- Perna de Magia... Você realmente está indo ao encontro da Tecedeira? - Irene quebrou o silêncio.
Toni estava analisando aquela mulher. Era mais ou menos da altura de sua irmã. Achou os olhos muito bonitos, puxados para o mel, com salpicos de verde aqui e ali. Seu semblante era ilegível, mas parecia estar levando aquela história da Tecedeira a sério. Ao menos não exibia aquela expressão incrédula de chacota que todos lhes dispensavam quando esse assunto era tratado. Mas ostentava uma de ligeira descrença, como se eles fossem incapazes de conseguir o que intentavam. Não porque a Tecedeira não existisse, mas porque eles é que não tinham habilidade para alcançá-la.
- E você a conhece? - Toni tentou manobrar a conversa.
- Digamos que é uma velha conhecida que não vai com a minha cara... Mas, convenhamos, vocês não conseguiriam chegar lá sozinhos.
- Por que não? - Ren indagou, com cara de poucos amigos.
- Porque tem que conhecer o caminho, e usar a magia certa para abrir os portões. Aquela velha bruxa não gosta de visitas. Mas felizmente vocês estão comiguinho aqui, que conheço todos os detalhes sórdidos. - Deu um sorriso enorme.
- Se ela não vai com a sua cara, como você conhece a magia certa pra entrar? E por que você nos ajudaria?
- Conheço a magia certa porque eu tenho meus contatos. E vou ajudá-los porque sou como a água, meu caro Perna de Magia. Vou aonde o caminho me levar. E já que estou aqui, quero ver como os dois novatos se sairão na jornada.
- Você é tão vaga que me assusta. Por que será que não acredito em nada do que contou?
A misteriosa Irene deu uma risada efusiva. Ela era na verdade de gestos calorosos, expansivos. Encarava os irmãos com um sorriso cálido. Aparentemente, levara o comentário do irmão mais novo como brincadeira. Ou, se percebeu o quanto Toni desconfiava dela, fez questão de se fazer de desentendida.
- Fique tranquilo, Perna de Magia. No momento, eu só quero algo pra comer.
- Bom, se ela é suspeita ou não, eu também estou com fome. Vou ver o que arranjo pra gente comer. - Ren sumiu por uma porta adentro.
Sem um pingo de constrangimento, Irene se sentou em um banquinho que estava caído ali perto, mostrando um meio sorriso. Toni observou a moça, enquanto tomava o leme do navio.
- Posso então presumir que você não é uma mercenária atrás das nossas cabeças, certo, Irene?
- Sim, pode presumir. Ora, vamos, você já deve ter percebido que se eu realmente fosse uma mercenária, já teria pegado vocês.
- Devo admitir que você é uma incrível usuária de magia. Você é muito boa nisso!
- É a prática, rapaz! Existem muitas formas de se usar magia, e vejo que vocês conhecem algumas variações de magia de luta, apesar de se segurarem ao máximo para não usar.
- Então você percebeu? É claro, se a gente usasse magia de qualquer jeito com aqueles pobres diabos, podíamos até matá-los!
- Eram só uns piratas. Isso não deveria incomodá-los tanto. Se usassem logo de cara, evitariam todos esses machucados.
- Bom, a gente prefere não exagerar. Então, você sabe como chegar até a Tecedeira?
- Sim. Como eu disse, é uma velha conhecida. Já estamos bem perto, na verdade. Deixe-me apenas comer algo, e mostro pra vocês.
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O dia ia pela metade, e todos agora comiam. O sol continuava forte no céu, e uma leve brisa soprava. Não falaram enquanto degustavam a comida. Os irmãos ainda não se sentiam à vontade para agirem normalmente perto da misteriosa mulher de cabelos castanhos. Eles eram muito parecidos em alguns aspectos, como, por exemplo, agirem de forma introspectiva com pessoas fora do círculo familiar. Perfeitos "bichos do mato", diriam alguns, pois eram inábeis com relações sociais externas. A vila onde foram criados era extremamente pequena. Mas isso vinha mudando aos poucos, desde que se colocaram naquela viagem de destino incerto.
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Perna de Magia
FantasyToni Maro é um jovem com uma doença incurável, problema que lhe ocasionou a perda de uma das pernas. Com o uso da magia, uma antiga arte esquecida no mundo de Novea, ele é capaz de recriar uma perna de pura energia. Mas a doença continua avançando...