1 - parte 3

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Respiro fundo antes de entrar no elevador da empresa onde trabalho. Que merda eu tinha na cabeça quando aceitei trabalhar para ele? Sou assistente de Alonso D'Avila, o sócio do meu ex. A firma de advocacia pertence aos dois, e embora seja formada em direito, ainda não prestei o exame da OAB por me sentir insegura, então não posso advogar. Não que eu fosse ter essa chance trabalhando com Otto, constato irritada.

Assim que piso no oitavo andar acontece exatamente o que aconteceu nos meus pesadelos. Um silêncio se estende e todos os olhares estão sobre mim. Sorrio, cumprimento todos agradecendo aos céus por não ter saído para beber ontem, e me dirijo até minha mesa como se nada tivesse acontecido. Como se minha vida não tivesse virado do avesso na última semana. Mal me sento, meu chefe me chama.

— Vidal, na minha sala!

Alonso é um homem de meia idade, meio careca, meio rabugento e extremamente convencido. Ele se autointitulou o melhor advogado do país, mas a verdade é que ganhou quase todos os seus casos. Ele é tão bom que convence até mesmo um inocente que ele é culpado e ele acaba confessando tudo. Otto o admira e sonha em seguir seus passos, mas na verdade usa a fama de Alonso a seu favor. Para isso, deixa que o sócio faça o que bem entender na empresa, com medo de perdê-lo. Os dois doutores, brilhantes e respeitados, se convenceram que a coincidência nos sobrenomes de ambos era um sinal do destino para abrirem uma firma juntos.

Babacas.

— Bom dia, dr. Alonso.

— Você faltou por quatro dias, mas Otto pediu que não descontasse esses dias de você.

— Era o mínimo que ele podia ter feito — digo entredentes e ele me estende um olhar de pena.

— Espero que nenhum problema pessoal interfira no seu trabalho de novo.

— Não vai acontecer, desculpe senhor.

Ele continua me encarando, o encaro confusa e ele diz:

— Nenhum problema pessoal pode interferir no seu trabalho.

— Sim, senhor.

— Bruna, você vai continuar aqui? Vai continuar sendo subordinada do seu ex-noivo?

Abro a boca, mas nada sai, apenas gaguejo, gaguejo e me pergunto porque não havia pensado nisso. Por que Olivia não pensou nisso e não me ofereceu emprego em um de seus salões? E então um soluço me escapa e começo a chorar copiosamente, meus ombros tremem, meu nariz escorre, escondo o rosto nas mãos e choro. O dr. Alonso me abraça sem jeito e pede que eu me acalme e claro que, quando a cena lamentável termina, toda a empresa está do lado de fora olhando para mim com olhares de pena.

Por toda a manhã fico chorando no banheiro. Mas depois de descontar em Olivia meu ódio por ela não ter previsto isso, almoço e volto ao trabalho. Um sorriso no rosto, passos firmes, uma confiança que nunca na vida tive. Até que alguém se aproxima da minha mesa e pergunta:

— Ele tem outra?

— O quê?

— Ele não tem outra! Ele apenas foi descansar! — Júnia, a assistente de Otto responde.

Ela é uma senhorinha metida a esperta que nunca me suportou.

— Ele vai voltar? — outra pessoa pergunta.

— Em alguns meses. Ele tirou um ano sabático — Júnia de novo.

— Mas por que ele viajou antes do casamento? Não podia esperar pra vocês irem juntos?

Encaro Júnia esperando a resposta como se ela soubesse, mas ela apenas dá de ombros e acaricia meu cabelo com sua mão pesada, dizendo que sente muito.

DEGUSTAÇÃO - O irmão ERRADOOnde histórias criam vida. Descubra agora