— Você só se esqueceu de movimentar o polegar e o mindinho embaixo do queixo no sinal de desculpas, Jujubalândia.
A ressalva de Laura veio acompanhada de um sorriso macio da sua parte, do tipo que tem textura de nuvem e gosto de sol. Estava notadamente orgulhosa de mim por estar evoluindo tão rápido na Libras, bem como de si mesma pela sensação de ter seu esforço em me ensinar gestos novos ao menos uma vez na semana muito bem recompensado pelo meu avanço.
Sempre achei a Língua Brasileira de Sinais fascinante, essencialmente por romper a barreira do imaginário comum de que só se é possível passar informações pertinentes através de palavras. Perceber que o corpo é capaz de se comunicar de formas igualmente fantásticas, bem como sentir o mundo muito além da audição e visão, fez do meu universo mais bonito. E eu esperava poder fazer o mesmo com o de outras pessoas, também.
Laura se interessou pela Libras muito antes de mim, no entanto. Ela sempre foi defensora dos direitos dos mais diversos tipos de pessoas atípicas, de modo que buscava constantemente meios de tornar existências diversas mais confortáveis. Tinha consciência de que não conseguiria mudar o mundo inteiro, mas, embora isso a deixasse triste, nunca desistiu de tentar melhorar minimamente que fosse o seu mundo interno e aquele que era capaz de alcançar ao redor, realizando cursos gratuitos na Internet sobre diversidade e acessibilidade e sempre buscando se expandir em uma supernova de coisas bonitas.
No meu quarto, jazia nossa pequena bagunça composta por embalagens de doces, copos sujos de achocolatado e dois sacos vazios de salgadinho de Wasabi. Alguns livros e papéis com desenhos estavam espalhados ao nosso redor na cama, faiscando com os tentáculos de ouro que adentravam pela janela aberta. A música de Rubel que pulsava por cada articulação do cômodo servia para diminuir um pouco o barulho cacofônico de vitrola arranhada da minha própria cabeça.
Por mais que fosse minha melhor amiga, estava receosa de contar à ela o que acontecera no sábado com Romeu. Permanecia entalado na minha garganta feito um meteoro inquebrável, arranhando-me mais por dentro sempre que tentava pôr para fora.
— Ju, o que está acontecendo? — Laura rompeu o ruído nos meus ouvidos, seus cílios se apertando em frente às íris curiosas conforme levava sua barra de chocolate amargo até a boca.
Comprimi os lábios com força, sentindo-me inteiramente feita de estática.
Devagar, pressionei o indicador contra o centro do meu peito, sinalizando eu mesma em Libras. Em seguida, movi os dedos para representar o que queria que soubesse e fiz o sinal de Romeu, que consistia nos dedos indicador e médio ligeiramente abertos no ar em formato de tesoura apontados para meus olhos.
Ela engasgou com sua barra de chocolate, tossindo incontáveis vezes antes da crise cessar e suas orbes se estatelarem na minha direção.
— Você beijou o Romeu? — externalizou sua descrença hilária. — Você, a Senhorita Pinguim, que preferiria ser atingida por um fragmento de asteroide antes de se permitir ser romântica de novo?
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O Fantástico Mundo de Romeu e Julieta
Ficção AdolescenteJulieta Belmonte tem plena convicção de que a sua amizade com Romeu Martinelli não possui a mínima chance de se colorir. Com dezessete anos e várias experiências amorosas que foram um tremendo fiasco, a última coisa que Julieta queria era se apaixo...