14: Algodão Doce de Patins

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— Os discos castanhos têm formato de rio, sim

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— Os discos castanhos têm formato de rio, sim. — decretei, inclinando um pouco mais o rosto na direção de Romeu, equilibrada sobre meus patins amarelo-girassol enquanto mantinha as íris fixas nas suas, tentando desvendar o mistério da cor dos seus olhos que havia o encucado naquela tarde.

— Às vezes, parece que mudam de cor. — Torceu o nariz em uma pequena careta debaixo dos raios tingidos de ouro que caíam sobre nós. — Tipo, na luz da manhã são esverdeados, no pôr do sol ficam um castanho cor de lusco-fusco, e à noite voltam a serem verdes.

Dei risada, escorregando para o lado com minhas rodinhas debaixo dos pés, e fitei o amontoado de brinquedos esquecidos do parquinho infantil há poucos metros do calçadão em que estávamos, com suas estruturas de metal encaixadas no tapete de grama da praça deserta.

Já deveríamos estar perambulando pela cidade por pelo menos trinta minutos; eu com meus patins incríveis e Romeu com seu skate repleto de adesivos, rodopiando pelas ruas ensolaradas imersos nos nossos devaneios com o mesmo gosto do algodão doce que se expandia em nuvens cor de rosa na minha palma antes de eu devorá-lo quase por inteiro.

Levei-o à boca, sorvendo o último resquício todo aquele açúcar colorido, que se desmanchou na minha língua do jeito mais gostoso do mundo; porque soava, de alguma forma abstrata, como liberdade. Era o principal motivo de eu gostar tanto de andar de patins: aquela sensação de se estar pairando livre rumo a qualquer canto que eu quisesse.

Aproveitei-me do fato de que ao meu lado havia um dos inúmeros lixeiros engraçados espalhados pela cidade, na forma de um picolé gigante de plástico que parecia ser de morango, e enfiei o palito do algodão comestível na sua fresta frontal.

— Romeu, seus olhos são tão indefiníveis quanto você. — Soprei um riso, deslizando um pouco mais para trás, e enfiei as mãos no bolso da minha jardineira de calça, sentindo o jeans arranhar levemente as pontas dos meus dedos.

Ele ergueu a sobrancelha, deixando um sorriso meio sacana se repuxar em seus lábios. O gesto o deixou ainda mais inexplicavelmente bonito do que já estava, mesmo trajando somente uma calça jeans desbotada debaixo da sua jaqueta amarrada no quadril, uma camisa do Barão Vermelho e seu costumeiro par de tênis pretos, cuja sola não parava de chutar pedrinhas soltas pelo chão.

— Está tentando me seduzir, sra. Belmonte? — brincou, tão leve feito éter.

— No dia que eu der em cima de você propositadamente, pode ter certeza que tem algo muito errado com o mundo. — Imprimi o máximo de convicção possível à afirmação.

— Essa certeza eu já tenho há muito tempo. — Riu, levando a mão à nuca.

Comprimi os lábios com força, sentindo um ligeiro temporal de estrelas perdidas no peito ao fitar a vastidão espacial que se expandia no seu olhar.

Para não deixar essa sensação firmar raízes cósmicas capazes de perfurarem meu coração, tratei de desviar o foco dele, mirando as coisas que coloriam o ambiente ao nosso redor. E tive certeza que minhas íris reluziram logo que avistei os três balanços metálicos suspensos há poucos metros, na proporção que minhas células eram preenchidas de uma empolgação quase infantil.

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