Capítulo 1 - Desconhecidos costumam dar péssimas sugestões

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Penso que se Tsuyu fosse mesmo minha amiga, ela teria aceitado o convite de me atropelar essa manhã.

Atravesso a rua querendo sair do prédio o mais rápido possível. Entro no carro branco parado do outro lado e bato a porta.

- Não tem geladeira em casa, não? - me repreende.

Peço desculpas meio sem jeito. Não é por que meu dia começou sendo uma tragédia que eu preciso descontar nela.

Apesar da bronca, o jeito sincero e familiar de Tsuyu me acalma. Não planejava tirá-la do seu caminho hoje, mas depois de ser assediada por um estranho que se dizia perdido, fica difícil seguir o dia como se nada tivesse acontecido. Ainda mais depois de encontrar o vizinho desagradável da porta da frente.

- Quer falar sobre o que aconteceu? - ela pergunta amigavelmente, sem tirar os olhos da rua. Apenas contei a ela que não estava bem e que precisava de carona.

- Não - respondo.

Ela afirma com a cabeça.

Gosto dela justamente por isso: Tsuyu compensa a falta de filtro na língua sendo simplesmente a melhor pessoa que eu conhecia. Talvez fosse a falta de filtro que a transformava na melhor pessoa que eu conhecia. Ela chegava a ser mais baixa do que eu, tinha os cabelos compridos e escuros, o que também a fazia parecer mais nova, mas era incrível como quando abria a boca, ela parecia muito mais madura.

Mas eu não queria falar sobre o assunto. O que eu falaria? Como um cara nojento tinha passado a mão em mim? É o tipo de situação que você ou explode ou chora e, nesse caso, eu explodi. Isso tudo antes do vizinho mal educado chegar e dar uma de herói. Sinto que fui grossa com ele e pretendia me desculpar, afinal de contas, ele só estava querendo ajudar. Mas depois da forma que ele me tratou antes de sair com o carro, eu preferiria engolir minhas desculpas sozinha.

Falando nele, era uma pessoa curiosa (estou sendo bem gentil em usar apenas "curioso" para defini-lo). Nunca conversamos, mas já o vi pelos corredores poucas vezes, na verdade. Talvez Bakugou não fosse muito de sair. O que eu sabia sobre ele era que tinha poucos amigos, uma rotina regrada, prováveis problemas com a família e com toda certeza era muito, mas muito barulhento. Era meio difícil ignorar alguém que morava do outro lado do corredor. Até onde sabia, Bakugou estuda do outro lado do campus, no prédio de exatas. Talvez fizesse algum tipo de engenharia.

Meu celular treme no meu colo e eu verifico a notificação. Nem um pouco surpresa, confirmo que é Iida perguntando se estou bem. Respondo que sim, mas que já queria estar em casa novamente. Ele pergunta o que aconteceu e sem querer incentivá-lo a fazer um milhão de perguntas sobre meu bem-estar, apenas respondo que dormi mal essa noite. Ele parece acreditar, pois responde com uma figurinha que é a sua cara: alguém preocupado e com óculos horrorosos.

Percebo uma movimentação estranha assim que paramos o carro no estacionamento. Provavelmente os alunos correndo para suas devidas salas.

Me apresso em sair do veículo.

Estamos atrasadas por causa do incidente e pelo desvio do caminho de Tsuyu. Se não correr agora, vou perdê-lo.

Escuto minha amiga pedir para ir com calma, mas apenas grito um "tchau" desajeitado de volta e continuo correndo. Desacelero e paro bem do lado da porta da minha sala, hoje tenho aula de bioética e se pudesse, sairia correndo na direção contrária. Ao invés disso, permaneço parada, esperando. Não ligo de ser a última a entrar, contanto que possa estar no lugar certo e na hora certa.

Não era todo mundo dessa universidade que valia a pena. Eu prefiro acreditar que os que valiam eu já tinha achado. A multidão que enfrento até a porta da sala, é recheada de gente desocupada, alguns bandos de hipócritas que nadavam no dinheiro dos pais e mais um terço de babacas. Às vezes até podia parecer um grupo tirado diretamente de um filme ruim americano de ensino médio, até mesmo Bakugou tinha sua panelinha e seus dramas. Pelo o que diziam, a fama de grosseiro o perseguia pelos corredores, mas isso era o que a primeira camada de fofoqueiros sabia. Bastava olhar mais de perto para saber que a reputação de bad boy o ajudava em muita coisa. Principalmente no que diziam as más línguas (as que já estiveram na goela dele, por exemplo).

Codinome BrócolisOnde histórias criam vida. Descubra agora