O1 - Bem-vindo.

1.3K 90 97
                                    

   Pran não sabia dizer ao certo se amava ou odiava o turbilhão de sensações que o invadiam. Ao mesmo tempo que parecia estar em casa, se sentia um completo intruso, e isso o fazia se questionar, novamente, se estava sendo insensível por fazer com que ambos revivessem tudo aquilo.

Quando colocou a caixa com parte de seus pertences no chão e olhou ao redor teve a impressão de que talvez lá no fundo, aquela fosse a escolha certa. O surpreendia de um jeito bom como o lugar parecia ter congelado no tempo. No dia em que ele partiu. Era tudo exatamente como se lembrava. As fotos na parede, os desenhos no calendário e até Nong Nao sobre a cama de Pat. Tudo ainda estava ali. Inclusive o vazio deixado por si.

A realidade em que Napat havia optado por morar era um tanto quanto triste, mas por algum motivo, o alegrava. Saber que ele não havia substituído um grão de poeira sequer, tampouco apagado o enorme espaço em branco que ali havia se criado. Uma parte de si queria acreditar que o mais velho não se importava o suficiente para isso. Outra, que ele ainda estava apegado aos resquícios de sua breve estadia. Pran não sabia a resposta de várias coisas, na verdade. Estava confuso e dividido entre emoções e suposições, mas se tinha algo que o intrigava... era onde ele estava se não ali.

Não que fizesse questão que ele estivesse. Na verdade, era melhor assim. Quanto mais seu encontro fosse adiado, melhor seria. Tinha imaginado mil e uma vezes a expressão carregada de rancor, confusão, raiva e indignamento que Pat faria ao revê-lo e isso o corroía por dentro. Imaginar que, a pouco tempo atrás, seria recebido com abraços e beijos demorados e seria com toda a certeza do mundo lembrado várias e várias vezes de como era amado e fazia falta. Mas as coisas não eram mais assim. Não depois de ter ido embora de forma tão dolorosa. Acontece que mesmo que esses pensamentos o consumissem, Pran não admitiria que se arrependia. Que sentia falta, todos os dias, e que daria tudo para voltar no tempo. Voltar naquele dia.

Já passava das dez.

Pat nunca foi fã de atividades que exigissem que ele abandonasse sua cama por muito tempo. Pran sabia disso e repetia o fato para si mesmo de novo e de novo em sua mente, enquanto ao mesmo tempo, jurava não se importar.

Era mais de meia noite quando se questionou sobre a ausência alheia pela última vez. Já tinha limpado o armário, desfeito as malas, trocado os lençóis e até jantado, mas aparentemente Pat não estaria ali para ver. Não importa, é melhor assim.

Repetia na intenção de acreditar.

Os pensamentos e perguntas retóricas se tornavam mais constantes quando finalmente ouviu um som vindo do lado de fora. Chaves se esforçavam para encontrarem a fechadura. Pran se perguntava qual era a dificuldade em encontrar algo tão explícito. Qual o motivo da impaciência?

Engoliu seco quando viu Pat se jogar para o lado de dentro do quarto sem noção alguma de controle sobre o próprio corpo. Suas pernas andavam sozinhas naquele ponto, e era nítido. Mas mais surpreendente ainda, foi a forma em que o mais velho se virou em direção à porta de madeira, exclamando alto, sem muita dicção:

Shiia! Que irritante!

Pran ficou imóvel. Tanto pelo choque quanto pelo impasse em que tinha acabado de se colocar. Ficou dividido entre continuar parado ou correr até a cama esperando que seus passos fossem rápidos demais para serem percebidos. Pat erradicou a última opção ao soltar um grito que consequentemente assustou o mais novo também. 

Agora ambos se encaravam, Pat em posição de defesa e Pran com um semblante confuso, buscando entender se o motivo da surpresa era de fato, ele.

Ao menos deve ter o deixado sóbrio. 

Parakul pensou. A forma como Pat o encarava de cima a baixo repetidamente lhe provava que não.

ㅡ Caralho... - fechou os olhos com força, abriu, os esfregou, balançou a cabeça. Pran continuava ali, e Pat começava a se aproximar. Queria a todo custo evitar com que isso acontecesse, mas quanto mais olhava ao seu redor buscando alternativas de escapar, mais o garoto se aproximava, o colocando em desespero por não saber o que se passava em sua cabeça. Quando Pran estava prestes a ser encurralado contra o balcão, Pat parou. Para sua surpresa, o semblante confuso e defensivo gradativamente se transformava em um sorriso, mas Pran não sabia se gostava muito disso. 

Beliche de CimaOnde histórias criam vida. Descubra agora