Capítulo 3

84 8 6
                                    

  Dias se passam e o tão esperado baile finalmente acontece. Charlotte está linda em um vestido verde-esmeralda com detalhes delicados de renda. Eu soube que ela o encomendou direto da França.

Arthur havia mudado tanto a sua aparência que não o reconheci quando ele me abordou.

— Você está... tão diferente! É bom vê-lo após tanto tempo!

— Você também está... diferente. Seu rosto ainda é o mesmo, de uma menina. Mas, você amadureceu e está muito bonita, Beline.

— Gentileza sua, Arthur. Planeja ficar em Beaconsfield?

— Logo precisarei partir novamente, mas passarei algum tempo aqui.

— Fico feliz.

Charlotte nos interrompe com um assunto aleatório, e Arthur logo nos deixa a sós.

Na primeira rodada da dança, ela foi a primeira a ser tirada para dançar. Em seguida, Arthur me convida. Na segunda, outro rapaz me tira educadamente, e eu o acompanho com louvor, levantando o olhar curioso de Charlotte. No fim, nós nos apresentamos.

— Benjamin Halfenaked.

— Beline Wrigert.

— Seu nome me parece familiar.

— Mas é a primeira vez que o vejo.

Arthur se aproxima, com os olhos atentos e franzindo o cenho.

— Eu iria apresentá-los mutualmente. Benjamin, Beline é a melhor amiga de Charlotte. E Benjamim é meu velho amigo. Estamos juntos no mesmo posto.

— Agora, sim, eu sei de onde o nome da senhorita surgiu.

— Sim, sim. — Concordei.

— Ainda preciso apresentar outra pessoa a você, Beline, mas ele está por aí, fazendo Deus sabe o quê. — Arthur comenta.

— Não faltarão oportunidades, Arthur.

— Certamente.

A terceira dança se inicia, e eu abro meu leque para avisar que não estou disposta para dançar. Os rapazes me olham, mas não se aproximam. Isso me dá um alívio.

— Vou ao toalete, já volto. — Avisei à minha mãe, que estava de olho na dança ao lado do meu pai.

O casarão de verão dos Watson era digna de ser apreciada por dentro e por fora. Revestimento de mármore francês e pisos germânicos. O estilo, embora pareça ser sempre o mesmo, diferia de outros casarões de verão de Beaconsfield.

A família de Charlotte era um tanto excêntrica. Colocavam esculturas talhadas em gesso nos rostos de cada integrante Watson. No toalete, havia o rosto da tia Caroline próximo ao lavabo. Era tão assustador que tive receios de estar sendo vigiada de alguma pela escultura. Eu saí quase que correndo do toalete, sem olhar para trás.

Atravessei corredores e avistei a galeria pessoal, que abrigava diversos quadros e esculturas. Observo cada objeto, focando nos detalhes e na mensagem que passavam. Nas esculturas, havia vários desconhecidos e belas imagens sensuais. Em uma delas, um homem com um corpo bem trabalhado, da forma mais nua e crua que podia ser visto assim. Como eu nunca vi um homem nu na minha vida, fiquei curiosa com os detalhes. Observei as pernas, os braços, as nádegas, ombros, e claro, a genital, que para mim era algo muito estranho.

Tamanha era a minha curiosidade e tomando cuidado para não ser vista, toquei na genital da escultura, tentando entender o formado e imaginar como seria em um homem real. Com a minha falta de jeito e completo, o membro acaba quebrando na minha mão. Fiquei em desespero tentando colocar no lugar, mas não adiantava, aumentando minha tensão.

— Ou a senhorita está me seguindo, ou o destino é muito engraçado.

O mesmo homem que eu havia visto de farda por duas vezes, agora vestido elegantemente, surge ao meu lado.

Seguro o objeto quebrado escondendo-o atrás de mim.

— Não é uma coisa nem outra. Isso se chama acaso, porque estamos em um baile aberto para todos.

— Está em apuros de novo, senhorita?

— Estou segura... Obrigada.

— Por que a sinto tensa e preocupada?

— Você não me conhece para saber se estou... tensa e preocupada.

Ele me analisa.

— Espero que não tenha nada rasgado esta noite.

Comecei a suar e tremer, e não via a hora daquele homem me deixar sozinha novamente.

— Como eu disse, está tudo bem, estou... segura.

— Ótimo. Continue apreciando a arte sem a necessidade de tocá-la. Até mais, senhorita.

Dá uma piscadela e se vira, caminhando em direção à saída.

Sei que ele pode ter visto o que acontecido. Não, ele realmente viu, mas eu ainda tinha a esperança de ter passado despercebido. Mas por que ele sempre aparece nos momentos mais constrangedores? Deus estaria me castigando?

Larguei o objeto quebrado em um canto da escultura e me retirei o mais rápido possível da galeria, voltando para o salão. Torci ainda mais para não encontrar aquele homem de novo.

— Onde você estava? — Charlotte perguntou.

— Andando por aí.

Arthur e Benjamin se aproximam.

— Beline, estávamos à sua procura. — Arthur diz. — Gostaria de apresentá-la a um amigo. Venha.

Charlotte e eu o acompanhamos ao lado de Benjamim, que puxa assunto fazendo algumas perguntas sobre mim.

— Beline, este é Thomas, meu grande amigo.

Levantei os olhos e não acreditei.

— V-você...

— Como eu disse, senhorita, o destino é muito engraçado. Encontramo-nos de novo.

— Vocês já se conheciam? — Benjamin ficou surpreso.

— Na verdade, não. Apenas nos esbarramos algumas vezes por aí. — O homem me encara e sorri, com um toque de sarcasmo. — Sou Thomas Lancaster.

— Beline Wrigert.

Faço reverência e ele corresponde. Todos nos observam atentamente, como se fôssemos o centro da atenção.

— É um prazer finalmente conhecê-la. Arthur me fala muito sobre a senhorita.

— Espero que ele tenha dito coisas positivas ao meu respeito.

— Nada que a envergonhe, fique tranquila. — Outro sorriso com sarcasmo.

— É um prazer conhecê-lo também. Sr. Lancaster. Infelizmente preciso... voltar para o salão. Se me dão licença...

— Nós a acompanharemos, Beline. — Arthur avisa.

Caminhamos em passos largos, mas lentos o suficiente para ter a impressão de que o salão fica muito mais longe do que realmente era.

— Não imaginei que fosse encontrá-la aqui. — Thomas comentou.

— Tampouco eu encontrar o senhor. E cá estamos nós, presos numa coincidência que parece se repetir.

— Alguns filósofos dizem que o acaso não existe, tampouco coincidências, senhorita.

— Então você acredita no destino? Acredita que tudo já está escrito e predestinado?

— Já acreditei. Hoje eu não sei no que acredito mais.

— Então, o senhor estava na Marinha? Irá retornar com Arthur?

— Não sei. Ainda estou decidindo. Fui convidado para participar de outra missão, e eu tinha planos de criar raízes na cidade.

— Os seus planos mudaram?

— Não, meus planos são os mesmo, Lady Beline. Só as pessoas que mudaram.

BelineOnde histórias criam vida. Descubra agora