9. As chamas que mostram o caminho

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🌻 Capítulo 9 🌻

A árvore despertou-lhe com o som de suas folhas, e Ana percebeu que era hora de partir. Não escutou mais aquela voz, mas sabia que ela estaria em todos os lugares. A menina deixou-se ir, como se houvesse uma bússola interna que a indicasse exatamente para qual caminho seguir. Surpreendeu-se ao perceber que o Sol já descendia no horizonte, anunciando o crepúsculo. Seguindo por uma estreita trilha, ela também desceu a colina, acompanhando os raios solares. Havia dormido demais, mas a Árvore tinha razão: precisava recuperar suas energias para continuar, e Ana sentia-se revigorada naquele momento. Era como se tivesse acordado para um novo dia, no qual poderia passar a tarde inteira brincando até sentir-se exausta.

Sem se afligir com o tempo ou o espaço, ela observou o que margeava seu caminho: as diversas árvores, plantas, flores, insetos e outros pequenos animais. Nada muito diferente até começar a ouvir o coro dos pássaros — tal como havia escutado quando chegou à ilha. A menina olhou para cima, observando as aves voarem de um lado para o outro. Maravilhou-se ao ver vários ninhos feitos de palhas, folhas secas e terra. Alguns deles estavam muito altos, outros baixos o suficiente para que Ana visse as cabecinhas esfomeadas, que clamavam pelo alimento trazido pelos pais pássaros. Ana amava ver ninhos de passarinhos; desde a sua construção para sustentar os ovinhos até o crescimento dos bebês-pássaros. Às vezes, apareciam alguns ninhos em seu jardim, mas nunca conseguia vê-los tão próximos. Agora, havia vários deles espalhados por aquela parte da trilha, como se ali fosse um enorme berçário. O som era ensurdecedor e encantador, o que reforçou a ideia de que Ana estava certa quanto ao nome que havia dado à ilha.

Ela atravessou aquele cenário, seus olhos atentos brilhando de entusiasmo ao ver os pássaros adultos passando agilmente pela sua cabeça e ombros, atendendo ao chamado de seus filhotes. A trilha, então, fez uma curva suave para a direita, e a luminosidade atingiu os olhos da menina. O coro dos bebês-pássaros ficou mais baixo à medida que a mata se abria, revelando a beira de um penhasco à esquerda e outra estrada à direita. Havia muitos pássaros nos galhos de uma árvore despida de folhas, a qual debruçava sobre o penhasco. Mas estas aves, ao contrário dos agitados filhotes, estavam em silêncio e imóveis, os olhos fechados e as asas relaxadas. O mais inesperado de tudo, entretanto, foi a presença de um gato branco deitado sobre uma pedra retangular, rodeado de velas (também brancas) com seus pavios apagados. Os pelos do animal eram tão brancos que pareciam feitos de neve.

O gato, também com os olhos fechados, estava em uma posição que Hermes também costumava ficar — Ana costumava chamar de posição pão-de-forma, pois era engraçado e seu gato parecia realmente com um grande pedaço de pão. Ela teve receio de acordar o gato e os pássaros, que pareciam estar em um sono profundo e sem hora para despertar. Então, ela ficou observando-os de longe, até que o Sol começou a se pôr. A grande estrela estava laranja, colorindo o céu de rosa, azul e amarelo. Conforme os raios atingiam o topo das colinas, a relva, o gato e os pássaros, as velas ao redor do felino começaram a acender, uma a uma, ardendo em chamas laranjas e dançando com o fraco vento que soprava.

O animal abriu os olhos, mexendo levemente as orelhas. Observou atentamente o atear dos pavios, e era como se os os raios do Sol fossem grandes fósforos invisíveis. O gato voltou a fechar os olhos, dessa vez ronronando.

— Por um momento, temi que não acendessem. Seriam velas inúteis. — o gato virou o pescoço lentamente na direção de Ana, já ciente de sua presença. — Está perdida, pequena humana?

— Não — Ana respondeu, balançando a cabeça. — Acho que não...

— Que bom — ele se virou novamente, os olhos cerrados. — De qualquer forma, não poderia ajudá-la. Estou ocupado demais tentando descobrir o que essas velas tem a me dizer.

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