Alice sentiu como se o sol enfim brilhasse depois de seis anos coberto pela lua. Carlos era seu eclipse pessoal e ela nunca tinha percebido.
Carlos assinou os papéis da separação e deixou o júri mau humorado. Alice recebia abraços de todos que estavam ali por ela. Ela poderia deixar o país sem amarras e seus amigos também sentiam alívio por ela deixar Carlos para trás, isso queria dizer que eles poderiam se preocupar menos com a presença dele em suas vidas.
Estava na hora das despedidas. Alice tentou entrar em contato com sua mãe algumas vezes, mas ela nunca atendia seus telefonemas, então Alice decidiu dar adeus através de uma carta, mesmo que Celeste a ignorasse, ela sentia que estava ao menos fazendo a sua parte. Alice escreveu assim:
Porto Alegre, junho de 1983
Mãe, a senhora ignorou todas as minhas ligações, eu espero que não ignore essa carta também.
Já faz algum tempo desde que nos falamos pela última vez, mas apesar dos nossos desentendimentos, eu preciso que saiba que a senhora é muito importante para mim. Eu não sei onde eu errei nem se meus erros são imperdoáveis, mas me machuca você me afastar dessa forma. Sinto muito se nunca fui a filha perfeita, se não atingi as suas expectativas ou se te fiz sofrer de alguma forma, nunca foi minha intenção.
Eu sinto como se sempre estivesse um passo atrás de onde você queria que eu estivesse, desde sempre. Acho que vivi tanto em sua função que me esqueci de me fazer feliz. Eu acredito que você sempre teve as melhores intenções como mãe, mas chega uma hora que a gente quer voar sozinho. Estou tentando voar desde 1976.
Para a senhora, Carlos era o marido perfeito para mim, mas mais uma vez eu quebrei as suas expectativas: estou oficialmente separada dele, na justiça, para sempre. Eu sinto muito que você não tenha confiado em mim quando eu disse o que ele fez, agora só me resta seguir em frente, com ou sem a aprovação da senhora.
Estou saindo do país a trabalho, mas sendo sincera, eu não sei se volto para o Brasil tão cedo. Não há mais nada aqui para mim. Continuarei em contato com as minhas amigas e meus amigos, se a senhora quiser me encontrar, sabe com quem buscar meu novo endereço e telefone, será um prazer receber a senhora em minha nova casa. Meu único desejo é que eu pudesse te ver antes de partir, mas lá no fundo eu sei que é impossível.
Te desejo as melhores coisas, mãe. Que a senhora tenha uma vida boa, que possa ser feliz. Sei que você era antes de eu nascer, talvez agora possa voltar a ter os anos brilhantes que tinha antes de mim.
De sua filha, Alice
Alice deixou cair algumas lágrimas no papel enquanto escrevia. Com a tinta da caneta mesmo manchada ela colocou a carta no envelope e preencheu o verso com seu endereço de sua cidade natal. Escrever aquela carta para a mãe a deixou inspirada para se despedir de seus amigos em pequenos bilhetes, então Alice voltou a se sentar na mesa de cabeceira e escreveu um bilhete para cada pessoa que foi importante para ela durante sua jornada.
Para Olívia, ela escreveu:
Quarto de hóspedes, junho de 1983
Sei que você achará piegas o fato de eu estar me despedindo duas vezes de você, Olívia, sendo uma delas por esse bilhete, mas eu imaginei que se eu escrevesse poderia me expressar melhor do que simplesmente te dar um abraço e dizer adeus no aeroporto.
Você lembra quando eu te procurei pela primeira vez, atrás de uma república onde ficar e você me acolheu mesmo sem ter espaço na sua? Naquele dia eu soube que você ficaria na minha vida para sempre, e isso só se confirmou para mim quando fomos juntas ao cinema depois do meu primeiro porre e eu jurei nunca mais beber na vida. Essa promessa nunca se cumpriu. Você é muito melhor em cumprir promessas do que eu.
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O que fazem cem bilhões de estrelas
ChickLit*Esta foi a primeira versão do livro, antes dele ser editado para publicação na Amazon. No mesmo ano em que Alice recebe reconhecimento no seu trabalho no observatório de astronomia, seu marido é rebaixado na empresa do próprio pai, então ele fará...