C08 | Guarde as garras

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Todos os demônios estão se aproximando, não.
Outra rodada trocando tiros
com meu ego.
Correndo, você não pode
me ajudar agora.
Suas correntes apenas me arrastam para baixo.

The Fear | The Score

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Leif

Com os pés presos ao chão, assisti, inerte, o sangue escorrer pelo crânio perfurado. Nada que não tenha visto. Nada que não tenha feito. E mesmo assim meus ossos vibraram, recusando-se a sair do lugar.

— Conserte para mim! — Jane implorava entre as lágrimas gorduchas que lhe escorriam pela bochecha. — Foi sem querer... Foi sem querer!

As peças da caixinha de música amontoavam numa pilha disforme. A saia da bailarina meio quebrada e a cabeça totalmente separada do corpo.

Uma caixinha de música completamente destruída. Impossível de montar de volta. Mas mesmo assim... Aquelas lágrimas brilhantes.

Conserte para mim. — Murmurou, o choro embaralhando as palavras. — Por favor.

Então comecei a juntar as peças.

Talvez tenha sido aquele sorriso. Sombrio. Medonho. E entretanto vazio. Selvagem e letal, mas vazio. Peças quebradas soldadas nos lábios vermelhos.

Recuei um passo para me impedir de chegar mais perto. Com as sobrancelhas franzidas lutei contra a vontade de avançar por causa da compreensão. Não era sua primeira vez. Julguei que a mulherzinha narcisista na minha frente nunca tivesse chegado perto de sangue. No entanto, Nylah já matou antes. E despedaçou no processo.

Escutei mais do que vi, o corpo curvilíneo sair pela porta. E num impulso burro, fui atrás dela. Meu peito apertou ao ouvir o barulho dos saltos, como uma melodia desesperada, baterem no chão brilhante quando ela começou a correr.

O corredor, o barulho de outra porta fechando. Cheguei ao batente rápido e silenciosamente. A madeira polida acariciou meus dedos, como num sussurro para que eu a abrisse.

E agora, com ela nos braços, não consigo sequer lembrar como cheguei a essa posição. Nylah só se mostrou tão frágil e acabei agindo por impulso. Quente. Seu corpo era quente e inesperadamente pequeno.

Solte, idiota. Cada neurônio do meu cérebro gritava em alerta. O’Connel tentou me matar. Porra, enfiou uma faca em mim. O ser humano trêmulo e cheio de curvas em minha posse é a pessoa odiosa que comanda seja lá qual for essa máfia imunda. Como uma serpente traiçoeira, ela sorri enquanto consome todo pensamento racional com aquela pose inabalável.

Não completamente inabalável.

Ela inspira rápido demais e com o tremor dos seus dedos na minha camiseta, reconheço o controle esvaindo-se das mãos trêmulas. Todos os meus músculos tensionam. Foda-se. Agora tanto faz.

Escorrego as costas pela madeira, trazendo-a junto comigo para o chão. Parecendo um filhote atordoado, ela permite o movimento, acomodando-se mais em meus braços. Dobro os joelhos, numa posição confortável. O piso frio diz olá para nós em contraste com as peles quentes. Suspiro. Caralho, eu realmente não devia estar acalmando meu alvo de assassinato.

— Nylah — É a primeira vez que digo seu nome em voz alta. Tem um gosto estranho na língua. O mesmo gosto da bebida que usou para me dopar na nossa primeira conversa. — Que tal um jogo?

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