A noite estava gélida. A névoa cobria o grande palácio feito inteiramente de rochas creme. Dentro, era possível observar as criados correndo pelos corredores e escadas até a grande porta de madeira entalhada, que dava para os aposentos reais.
A rainha estava deitada na cama bem no centro do quarto e sentia fortes dores. Ela estava dando à luz ao tão esperado bebê.
O cômodo estava escuro, exceto pelo espaço que a cama de madeira real ocupava. Estava rodeado por velas que oferecia uma boa iluminação para a parteira.
A rainha estava sobre uma coberta branca de linho. Já se encontrava em trabalho de parto há pouco mais de meia hora.
O rei, um homem alto, de pele branca e cabelos ruivos como as árvores no outono, acompanhava tudo em um canto do grande cômodo, ao lado da janela, por onde entrava o vento frio de inverno que tomava conta do ambiente e vez ou outra ameaçava apagar a luz das velas.
Era possível ouvir os sons dos gritos da rainha por todo palácio.Todo o processo do parto durou em média uma hora. Era possível notar a empolgação das pessoas com a ideia de finalmente ter um jovem Príncipe, ou Princesa, correndo pelos corredores do castelo.
Perto da rainha conceber seu primeiro filho, ecoou no grande salão o som das portas se abrindo. O rei se prontificou, ágil como um raio, e pegou sua espada.Era normal receber visitas, principalmente quando se estava concebendo um filho. As visitas viriam de todos os cantos de Mooradian, e mais, de todo o Continente. Mas já era tarde para tais visitas, então era melhor se prevenir.
Mesmo não estando com trajes apropriados para uma luta, ele partiu em direção ao salão de onde ouviram o som.Quando o rei despontou na base da escada pode ter uma visão geral dos soldados prontificados. E bem à frente da porta estava uma figura alta, coberta pela neve, segurando uma grande espada.
Um homem.
Estava envolto por uma grande capa de cor cinza e alguns detalhes em amarelo, e um capuz que cobria todo seu rosto, impossibilitando de vê-lo.
Era possível perceber a confusão no rosto do rei, afinal nunca vira aquela pessoa.— Quem é você? — ele vociferou, mas o homem o ignorou. — Diga-me, quem é você, e o que faz em meu castelo? — o rei insistia, mas o homem continuava a ignorá-lo.
Em um movimento rápido, o homem de capuz sacou sua grande espada da cintura, a lâmina brilhava por conta das luzes do candelabro acima, a espada era tão esplêndida que parecia ter sido fundida e moldada pelos próprios Deuses. Os soldados do rei, sem pensar ou relutar, avançaram em direção ao homem que, com grande mestria, manuseava aquela espada de uma forma única.
Seus golpes eram precisos e mortais, pouco a pouco ele reduzia o número de homens do rei até que não sobrou um sequer vivo. O grande salão estava tomado pelo cheiro metálico de sangue dos soldados que jaziam ao chão.
Agora, entre o homem encapuzado, e a rainha com a criança que acabara de nascer, só restava o rei, e isso era o bastante para assustá-lo.O rei era um homem forte, talentoso com armas e esperto nas estratégias de luta, treinava desde pequeno e era um dos melhores soldados dos cinco reinos, mas o homem, que continuava a esconder o rosto, aparentava ter uma força sobre-humana e lutava como um verdadeiro Deus.
As espadas dos dois homens se chocavam e o som ecoava pelo salão, por um momento, o silêncio tomou conta de todo o castelo e só foi possível ouvir os passos precisos deles enquanto lutavam. Ambos possuíam grandes habilidades com luta corporal e de espadas, sabia o que faziam. Os golpes continuaram e se repetiam diversas vezes, mas por um descuido, o homem encapuzado conseguiu acertar o rei no rosto com o cabo de metal polido da sua espada, e ele foi ao chão.
O homem, que continuava a cobrir seu rosto com aquele capuz cinza, seguiu até as escadas, passou pelos corredores e parou frente a porta dos aposentos do rei. Ele não teve dificuldades em achar o cômodo, era como se, de alguma maneira, já soubesse onde se encontrava.
Parado de frente para a porta era possível ouvir a rainha cantar para acalmar o bebê, era uma linda melodia.
O homem de capuz excitou um pouco, mas nada poderia impedi-lo, e quando ele estava prestes a girar a maçaneta, o rei o surpreendeu, o rosto estava sangrando pelo golpe que levara no salão, o homem se virou, e sem chances para reagir o rei fez um corte em seu braço, mesmo por baixo da capa, era possível perceber que as expressões do homem haviam mudado, e então, novamente excitando, ele tirou o capuz.— Você! - o rei falou com um tom de surpresa e desaprovação, estava ofegante pelos esforços na luta — Por quê está fazendo isso?
