, ela contemplou a escuridão e seus milhares de pontinhos brancos espalhados acima da Terra. E, mais uma vez, a menina fez a pergunta que sempre fazia (e que nenhum adulto soube responder de forma que ela entendesse): O que eram as estrelas?

Ela tinha suas teorias, principalmente quando disseram que o Sol também era uma estrela — uma gigante, imponente e ardente estrela. Aquela impressionante descoberta a fez pensar em sua teoria anterior: de que cada um daqueles astros era um ser humano ou um animalzinho que morreram no planeta (como o seu querido hamster). E, se eram seres, aqueles pontos reluzentes eram seus corações, que de alguma forma permaneceram vivos. Quando disseram a ela que o Sol também era uma estrela, ela concluiu que só podia ser o coração de um ser gigante, tão poderoso que sem ele nada teria vida.

Ninguém levava suas teorias a sério, e talvez não fossem verdadeiras — eram apenas teorias, afinal — mas pelo menos fazia mais sentido que a ideia de serem naves espaciais estacionadas no espaço ou lanternas de misteriosos seres que protegem o planeta Terra durante a noite. Os adultos diziam coisas complicadas sobre elas: que eram apenas corpos celestes muito antigas e com luz própria, composta por gases — o que a fez imaginar muitas bolas brilhantes de refrigerante coladas no espaço. Não, ela não gostava daquela descrição. Ela preferia acreditar que eram seres de verdade.

Ana poderia ter ficado observando o céu noturno por muitas horas, mas estava com tanto sono que quase dormiu ali mesmo, de pé na janela, mas com certeza sua mãe a deixaria de castigo se aquilo ocorresse. Ela não gostava quando a menina ficava na janela daquele jeito, pois não havia grades e seu quarto ficava no segundo andar. Portanto, aquele era um segredo apenas dela e das estrelas.

Ela foi para a cama, seu corpo exausto pedindo pelo travesseiro macio e as cobertas quentinhas — o que a fez lembrar que algumas crianças também não tinham cobertas. Ana não sabia porque pensava tanto nelas. A menina era filha única e seus amigos tinham pais que compraram enormes casas com piscinas e possuíam empregos com nomes esquisitos. Ana estava pensando nisso — e que deveria separar algumas cobertas para a caixa de doações também — quando adormeceu profundamente.

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