Sem acordos

121 39 4
                                    

Tinha sido um dia memorável, depois de muitas risadas de Briana e piadas de Pria, eu tinha conseguido progresso no lago. Claro que eu não morreria afogada, mas aprender a nadar era um desejo que eu nem sabia que tinha, só descobri essa vontade quando vi os lobos lá, brincando, jogando água um no outro.

E foi justamente o que fizemos, brincamos, rimos, e eu tive minha primeira experiência de tomar banho livremente.

Não tinha como voltar atrás, agora uma banheira com água não me atraía mais, e mesmo que para eles fosse algo natural, para mim ainda era um pouco difícil, então mesmo um pouco afastada dos outros, e ainda sentindo vergonha por me verem nua, eu não abria mão. Meus banhos passaram a ser no lago e isso estava me fazendo um bem imenso.

Meu único problema aqui, eram os segredos. Eles não existiam, todos sabiam de tudo. Até mesmo o motivo de eu ter desmaiado.

Começava a sentir raiva de Laican, não sabia que ele era tão fofoqueiro.

Decidi então que estava na hora de lhe dizer justamente isso.

Era tardezinha quando o vi. Estava sozinho, agachado e pelos movimentos parecia estar lavando algo.

Meu coração acelerou e minha mente me enviou inúmeros motivos para não ir até ele, mas minha parte racional não tinha mais poder sobre mim.

Quando me aproximei ele não parecia me notar, mas eu sentia que ele estava consciente de minha presença.

Fiquei um instante surpresa por ver que ele estava lavando algumas calças.

— Deixe que eu faço. — Ofereci, incomodada por ele estar fazendo trabalho doméstico.

— Porque? — Ele perguntou sem levantar os olhos.

— Você é o supremo alfa, tem muitos aqui que poderiam fazer isso. Deixe-me fazer.

Ele riu. — Se foi eu que usei...

Por um tempo ficamos em silêncio. Ele torcendo a peça e a largando de qualquer maneira na pedra para secar e eu cutucando cuidadosamente o chão com um graveto, torcendo para que ele resolvesse arrumar melhor aquelas roupas para que o sol pudesse fazer sua parte.

Mas não tinha sido para ficar divagando que eu tinha ido até ali, então antes que perdesse a coragem, soltei de súbito.

— Porque você contou para todo mundo?

Ele parou, me olhou brevemente e voltou a se concentrar na calça.

— Não contei, não de todo, mas eu tinha que explicar porque você desmaiou para Jena.

— Ah. — Cisquei mais um cantinho úmido de terra, com força demais para ser natural. — Todos sabiam. — Reclamei e ele riu.

— E isso te incomoda?

— Na verdade, é um sentimento ambíguo, mas porque você disse aquilo?

— Que te amo?

Meu coração palpitou de tal maneira que fiquei com medo de apagar de novo. Nervosa, olhei para todo lado e chiei. — Não fale tão alto.

— Porque não? Não é segredo. — Ele me ofereceu um sorriso tão lindo que me deixou muda. — Eu não tenho nada a esconder. Nem tenho do que me envergonhar. Amor é um sentimento que deve ser falado, sentido e aguardado. — Ele torceu a roupa de forma desajeitada, balançou com um safanão e jogou por cima das outras.

Torci os dedos maluca para arrumar aquilo. Do jeito que estava não ia secar direito e ainda ia demorar muito.

Laican sentou ao meu lado e retesei o corpo. — O que mais te incomoda? Eu ter dito que te amo ou todos saberem disso?

— Nenhum nem outro, eu só... parece loucura, é que eu não sou a mesma de antes, eu mudei e não foi para melhor. — Limpei a garganta ciente de que começava a me embaralhar com as palavras. — O que eu quero dizer é... porque você gostaria de uma pessoa como eu?

Ele suspirou e focou os olhos no lago. — Não existe esse tipo de coisa aqui, Celi, você é você. É uma pessoa como você que eu amo. E não se encolha todas as vezes que ouvir. Deve haver um jeito certo de amar em outras raças, mas aqui simplesmente é assim. E me considero um dos sortudos.

— Mas e se...— olhei para ele de canto. — Veja, e se... a gente tentasse.

Ele olhou para mim e levantei as mãos. — Não... digo... e se.

— Eu entendi.

Eu tinha certeza que ele estava surpreso, mas era invejável o quanto ele conseguia manter a calma, por outro lado eu estava uma pilha de nervos.

— Olha Celi. Eu seria o homem e o lobo mais feliz do mundo, somente por esse se... que você diz.

— Mas como isso funcionaria? — Perguntei já me sentindo ridícula porque se era eu que estava propondo isso então deveria ser eu a explicar.

Ele abriu um sorriso preguiçoso, me olhando com aqueles olhos brilhantes. Era tão lindo que eu poderia morrer ali mesmo, com o fome e com sede somente para admirá-lo.

— Não faço ideia Celi, mas eu aceito se me pedir para ficar longe, se pedir para ficar perto. Os termos são seus, eu tenho certeza do que sinto, e não me importo nem um pouco de expressar meus sentimentos, mas sei que em seus costumes é complicado, ainda mais para uma mulher.

Assenti grata por ele me entender, mas também triste por praticamente continuar a mesma Celina de antes, a mesma prisioneira, só que agora a carrasca dessa prisão, era ninguém mais ninguém menos do que eu mesma.

— Preciso que me ajude com isso. — Pedi, sentindo vergonha por ser tão boba.

— O que quer que eu faça?

Levantei, limpei uma sujeira invisível do vestido para não precisar olhar para ele.

— Pode me ensinar.

— Não.

Levantei o olhar para ele, agora confusa. — Mas...

— Você não precisa ser ensinada. O amor é algo natural, então deve acontecer naturalmente. E para mim ele continua intenso, como foi desde a primeira que a vi. Nada mudou quanto a isso. Então tome o tempo que precisar, estarei aqui quando quiser, nunca me verá reclamar, nunca ouvirá de mim uma cobrança, sou um lobo Celi, serei fiel aos meus sentimentos, e a minha companheira. Não há necessidade, de acordos entre nós.

Então ele levantou e meu coração se agitou por ele estar tão perto. Eu poderia arriscar agora, levantar as mãos e pousar em seu peito, sentir os músculos definidos e o calor que desprendia de sua pele. Poderia simplesmente abraçar sua cintura e fechar os olhos esperando o destino cuidar do resto. Mas não fiz nada disso, fiquei ali parada e ele abaixou para nivelar seus olhos com os meus. — Só não se afaste de mim, e nunca me verá virar as costas para você.

Antes que eu pudesse falar qualquer coisa ele me puxou para perto e beijou minha fronte.

— Estarei por perto, sempre estarei perto.

Sem dizer mais nada ele se afastou, deixando as calças todas desarrumadas.

Com os olhos cheios de lágrimas e completamente emocionada peguei todas elas e as arrumei nas pedras. Todas calças puídas, mal lavadas e então sorri quando vi a barra de sabão largada ali.

Me senti por ter algo para me distrair.

Laican era desleixado com suas coisas, voltei a pegá-las novamente e fiquei feliz por poder cuidar dele, mesmo que fosse lavando sua roupa tudo de novo.

_____

U.U

Tratado dos Párias - Supremo Alfa.Onde histórias criam vida. Descubra agora