Capítulo 2

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Aquela era mais uma noite normal no observatório, metade da equipe trabalhava na papelada e a outra metade observava corpos celestes; Alice fazia parte da segunda equipe.

― Helga, olha isso.

― É algum asteroide que conhecemos?

― Não, e eu nem tenho certeza se é um asteroide ― Alice se recostou em sua cadeira. ― Tem alguns dias que eu venho observando ele. Apareceu do nada, achei que ele fosse sumir logo em seguida, mas continua chegando cada vez mais perto da Terra.

― Pode ser uma anã branca.

― Mas se fosse nós já não teríamos visto? E uma anã branca viajando assim pela galáxia?

― Espera ― Helga começou a folhear seus arquivos rapidamente enquanto Alice a observava com dúvida. ― Achei! Onde está nosso "asteroide" costumava viver uma nebulosa.

― Impossível. Será? Assim tão perto da Terra?

― No universo tudo é possível. A nebulosa está formando seu próprio sistema planetário ― Helga agarrou os ombros de Alice com fervor. ― Você acabou de descobrir uma galáxia em formação!

Então Helga espalhou a notícia pelo observatório. Não é todos os dias que se descobre uma galáxia inteira, muito menos uma anã como essa, porque pelo seu pouco brilho, são difíceis de enxergar e chamam menos atenção que as galáxias maiores. Alice sentia seu coração alegre, mas logo ele se escureceu quando pensou em compartilhar a descoberta com Carlos. Seria mais uma que guardaria só para si mesma como todas as outras. 

Perto do marido ela sentia uma galáxia anã, muitas vezes ignorada, sempre pequena, sem importância. Alguns dias não se sentia nem uma galáxia, era só uma estrela desgarrada vagando no espaço, à deriva, fraca demais para ser vista no meio de uma Via Láctea inteira que era Carlos.

― Um brinde ― disse o chefe na reunião da noite ―, ao ótimo trabalho de Alice e ao seu primeiro ano conosco que vem se mostrando cada dia mais próspero!

― Eu estou orgulhosa de você ― Helga segurou os ombros de Alice e os apertou suavemente entre as palmas das mãos. ― Que cara é essa?

― Carlos não quer que eu vá à conferência ― Alice respondeu cansada apertando os dedos de Helga entre os seus.

― Sinceramente ― suspirou Helga ―, eu não achei que duas gerações depois os homens continuariam iguais.

― Eu não tenho o que fazer ― continuou Alice ― Eu não quero mais brigar, mas tudo que eu faço parece estar errado para ele.

― Eu não vou deixar você cometer o mesmo erro que eu cometi ― Helga respirou fundo e se sentou junto a bancada do café. ― Há dez anos eu recebi um convite muito parecido com o seu, eu não era nova aqui no observatório, já tinha caminhado um pouco antes disso e feito algumas pesquisas importantes. Meu marido achou aquilo um erro porque eu tinha sido convidada e ele não. Nós tivemos uma discussão feia em casa, por isso eu sei pelo que você pode estar passando. Ele enviou o convite de volta com uma errata dizendo que o astrônomo errado tinha sido convidado; por fim aceitaram, "consertaram" a situação e ele ficou com todos os meus créditos e é aqui, Alice, que a história pode ser evitada de se repetir: o Carlos não é astrônomo, ele não trabalha aqui, ele não pode te roubar como fui roubada.

― Eu sinto muito que você tenha passado por isso, Helga, eu não fazia ideia.

― Não faz diferença agora, eu já fui apagada da história, mas a sua estará só começando se você se permitir.

O que fazem cem bilhões de estrelasOnde histórias criam vida. Descubra agora