30. Declarações e cicatrizes

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Fechei meus olhos novamente, minha mãe estava ali do lado e eu não queria levar uma bronca sobre o quão irresponsável eu fui.

Fingi estar dormindo até que ela saísse do quarto, ela cochichou algo com alguém e em seguida ouvi passos vindo até mim.

- Ale - ah, era o Matias... - Eu estou tão mal de te ver assim. Toda machucada... - continuou, ele pegou minha mão. Eu não mexi nem um músculo, me recusava a conversar com ele naquele momento, estava sentindo vergonha da minha situação e do surto que dei. - Eu não fui um bom amigo, eu sei, eu fui o pior amigo que você poderia ter e se quiser... não precisa mais ser minha amiga, eu vou entender.

Por Deus, do que ele estava falando?

- Mas, pra falar a verdade, eu nunca tive a intenção de ser seu amigo... - Ok, do que esse garoto ficou completamente louco. - Eu sempre tive a intenção de ser bem mais do que isso... E como você está dormindo, acho que não tem problema eu dizer - Não, eu não estou dormindo, por favor, diga que eu estou alucinando mais uma vez, pensei.

- Ale, você é a menina mais bela e também a mais destemida e independente que eu conheço. Você sempre me chamou atenção... bem mais do que todas as meninas. Eu sempre achei que uma garota como você jamais daria uma chance para um cara como eu, continuo achando. Mas só de poder te ver sorrir, só de poder fazer da sua vida um lugar um pouquinho melhor, eu já estou satisfeito. Eu não espero que um dia você sinta o mesmo por mim, mas eu vou continuar fingindo me contentar com a sua amizade. E, respondendo a sua pergunta: há muitas razões para você viver; e uma delas é porque a minha vida só é feliz por você estar nela, e se um dia você se for... Eu não aguentaria, nem um segundo sem você na minha vida. Eu te amo, Alone. Sempre amei e sempre vou amar. Mesmo que você não sinta o mesmo... Eu vou continuar te amando.

Ele fungou o nariz, tirou sua mão bem delicadamente da minha, para que eu não acordasse e saiu. Meu coração estava disparado como nunca. Ele havia acabado de se declarar para mim?!

Mas ele disse que ia continuar fingindo ser meu amigo e de qualquer forma ele não sabia que eu estava ouvindo... Ok, eu sei que sou muito covarde de fingir que nada aconteceu, mas, eu não sabia o que fazer. Eu não sabia como agir!

Minha mãe entrou de novo no quarto e me viu bem acordada.

- Filha! Que bom que você acordou! - ela deve ter notado que eu estava pálida, eu tinha certeza de que estava, pois me olhou com uma cara de pena - Eu só espero que não assuste muito quando vir essa cicatriz na boca.

- Cicatriz? Me dá um espelho. - berrei.

Ela fez sinal para que eu falasse mais baixo, afinal, aquilo era um hospital e me entregou um espelhinho redondo de maquiagem, que tirou da bolsa.

Logo que virei-o para mim, vi que não era mentira, realmente tinha uma grande cicatriz que começava no buço e terminava no início do queixo. Fiquei um pouco assustada no começo, mas depois de um tempo a encarando, comecei a achar bem bonitinha... Me deixava parecendo mais ameaçadora. Era exatamente o que faltava em mim!

Minha mãe viu minha reação e balançou a cabeça de um lado para o outro. - Você é estranha, normalmente pessoas detestam cicatrizes e marcas.

- Eu acho que fiquei mais assustadora com ela. Era o toque que precisava. - Sorri, mas ainda pensando no acontecimento anterior.

Ela riu, mas logo em seguida ficou séria - Filha, você sabe que o que vocês fizeram foi errado, não é? Eu sei que esse acidente não aconteceu pela pista, e sim por uma sabotagem, mas mesmo assim...

A interrompi: - Uma sabotagem?

[...]

- Eu pedi pra um amigo que trabalha comigo dar uma olhada no seu carro... e ele constatou que várias peças estavam soltas na hora em que você voou do carro e como sabemos que você, que é a única que anda nele, não as soltou, então alguém foi...

