5 - parte 2

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Após o almoço tenho em mãos uma caixa cheia de mágoas. Já foram planos, já foram fatos, agora apenas são mágoas. Theo me observa ao longe, enquanto mexe em seu celular.

— Você devia jogar isso fora — comenta.

— Se houvesse um lugar onde eu pudesse colocar fogo nisso sem ativar o alarme de incêndio, seria perfeito.

Ele se levanta e vem até mim. Tira a caixa da minha mão e vai até a porta, abrindo-a. Então se vira para trás e faz um gesto com a mão me chamando. O sigo e entramos no elevador. Meus olhos estão sobre seu rosto, em um questionamento mudo de onde estamos indo, mas ele não parece se incomodar. Enquanto o observo fixamente, ele faz isso de volta. Por fim me canso e reviro os olhos, o que faz aquele sorrisinho voltar ao seu rosto. Descemos no vigésimo terceiro andar, o ultimo do prédio, e sigo um Theo irritantemente silencioso por dois lances de escada. Há uma porta larga de ferro ao final dela e Theo a abre. Estamos então no terraço.

— Uau! — Observo a cidade abaixo de mim, as árvores cercando os prédios, os carros bem pequenos lá embaixo. O vento é fresco e parece zumbir em meus ouvidos.

— Vai me dizer que nunca veio aqui? — ele pergunta.

— Nunca fiquei sabendo sobre este lugar em todos esses anos em que moro aqui — respondo de má vontade.

Ele ri baixinho.

— Moro aqui a menos tempo do que você e encontrei este lugar.

— Porque você é enxerido! Quem pensaria em procurar um terraço? O que é aquilo? — pergunto apontando para uma espécie de panela de ferro grande logo adiante, cercada por bancos.

— Uma fogueira.

— Você está brincando!

— Não mesmo. Pronta para queimar essa coisa?

Vou direto até o local e ele está certo, é uma fogueira. Há carvão recém queimado dentro dela. Observo que mais atrás, na outra extremidade do terraço, há uma cadeira de balanço de madeira. Theo coloca a caixa ao meu lado e se senta do outro lado, de frente para mim. A abro e observo as coisas lá dentro. Theo acende a fogueira e logo as chamas dançam por conta do vento. Ergo a caixa e a viro de uma vez, jogando tudo que há nela na fogueira.

— Devo confessar que eu esperava uma cena adolescente pegando papel por papel dessa bagunça para queimá-los um por um. Esperava até as histórias patéticas sobre cada papel queimado e veja só você sendo prática. Você é oito ou oitenta, não é, Bruna?

Dou de ombros enquanto tudo some no fogo.

— Melhor do que ser zero — respondo.

— Então queime, Bruna, não só esta caixa — ele diz e o observo. — Queima essa mágoa, você não tem que passar por isso. Um rompimento não significa sofrimento, significa recomeço. Siga em frente.

— Estou seguindo, eu nem tenho chorado mais — respondo.

— Mas parece que você ainda é noiva — provoca e aponta para minha mão, o anel que brilha aqui do qual ainda não me livrei.

— Acho que eu sou. Acho que vou acordar e ir para o salão amanhã. Vou fazer meu cabelo e vestir aquele vestido que o Otto detestou, mas que achei tão elegante.

— Devo me surpreender por você tê-lo desobedecido ao menos uma vez? — provoca, me irritando. Ele não percebe que este momento é difícil demais para mim?

— Você não sabe como era nossa relação.

— Você também não, parece perdida e presa a planos que estão queimando agora.

DEGUSTAÇÃO - O irmão ERRADOOnde histórias criam vida. Descubra agora