Cap. 4: Amizade Complicada

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O som insistente do despertador ecoava pelo pequeno apartamento de Guaraná, no Cachambi. Deitada no sofá, ela despertava lentamente, seus olhos ainda semicerrados, tentando identificar de onde vinha o ruído. O celular vibrava ao lado de sua cabeça, e com um suspiro cansado, ela o pegou, desligando o alarme.

Ainda era cedo. O sol tímido começava a iluminar as frestas da cortina, espalhando uma luz suave pelo ambiente. Ela sentou-se no sofá, esfregando os olhos, e ficou em silêncio por alguns segundos, sentindo o peso da noite anterior. O encontro com Johnny e Kimberly ainda estava fresco em sua mente, mas aquele era um novo dia, e ela tinha que seguir sua rotina.

Levantou-se com alguma dificuldade, o corpo ainda meio dolorido, caminhando em direção ao banheiro. Ao passar pelo espelho da sala, ela se viu com os cabelos desgrenhados e riu de si mesma.

— Você está um caco — murmurou, entrando no banheiro e ligando o chuveiro.

Enquanto a água quente escorria pelo corpo, Guaraná refletia sobre tudo que tinha acontecido nos últimos dias. Estar próxima de Johnny e Kimberly não era o que esperava, mas também não podia negar que estava se sentindo... diferente. Havia algo neles, algo que a fazia querer continuar por perto.

Depois do banho, ela se vestiu com rapidez, prendendo os cabelos ainda úmidos em um coque simples. O dia de trabalho a esperava, e ela não podia se atrasar. Tomou um gole de café rápido e pegou sua mochila. Ao sair do apartamento, uma brisa fresca a saudou. Ela deu uma última olhada para trás, fechou a porta, e seguiu seu caminho.

Do outro lado da cidade, no Engenho Novo, o alarme do celular de Kimberly soou às seis horas em ponto. O quarto estava escuro, exceto por um feixe de luz que atravessava as cortinas mal fechadas. Ela se espreguiçou na cama, sentindo o cansaço das últimas noites, mas levantou-se rapidamente.

Ela não podia se atrasar para a escola. Havia uma certa rotina que ela seguia todos os dias, mesmo que isso parecesse inútil para ela, afinal, sua mãe nunca estava em casa para notar. Kimberly não tinha escolha; a escola era uma parte da sua vida que, por mais banal, ainda mantinha as coisas em ordem.

Ela entrou no banheiro, tomando um banho rápido, deixando a água fria lavar os pensamentos pesados que a acompanhavam. Depois de se vestir, colocou o uniforme escolar por cima de um jeans, como de costume. Nunca gostou de seguir as regras à risca, mas também não queria chamar atenção.

Ao descer para a cozinha, percebeu que, mais uma vez, sua mãe não estava em casa. A mesa do café estava vazia, e o silêncio ecoava pela casa. Ela pegou uma fatia de pão, passou manteiga rapidamente e saiu, sem olhar para trás.

Caminhando pelas ruas do Engenho Novo, em direção à escola Padre Martin Madrazo, no Cachambi, Kimberly tentava afastar os pensamentos sobre como sua vida parecia estagnada. Era estranho pensar que Johnny, trinta e três anos atrás, havia frequentado as mesmas salas, as mesmas carteiras. E, agora, ali estava ela, vivendo o mesmo ciclo.

Na cabana escondida na floresta da Tijuca, Johnny estava acordado desde o amanhecer. Ele raramente conseguia dormir até tarde. As memórias, os rostos, as decisões que havia tomado ao longo de sua vida não o deixavam descansar. Sua rotina solitária era tão marcada quanto as cicatrizes em sua pele.

Decidido a fazer algo diferente, ele se levantou, movendo-se lentamente pela cabana. Era um lugar que já se tornara seu refúgio há tempos, mas, ultimamente, estava começando a sentir que a solidão estava pesando mais do que o habitual.

Ele foi até o banheiro da cabana, tirou as roupas e ligou o chuveiro. A água fria o atingiu como uma rajada, mas ele estava acostumado. Johnny raramente se permitia o luxo de uma água morna. Depois do banho, ele vestiu algumas roupas que estavam largadas por ali, mas percebeu, mais uma vez, o quão grandes elas estavam em seu corpo magro. Ele não tinha muito apreço por moda, mas não gostava de como as roupas pendiam sobre ele. Apenas um reflexo de sua própria condição.

Noites Sombrias: Volume IIOnde histórias criam vida. Descubra agora