— Eu preciso da criança — o homem, diferente do rei, estava com a voz séria, como se não tivesse feito esforço algum.
— Não entendo seus motivos, mas preciso que pare. — O rei estava tentando manter a diplomacia e a racionalidade, mas o homem não parecia gostar disso.
— Me dê o que eu quero... — ele estava centrado em cada palavra que proferia. — E você e sua esposa ficarão bem.
— Você nunca à terá! A não ser que me mate.
— Bem, parece que você não me deixa outra escolha.
— seu rosto estava sério, e os olhos estavam vazios, como uma escuridão sem fim.Com um único golpe, sem que o rei tivesse chances de reagir, o homem cortou a mão em que ele segurava a espada, obrigando-o a jogá-la para longe. O rei gritou de dor, e o homem que estava tomado pelo ódio o acertou bem no coração, e ele caiu ao chão já morto.
A espada do homem que antes era de um metal limpo, agora estava coberta pelo sangue dos soldados e do rei que ele havia assassinado. Ele limpou a lâmina em sua capa. Ainda estava de frente para o quarto, e agora sem ninguém para impedí-lo, ele recolocou o capuz, abriu a porta e entrou.
O cômodo continuava escuro, a rainha estava deitada na cama com seu bebê no colo, que agora já fazia silêncio, a bruxa que havia feito o parto estava de pé ao lado da cama, mesmo com tudo que acontecera, suas expressões eram sérias. A rainha olhou diretamente para o chão a frente do quarto e não conseguiu conter o grito de horror ao ver seu amado ali, sangrando pelo corte aberto em seu peito, lágrimas escorriam pelo rosto da rainha. A criança que fazia silêncio, se espantou com o grito e voltou a chorar mais alto do que antes, e a rainha sem pensar, olhou em direção ao homem que assassinara seu marido, e que agora já havia retirado o capuz que lhe cobria o rosto como se quisesse surpreender a rainha assim como surpreendeu o rei com sua verdadeira identidade.— Como você pôde? — era surpresa que predominava em sua voz, mas também decepção. O homem não esboçava nenhuma reação. Era nítido que ele não se arrependia de nada do que tinha feito, e do que ainda estava prestes a fazer. — Ele era seu amigo, ele confiou em você!
— Ninguém, — o homem se aproximava da cama onde a rainha se encontrava — minha doce Cattallea, vai me impedir de ter o que quero.
A rainha era esperta, sabia olhar não só o exterior de uma pessoa, mas também o interior. Seu mais profundo desejo.
— Você nunca terá a minha criança. — Ela tentava conter o choro, mas era inútil.
O homem já estava perto o bastante da cama, mas não empunhava sua espada. A rainha tentava se esquivar para trás com seu bebê no colo, e então voltou o olhar para a bruxa que ainda estava com as expressões sérias no rosto, parada no mesmo local.
O olhar da rainha era um olhar de súplica, implorando por ajuda. O homem também olhou em direção a bruxa, como se estivesse passando uma ordem. Sem pensar, a bruxa se moveu para o outro lado da cama se pondo próximo ao homem, e com um movimento simples das mãos, paralisou a rainha.Paralisada, apenas podendo ouvir e ver as coisas ao seu redor, a rainha teve seu bebê tirado de seus braços pelo homem e não pôde impedi-lo.
Era horrível não poder fazer nada enquanto ele tirava a criança dela. O bebê chorou mais alto dessa vez, de uma forma que todas as velas do quarto se apagaram.O homem seguiu até a porta onde estava o rei, ali ainda estava claro pelas luzes dos grandes lustres acima. A rainha tentava se mover mas o feitiço era forte demais, ela não podia fazer nada a não ser olhar seu bebê sendo levado para longe.
Em um último vislumbre de visão, a rainha sentiu uma dor em sua cabeça, como se sua mente estivesse se despedaçando e suas memórias estivessem sendo roubadas. A dor que ela sentiu foi insuportável e, antes de desmaiar, ela viu uma última coisa.
Algo que ela jamais poderia esquecer, mesmo em mil anos.A rainha viu, brutalmente, o homem cortar a pele imaculada de sua criança bem no local da garganta.
Viu o sangue jorrar e seu bebê morrer nos braços daquele homem, antes mesmo dele partir sem deixar qualquer pista.
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A Princesa Perdida
FantasyVallerye Exmoor nunca se preocupou com o fato de viver sempre dentro dos limites do castelo. Sua vida inteira fora rodeada por coisas que desejava, para assim compensar os anos presa entre aquelas paredes de concreto. Tudo muda quando um acidente e...