01 • curativos de gatinhos e café barba ruiva

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— Desculpe, só tenho curativos de desenho agora – A enfermeira disse me mostrando uma caixinha vazia. — tem problema? 

Sorri e neguei com a cabeça. 

Ela colocou um curativo redondo cheio de gatinhos variados em meu braço, lugar que ela havia a pouco retirado uns seis tubos de sangue. Pediu para que eu pressionasse o adesivo colado por alguns segundos, depois me entregou uma folha para que eu pudesse pegar os resultados daqui dois dias. Agradeci e saí da sala de coleta. Tive um episódio de visão turva ao levantar, então respirei e tudo voltou ao normal. Provavelmente era pressão baixa por ficar de jejum e ter um tanto de sangue retirado do corpo. 

Passei a gostar desse hospital. Desci poucos lances de escada até o saguão onde deixei o crachá e me despedi do segurança que começou a me tratar com mais simpatia por me ver com frequência. 

Como já tinha perdido algumas aulas da manhã, decidi ir para a biblioteca da faculdade e esperar para pegar matéria com algum colega. Talvez Win pudesse me passar se tivesse anotado alguma coisa. O que era bem improvável, certamente. Na porta do hospital tinha uma banca de jornais que vendia alguns amendoins e coisas que podiam tapear a fome, como vou pedalando até a universidade, acho que devo pegar algo para não correr o risco de pacotar na rua pela glicose baixa. Comi alguns amendoins alaranjados e picantes enquanto empurrava o guidão da bicicleta. Observei o curativo no braço e dei uma risada. Começou a ficar frequente esse tipo de coisa: exames de sangue, testes respiratórios, de esforço, muitas consultas e episódios de sintomas físicos. Já desmaiei algumas vezes no trabalho, tenho algumas dores no peito, picos de pressão alta e cansaço. Haviam desconfianças, mas não me deram diagnóstico de nenhuma doença perigosa, achei meio mentiroso isso, mas só estou aceitando. 

A única coisa que eu sei é que tenho um coração frágil. 

Isso eu não preciso que ninguém me diga, ele mesmo me contou. 

Deixei a bicicleta e fui para a biblioteca. Pedi que Win me encontrasse lá, ele perguntou se estava tudo bem e mandei foto do curativo no braço. É claro que ele riu da minha cara. Mas disse que chegaria logo pra cuidar de mim. 

Bocó. 

Eu sei que não é saudável ficar procurando diagnóstico na internet, mas enquanto esperei, li inúmeras listas de doenças cardiovasculares e toda e qualquer coisa que envolvesse dores no peito. Já cogitei a ansiedade, mas confesso que me dou bem com ela há algum tempo. Meu médico também questionou sobre, então fizemos avaliações psicológicas e fui garantido de que estamos oito barra dez, o que foi bem curioso. Larguei os sites de medicina e coloquei fones de ouvido pra tentar dormir um pouco, já que estava nas últimas mesas da sala enorme cheia de livros, pouco provável de alguém querer me tirar dali. 

Dormi por uns trinta minutos antes de Win chegar. 

— Ei, Non, tá tudo bem? – Win largou a mochila na cadeira ao lado e passou a mão pelos meus cabelos. 

Concordei sem falar nada. 

— Como foi hoje? 

— Só tirei sangue — abri os olhos segundos depois e apoiei a cabeça no braço furado. Doía um pouco. 

— Estou preocupado, cara. Já tem quase um mês. 

— Não vou morrer, Metawin. — Fiz um sinal de positivo com a mão livre e ele deu um tapa. 

— Sem piadas, Korapat. Tá bem mesmo, tipo, pra ir trabalhar e tal? 

— Tô sempre pronto pra me apresentar como um pirata a cada dez segundos. 

"De um pirata, com amor" 🏴‍☠️Onde histórias criam vida. Descubra agora