6 - GASPAR

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— Patrão?

Olho para o lado, dando de cara com um dos peões da fazenda. Há quanto tempo ele estava me chamando? Não posso definir. Estou perdido há minutos, deixando minha cabeça se empanturrar com as lembranças daquela ruiva malcriada.

— As duas mil cabeças de boi já estão separadas, como o senhor mandou, pra próxima venda.

— Vou dar uma olhada. — Enfio o chapéu na cabeça e o sigo, caminhando pelo canteiro que rodeia o curral.

Desde o primeiro momento em que eu pus os olhos naquela topetuda, eu quis botar um arreio nela, mas deixei quieto. Eu nem conhecia a fulana, só sabia que a fala dela, "Você quer me foder?", me pegou de jeito. Nuh! Faz tempo que eu não sinto esse queimor doido por uma mulher.

Eu fiquei por três anos inteiros sem colocar os olhos em mulher nenhuma. Em respeito a Manu, a família dela e a meus filhos. Eu optei pelo celibato porque sexo era a última coisa que eu deveria me preocupar tendo duas crianças para guiar nesse mundão.

Eu precisava curar a dor no peito que a partida de Manu deixou. Para mim, que sou homem velho, foi fácil, chorava no túmulo dela, chorava no banho, mas e o menino pequeno? Para Valentim foi terrível, e eu tinha de ser a rocha firme que ele precisava. Eu levava os dois para dormir comigo, Micael, novinho, ainda mamava quando ela nos deixou. Levava para passear, caçava jeito de fazer todas as refeições juntos, e o coitadinho sempre agarrado na minha mão, com medo de me perder também, enquanto Micael ia nos meus braços. A gente ia pra tudo quanto é lugar juntos.

Foi doloroso ensinar sozinho meu filho a falar, a andar, dar papinha para ele, conforme crescia, falar sobre a mamãe que não mais existia. Valentim sempre esteve ao meu lado, ajudando com o caçula. Foram três anos bem preenchidos, apenas para eles.

Todavia o capeta atenta o homem demais, e confesso que já estava até as tampas precisando de um carinho feminino, algumas metidas brabas em uma boceta e uns peitos formosos para chupar e esquecer os dilemas da vida.

Era só sexo mesmo. Prometi a Manu, quando ela estava bem debilitada, que nunca colocaria outra dentro de casa até que nossos filhos tivessem idade suficiente para tomar o próprio rumo. Assim como ela, eu também tinha medo de que alguma nova namorada ou esposa pudesse maltratar meus meninos.

Sendo dessa forma, minha rotina é sempre sair escondido, foder e voltar. Simples e me satisfaz. No início era meio complicado, por ser uma cidade pequena e por eu ser conhecido, então todo mundo dá conta da vida de todo mundo. Descobri um aplicativo de acompanhantes de luxo, sempre escolho alguma das cidades dos arredores, pago a vinda e não preciso manter contato ou prosear. Eu preciso apenas do sexo, e ela, apenas de grana.

Agora chega essa psicóloga, bruta que só, querendo vir cantar de galo no meu terreiro. Infelizmente, o cão me tentou, e tive atração por ela. Fui dormir de pau duro depois que ela esteve na minha casa. É muita petulância! Deu vontade de calar aquela boca rosada, conosco pelados na cama até ela gritar um pedido de desculpas. Eu sou especialista em vencer mulher braba na cama.

Após averiguar o gado separado para a venda, vou para o escritório preencher a papelada de liberação. Ao entrar na mansão pela porta dos fundos, dou de cara com minha sogra e a filha dela à mesa, conversando com dona Veridiana, a cozinheira que faz apenas o almoço enquanto eu trabalho e as crianças estão na escola.

— Dia, dona Matilde. — Tiro o chapéu cumprimentando-a. — Dia, Bianca. — Minha cunhada responde com um aceno gentil. Sem dizer nada, continuo parado esperando alguém dizer o motivo da vinda logo pela manhã.

[AMOSTRA] MENTIRAS, BEIJOS E PÃO DE QUEIJOOnde histórias criam vida. Descubra agora