Fiquei pensando um tempo, a única pessoa que sabia da existência daquele lugar, além de mim e minha mãe, era o Matias, e eu tinha certeza de que ele não tinha sido, até porque foi ele quem me socorreu e chamou a ambulância. E eu também confiaria o mundo nele, o Matias é a pessoa mais confiável que existe.

A sorte que eu tinha era que o carro não capotou ao frear, apenas me jogou para fora por conta do impacto. Então quase não foi danificado, a não ser, claro, os pneus.

Eu estava vagueando pelos meus pensamentos, quando ele entrou novamente. Provavelmente minha mãe tinha o avisado que eu estava acordada agora.

Olhei para ele e senti algo diferente das outras vezes, não era mais o Matias. Era o Matias que havia acabado de confessar algo que poderia mudar nossas vidas para sempre. Antes eu ainda pensava que ele só queria a minha amizade, eu realmente tentava acreditar nisso, mas agora... eu estava confusa.

Ele sorriu pra mim e me deu um beijinho na bochecha. - Como você está, Ale?

Olhei pra baixo meio envergonhada. Eu nunca tinha ficado com vergonha dele antes... mas agora tudo parecia tão estranho.

- Eu tô bem. - disse fitando o chão.

Ele me encarou um pouco. Depois desceu o olhar para a minha boca. Eu tinha certeza que estava vermelha e minhas bochechas queimavam. Mordi os lábios em uma tentativa (mal-sucedida) de fazer com que ele focasse em meus olhos.

Ele foi com o dedo e passou a mão de leve perto da minha cicatriz.

Aí que eu lembrei da existência dela e que também demoraria um pouco pra me acostumar com as pessoas olhando pra minha boca por conta disso. Me senti idiota por pensar que ele estava olhando com outras intenções.

- Mesmo com a marca você continua linda - ele voltou a olhar para os meus olhos.

Não consegui segurar um sorriso e balancei a cabeça de um lado para o outro. Então fiquei séria lembrando do que minha mãe havia dito há pouco. - Matias, minha mãe me contou que pode ter havido uma sabotagem no carro antes de a gente ir no autódromo.

- Eu sei, eu não queria te preocupar com isso agora, mas tudo indica que sim. Realmente aconteceu.

Suspirei, olhando pro teto branco - Eu só não faço a mínima ideia de quem possa ser. Tem muitas pessoas que poderiam fazer isso. Você sabe, tem muita gente que me odeia nesse mundo.

Ele pensou um pouco. - Mas eles não sabem da existência do autódromo. Pelo menos não os da escola. Então eu tenho quase certeza de que foi alguém de fora. Eu vou fazer de tudo pra descobrir quem fez isso! Eu te prometo.

Peguei na mão dele e reparei que seus olhos brilharam. - Você não precisa fazer nada, ok? Você não está me devendo, como deve pensar... Eu não vou te culpar pelo acidente. - fixei meu olhar nele para que visse que eu estava falando a verdade.

Seus olhos pareceram se encher enquanto falava: - Foi minha sim, Ale. A sua mãe já tinha pedido pra gente não ir lá naquele dia, mas eu te convenci... eu não devia ter falado pra gente...

- Wilians. Está tudo bem. -

Pedi pra que ele chegasse mais perto e dei um beijo demorado em sua bochecha. Vi que ele ficou todo arrepiado e corou no mesmo momento. - Agora você já pode ir pra casa descansar, você passou a noite toda aqui?

Ele fez que sim com a cabeça.

- Você é doido! Vai pra casa dormir um pouco. Eu vou ficar bem.

- Não, eu vou ficar aqui até você melhorar e for pra casa e vou cuidar de vo... - o interrompi.

- Você é um anjo, mas tudo que eu preciso agora é que você vá para casa e descanse. - Passei a mão pelo seu cabelo e coloquei um pouco atrás de sua orelha. - E obrigado. Talvez eu não tivesse aguentado se você não tivesse chamado a ambulância. E me desculpe por surtar.

Alone Por Alone Onde histórias criam vida. Descubra agora