C05 | Quinhentos

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Mas me fala o nome de alguém
Que te perguntou seu nome sem querer tirar sua roupa
E não quis se aproveitar quando estava louca.

Cuidado | DAY LIMNS

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Nylah

Aos nove anos, no tempo em que outras crianças iam para a escola, eu aprendia a tocar piano. Enquanto vibrava as notas do violino, assoprava uma flauta ou praticava canções, eu observava, pela janela, as crianças de idade idêntica voltarem rindo com grupos de amigos sorridentes. Lembro de tentar imitar o modo como mostravam os dentes na frente do espelho.

Cuspo a água do creme dental e vejo a espuma descer pelo ralo da pia. Respiro fundo. As lembranças descem junto com a água e deixo os lábios subirem no mesmo movimento decorado. Encaro o espelho. Sou incrível. Murmuro mentalmente. Aperto o mármore firme sob os dedos. Sou como aço. Brilhante e inquebrável.

Ajeito o vestido rosa bebê, puxando ele pelas coxas. Embora a cor fosse entediante, caia bem, e aquilo sim era importante. Retoquei a postura e sai do banheiro. Virando ao lado da cama, corri os olhos pelos lençóis ocupados por um homem que não me dei ao trabalho de saber o nome.

Poderia chutá-lo para fora do colchão, mas ainda tenho um pouco de consideração pela noite passada, então espero que acorde. Os braços tatuados agarram o travesseiro quando ele senta. Estou desamarrando o coque frouxo do topo da cabeça no segundo em que seus braços rodeiam minha cintura.

— Bom dia. — Diz numa voz grogue. Solto suas mãos de mim, controlando uma careta.

— Por que ainda está aqui?

— Peguei no sono. — Ele aumenta a distância, pegando suas roupas pelo quarto. Quero que vá logo embora. — Não vai acontecer de novo.

— Tenho certeza que não. — Solto. Sem remorso. Espalho meu óleo de cabelo nas mãos e vou passando os dedos pelos fios. O silêncio no quarto diz muito sobre o quanto ele entendeu. Não me importo.

Vejo seu reflexo vestir as calças com raiva. Um punhado de chupões pinta uma mistura confusa junto às inúmeras tatuagens do seu dorso. Cutuquei as unhas um pouco mal humorada. Eu deveria ter ficado com o outro cara, não tenho um fetiche tão grande assim por tatuagens. Principalmente essas, que não pareciam significar nada além de cobrir pedaços de pele em branco.

Fiz uni-duni-tê com os batons. Vermelho, vinho, roxo, violeta, rosa. Parei num nude e destampei devagar. Vagarosamente, passei a ponta pelos lábios, assistindo ele terminar de arrumar a roupa.

— Você é exatamente como imaginei. — Cuspiu.

Os cantos da minha boca ergueram. Deixei um sorriso presunçoso escorregar pelo espelho.

— Gostosa?

Como um vulcão, seu temperamento explodiu. Não pude evitar de comparar os olhos raivosos e o rosto vermelho com as íris douradas e sólidas, o rosto duro e difícil de decifrar. Bradfort não era fácil de irritar como esse homem ridículo na minha frente. Comparado a ele, parecia até patético.

— Uma vadia desgraçada.

Dei uma risada baixinha.

— Isso também.

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— Vá mais rápido, anjinho. — Inclino-me na sua direção. O nariz tocando a parte de trás da orelha. Senti ele arrepiar. — Ainda não é suficiente.

Acima do VermelhoOnde histórias criam vida. Descubra agora