Capítulo Cinco

127 13 0
                                    

Sentei-me na ponta do penhasco. Não queria ficar lá dentro, dali a pouco iriam juntar os casais e eu não queria Alphonse. Sentia que talvez outro alguém fosse preencher meu vazio.

Suspirei e olhei a Lua. Estava bela e cheia. Estava uma linda Lua. Um uivo de lobo soou em alguma parte da floresta, mas eu nem liguei, estava bem comigo mesma... O problema era que ainda me faltava algo.

Sempre que precisava ficar sozinha ou fugir de algo, eu vinha para esse penhasco e ficava sentada olhando para o céu e escutando o barulho do riacho abaixo de mim. Era o meu lugar. Desde pequena, eu sempre estive ali. Chorei, ri, comigo mesma, pensei, tudo ali. Só eu e mais ninguém. Ninguém nunca soube que eu estava ali, nem o que fazia ali. Nunca mostrei para ninguém.

Mas naquele momento. Um vazio invadiu meu peito. Faltava algo ou alguém. Mas alguém era quase impossível. Eu odiava companhia, odiava escutar as pessoas falarem, e nunca que ali me faltaria alguém.

Fiquei calada, somente ouvindo o som das cigarras e dos grilos, junto da água.

Um sorriso meigo veio em minha mente. Aqueles olhos castanhos. Ela veio em minha mente. Eu não sabia ao menos seu nome e seu rosto por completo, sem a máscara. Não sabia quem era e o que era. Não sabia o que fazia e de que família pertencia.

As doze badaladas do sino da igreja soaram. Eu devia estar em casa a essa hora e Adoriabelle também. Me levantei correndo.

Voltando ao salão para buscar minha irmã, a encontrei saindo correndo do meio da floresta.

- Annemarie! - gritou ela. - As doze badaladas!

- Sim, eu sei. Vamos! - disse a pegando pelo braço e a puxando.

Chegamos rapidamente no castelo, junto de algumas criadas que trabalhavam lá. Ao olha-las senti um arrepio, uma delas usava uma roupa idêntica à da garota que eu havia dançado junto, eu seus cabelos lembravam me os dela, mas não consegui ver seu rosto.

Talvez era apenas uma coincidência, tantas garotas tinham vestidos iguais...

Junto de Adoriabelle subi as escadas de todo o castelo até nossos quartos. Em uma das voltas da gigantesca escada em espiral, senti que alguém, em algum canto escuro, me observava. Voltei meu olhar para todos os lugares escuros, mas não havia nada.

Eu estava ficando louca. Era a única coisa que vinha em minha mente. Talvez eu estivesse louca. Ou estivesse louca por aquela... Não. Isso era uma idiotice.

Segui correndo para o meu quarto.

Alguém bateu à porta. Devia ser papai, pronto para me dar um sermão. Rapidamente arranquei meus saltos e os coloquei no canto do quarto.

- Entre. - respondi me sentando na cama.

Mãos robustas com luvas, braços musculosos cobertos por mangas de veludo, uma mecha do cabelo grisalho... Papai me encarou com uma expressão séria, a que em toda a minha vida eu vi em seu rosto. Nada diferente.

- Olá, papai. - disse sorrindo educadamente.

- Annemarie. Sabes que estas muito atrasada. A vi, junto de Adoriabelle, entrando bem depois das doze badaladas, conhece as regras. - disse ele se aproximando.

- Desculpa, papai. Viemos correndo, mas nos atrasamos um pouco. Não queríamos desapontá-lo. - abaixei os olhos com respeito.

- Duas semanas sem bailes. - disse ele com a mesma expressão.

- Mas, papai...

- Annemarie. - ele me interrompeu chamando atenção. - Não andas me mostrando que posso confiar-te a responsabilidade de cuidar de tua irmã.

- E Adoriabelle? Irá ser castigada? - essa era uma pergunta com resposta óbvia, se fosse, não seria tanto como eu.

- O castigo de Adoriabelle será resolvido entre eu e ela. Não quero ouvir mais nenhuma palavra tua por hoje. Só espero que neste baile tenhas resolvido teu relacionamento com Alphonse.

Estranhamente, naquele momento, me veio a garota em minha mente. O que estava acontecendo comigo?

- Eu não quero Alphonse, papai.

Ele tirou a luva de uma das duas mãos.

- Eu disse: nenhuma palavra. - sua mão estalou em minha bochecha queimando minha pele. - Não é querer, se eu decidir que casará com Alphonse, assim será.

Meus olhos encheram-se de lágrimas. Ele se virou e nervoso saiu do quarto. Me deixando sozinha.

Meu rosto ardia. Meu peito doía. E eu não tinha a mínima ideia do que estava acontecendo comigo...

Um Conto de Fadas ModernoOnde histórias criam vida. Descubra agora