Gaby e o mar. O mar e Gaby. Será que o ditado tem razão e longe da vista é mesmo longe do coração?
É curtinha, mas é de coração.
As últimas frases são desta música: https://youtu.be/nfK5F9ZqzAc___________________________________________________________
Estou em Biarritz, mais precisamente numa casa próxima de la ville Belza. Sabes como eu sempre gostei do mar então poder-se-ia dizer que estou bem. Na verdade, não, mas é um bálsamo para a alma (e olhos) esta paisagem pintada de azul, com as rochas de arenito aqui e ali como pequenas ilhotas de que ninguém estava à espera. Bem que podíamos ter essa capacidade de sedimentação, de sermos felizes onde estamos, sem qualquer vontade de ir além. Contudo, não somos rochas. Estas palavras que te escrevo também estão perto do mar, muito perto. Estou sentada num rochedo a molhar os pés. É imprudente da minha parte, mas sei que não me irás julgar, pois se há quem tenha a imprudência como melhor conselheira, esse alguém és tu.
A água é gelada e sou levada para longe, embalada por esta sensação que nada é tão grande que não possa caber dentro desta abundância. Foste tu quem me levou a ver o mar pela primeira vez. De todas as lembranças que guardo da minha vida, essa é uma das que me é mais cara ao coração. Foi em Bordeaux. Na praia de Porge-Ócean. Que praia maravilhosa. É como se soubesses tudo aquilo que eu mais gostava na natureza e tivesses escolhido a dedo justo aquele lugar para eu conhecer o mar. As árvores verdejantes a perder de vista, espalhadas ao longo de toda a costa contrastavam com a areia marfim que nos levava até à água através das suas majestosas dunas. O meu olhar perdeu-se e já não estou em Biarritz, mas nessa praia, onde corremos felizes e despreocupadas pelas encostas de areia, a rir sem parar e meu Deus, como era bom. Uma onda de pesar abate-se sobre mim. Porquê é que não pudemos ficar assim pelo resto da vida?
Mas isso foi antes. Antes da vida ter decidido que não era para ser. Antes do mundo decidir que estava na hora de fazermos parte da sua enorme peça de teatro a que chamamos destino. No entanto, nós sempre teremos algo daquela praia. Ou será aquela praia que sempre terá algo de nós?
Deixo que a algidez se instale na minha pele e que abrace os meus pés. É como diz a escritora, engraçada essa ideia que o mar nos dá de que somos nós que entramos nele. É um pouco como o amor. Não será por acaso que o verbo amar termina com a palavra mar. Pena que só ele está perto de mim. Espero que onde quer que estejas, tudo te corra bem. Mesmo que viva só de lembranças do que já fomos (e será que chegamos a ser, de facto, alguma coisa?) e não entenda a brutidão da tua partida depois do que se passou naquele dia, sou incapaz de desejar-te mal. Cansei-me de fingir que te odeio.
Ah, já agora, comprei umas calças. São brancas, de linho. A madame elegante e elitista está a dar lugar a uma outra mulher. Gostava tanto de ver a tua reação ao ver-me assim. Acho que ias gostar. Pelo menos esta mulher não desistiria de ti sem lutar. Será que querias que eu lutasse por ti? Talvez seja assim que tudo acaba, pode ser que talvez nada nos avise que acabou. O que mais custa é não saber de ti. Não saber se me esqueceste, não saber se me perdeste. Não saber se te perdi.
Com amor,
Gaby
P.S. Envio junto com a carta um cartão postal porque sei como gostas de cartões postais. Dizias que eram pedaços do mundo que iam connosco para qualquer lugar. Quem sabe assim, um pouco dos nossos mundos não se encontre.
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À bientôt ❤️
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L'automne 37
Fanfiction"Foi em 37. No Outono de 37. A vida era tão simples. E, de repente, tudo mudou. Não fazia ideia do me esperava. Não poderia sequer imaginar o quanto este encontro, este estranho acaso mudaria a minha vida. Era tão jovem para entender, Pierrette. Mas...