Capítulo 10

18 4 31
                                    

Ballet – 2ª posição: Os pés ficam afastados e en dehors (para fora), calcanhares longe um do outro e os pés bem firmes no chão. Os braços arredondados e abertos para os lados, sem ultrapassar a linha dos ombros.

Lizbeth

– Liz, quer conversar com a gente? – Ouço a voz do meu avô através da porta, depois de dar dois toques na madeira.

– Agora não, vô. Desculpa.

Minha voz sai rouca pelas horas que passei no absoluto silêncio.

– Tudo bem. Quando quiser, é só falar.

O barulho dos passos vai diminuindo à medida que ele se afasta e eu relaxo o corpo contra o espelho do estúdio de ballet do apartamento.

Quando meus avós vieram escolher o lugar que eu iria morar, fizeram questão de montar uma sala de ensaio para mim, mesmo eu não dançando mais. Faz um tempo que parei e meu corpo não está mais acostumado com o ritmo que o ballet exige.

Eu sempre digo para mim mesma que vou voltar, mas os dias passam e eu vou deixando para depois, o medo vai crescendo até virar um monstrinho repulsivo e apavorante e eu nunca dou o primeiro passo.

É só um telefonema. Uma ligação para que eu volte para as aulas, mas não consigo. O celular em cima da mesa chama minha atenção e depois de olhar para ele eu fico de pé, fingindo não ver.

– O que eu faço mãe? – Sussurro, encarando pela janela o dia que está indo embora. Os raios alaranjados no céu sobre os arranha-céus e a penumbra que começa a surgir. – Me dá um sinal, mãe. Qualquer um.

Meus olhos começam a arder e a pressão neles se torna insuportável, até que caminho para o computador em cima da mesa e coloco uma música um pouco agitada.

Movo meu corpo por instinto. Deixo o som me guiar e não demora muito até eu sentir o suor se formando na minha pele.

A cada giro, a cada vez que meu corpo se eleva sobre meus dedos e eu sinto a dor e a pressão, uma lágrima desce pela minha bochecha. Eu salto e me arrependo, minhas pernas sem forças para me sustentar quando pouso, perdem o equilíbrio e acabo de costas no chão.

– Droga! – Eu bato com a mão no piso de madeira embaixo de mim enquanto tento recuperar o fôlego, meu peito subindo e descendo rápido demais. Com as costas da mão, limpo o rastro das lágrimas do meu rosto, a vontade de chorar aumentando – apesar das lágrimas que escaparam – a ponto de se tornar quase insuportável.

Escuto gritos e vozes altas do lado de fora e me sento quando escuto a porta sendo esmurrada, só que a voz que eu escuto não é dos meus avós. Me levanto depressa quando ela abre de uma vez só, batendo contra a parede com força.

Não! Por favor, qualquer coisa menos isso agora.

– Liz, minha filha. Como você...

– Sai! – Richard Lambertini está parado na minha frente.

– Liz, conversa comigo. Escuta o que tenho para te falar.

– Sai daqui, por favor.

Meu peito começa a apertar e eu respiro fundo para não entrar em desespero. Está tudo bem, eu não estou sozinha.

– Eu não vou sair até você falar comigo. – Eu levanto a cabeça quando escuto a voz dele ficar mais séria. – Eu deveria ter vindo antes. Nós precisamos conversar, filha.

– Sim, precisamos. – Admito. – Só que eu não quero.

Eu passo por ele, forçando caminho, e quase bato na minha avó que estava na porta. Não tenho nenhuma intenção de ser educada com esse homem. Eu ainda não me tornei um ser tão evoluído assim.

Strawberry & Coffee [DEGUSTAÇÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora