Ariana
Eu estava na cozinha, entre a pia e a estante vazada que separava a cama do restante da quitinete, montando um arrumadinho com feijão verde cozido, vinagrete, farofa, charque acebolado e macaxeira frita; quando bateram na porta. Pensando em quem poderia ser, fui atender.
Heitor. Era a primeira vez que ele aparecia na minha porta e fiquei surpresa ao vê-lo ali parado no corredor.
— Heitor?
Ele me olhou com uma seriedade que eu nunca tinha visto antes.
— Soube que é o seu dia de folga. Eu queria conversar, Ariana, sobre algumas coisas que têm acontecido na minha família. Se eu não me abrir sinto que vou explodir. Podemos sair, se você preferir.
— Vou pegar o celular. Me espera lá embaixo?
Fechei a porta e fui procurar o dito cujo. Era incrível como eu conseguia perdê-lo naquele espaço minúsculo. A verdade é que tinha ficado nervosa com o surgimento inesperado de Heitor, ainda mais ao ouvi-lo falar sério daquele jeito, pela primeira vez desde que o conhecia. O que será que ele tinha para falar? Será que tinha a ver com Vinícius?
Encontrei o telefone embaixo do livro de receitas que eu estava escrevendo, apanhei a bolsa, calcei um par de tênis e saí, encontrando Heitor lá embaixo, encostado no SUV, fumando um cigarro. Ele jogou a bituca na rua e abriu a porta para eu entrar, deu a volta e sentou atrás do volante. Não fiquei surpresa quando Heitor me levou até o Armazém, mas estranhei o estacionamento vazio.
— É o meu dia de folga também — explicou, estacionando ao lado da construção.
Entramos. O ambiente era diferente quando estava vazio. Me lembrei do dia em que tinha ido com Vinícius, dele me perguntando se Heitor e eu havíamos tido alguma coisa. Eu gostava de Heitor, mas nunca o havia levado a sério, por causa do seu jeito. Apesar das provocações durante o tempo em que trabalhei para a família, ele sempre me respeitou e nunca tinha chegado nem perto de tentar me beijar. Eu o via quase como um irmão mais velho, o que nunca tive. Meus pais haviam se casado tarde e me tiveram quando minha mãe estava perto dos quarenta anos, parando em mim. Agora eles estavam aposentados e viviam num sitiozinho que compraram fora da cidade, onde criavam algumas cabras e tinham uma plantação de macaxeira.
— Vamos para a cozinha — chamou Heitor. — Vou lhe preparar o almoço.
Heitor Castro Oliveira preparando o almoço para sua ex-cozinheira. O assunto era sério.
Acabamos preparando juntos uma peixada. Sentamos na varanda onde havia uma rede e um banco tosco de madeira. Heitor puxou uma mesa, colocando-a na frente do banco. Dali podíamos ver o Princesa, atracado sobre as águas plácidas do Velho Chico.
— Vinícius lhe contou que Ana Beatriz está voltando para casa? — Perguntou Heitor.
Eu não tinha voltado a encontrar Vinícius desde o almoço de domingo. Ele havia telefonado dizendo que estava resolvendo alguns problemas na vinícola, que era para eu esperá-lo. Esperei por ele por 21 anos e alguns dias não iriam me matar, a não ser a saudade que sentia dele.
— Não.
— Dr. Otávio foi pessoalmente buscá-la em Recife. Tia Lívia foi junto, depois de trazer a notícia de que minha irmã caçula está tendo um caso com um homem casado.
Senti o queixo cair. Ana Beatriz e eu tínhamos a mesma idade, ela sempre foi educada e me tratou bem. Eu sabia dos planos que Dr. Otávio tinha depois que ela se formasse em direito, ele queria que ela seguisse o magistrado, que viesse a se tornar juíza e futuramente seguir a carreira política. Devia ter sido um golpe para Dr. Otávio ver seu sonho de ter um dos filhos na política ruir e descobrir que sua filha preferida tinha se desviado das vertentes dos bons costumes, pregados em sua casa.
— Sua mãe deve estar arrasada.
— Desde que ninguém na cidade saiba, Dona Laura aguenta o baque. Dr. Otávio sim, ficou arrasado. E tem mais, tia Lívia se separou e vai voltar a morar no casarão.
Da próxima vez que eu fosse almoçar no casarão, se houvesse convite, a família estaria reunida, faltando apenas Heitor.
— Posso lhe fazer uma pergunta?
Heitor levantou os olhos.
— Pensei que nunca ia perguntar.
Não seria o Heitor, se não houvesse um gracejo.
— Por que você se afastou da família?
Heitor tomou um gole de cerveja, passou o dorso da mão nos lábios, enquanto refletia sobre a pergunta.
— Tem certeza que quer saber? Você pode não gostar.
Fitei aqueles olhos verdes, incerta. Heitor puxou um cigarro e acendeu. Tragou profundamente, expelindo a fumaça para o alto.
— Tem a ver com Vinícius.
Revelações no próximo capítulo😉
Não esqueçam da estrelinha😘
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Segredo de Família(Link no Perfil)
RomantikDois irmãos, nascidos nas terras semiáridas no Vale do São Francisco, em uma família abastada, passam a disputar o amor da mesma mulher. Vinícius Castro Oliveira é o filho do meio, envolvido em um escândalo e afastado por sua família quando era adol...