Ainda que meu corpo me causasse tristeza, foi meu rosto que fiquei mais tempo observando pelo espelho. Uma cicatriz fina e branca começava no canto do olho esquerdo e descia em diagonal cortando a bochecha e, por fim, seguia pelo pescoço parando na clavícula.
Apesar de antiga e quase apagada essa cicatriz era diferente das outras, eu a considerava o marco do meu tormento, pois a ganhei quando fui usada a primeira vez.
Eu tinha dezessete quando meu pai decidiu entreter seus convidados mediante um bom pagamento da parte deles e muito boa vontade da parte dele em cobrar o valor justo pela primeira vez de sua filha.
Não lembro o nome, sequer o rosto eu lembro, mas era um homem de posses e foi o primeiro de muitos, me tratou como se eu pertencesse a ele e de fato eu pertencia mesmo que fosse uma parte minha e por uma única noite.
Inocente das consequências tentei preservar o que me era caro, pois tudo o que eu tinha de meu era meu corpo, mas entre uma surra e outra ele me lembrou que eu não era nada senão um produto que ele pagou caro para possuir.
Durante minha luta para preservar a dignidade eu não sentido dor, mas quando o cansaço me venceu eu senti a bochecha queimar e percebi que ele tinha cortado meu rosto. Foi um choque e quando ele viu meu desespero me garantiu que se eu não ficasse quieta o próximo corte seria mais fundo e ele ia me usar mesmo que eu estivesse morta.
Eu acreditei, não tinha como não acreditar, então com o rosto encharcado de sangue e os olhos nublados de lágrimas eu fui usada naquela noite. Várias e várias vezes.
E depois disso, dessa amostra do que eu sofreria, eu nunca mais arrisquei lutar com um cliente de meu pai.
Por um tempo eu ainda tentava, choramingava e implorava, mas nunca funcionou, mulheres não recebem piedade, está na lei e sem ninguém a quem recorrer a apatia começou a ser minha arma.
Quanto mais homens me compravam menos eu me importava com o que faziam comigo, passei a lhes oferecer apenas o silêncio, nem minhas lágrimas eu entreguei, pois passei a valorizá-las, só me restavam elas como algo de meu e as mantendo dentro de mim, estariam protegidas desses imundos.
E esse meu passado me transformou em alguém diferente tanto física quando emocionalmente, e para me acostumar procuro diariamente meu reflexo no espelho. Isso me ajuda a lembrar de que a Celina que vejo é livre, mas não é mais a de antes.
Nem muros tão altos ou portões tão sólidos conseguem me proteger, pois lembranças não respeitam obstáculos, por vezes sou assaltada com a lembrança de um rosto, de um grunhido de prazer, de um cheiro ruim de um corpo em cima do meu, infelizmente e por mais que eu tente, não consigo fugir disso.
Reviver esses dias de tormento é mais forte do que as tentativas de esquecê-los e está entranhando de tal maneira dentro de mim que mesmo que eu lute, que tente pensar em outra coisa, as lembranças me dão um forçoso bom dia, me visitam diariamente para me lembrar de quem eu sou e porque não posso almejar um recomeço.
Sou algo quebrado, usado e com um passado que não pode ser escondido porque foi escrito em meu corpo.
Preciso repetir isso constantemente para não sonhar com Olhos amarelos...
Por muitas vezes, em momentos de sofrimento sonhei com ele, e esses cenários hipotéticos eram meu alento.
Sonhei que ele viria me buscar, que me olharia com aqueles mesmos olhos incríveis e encantadores de outrora, que diria que me esperou e me procurou e que eu continuava linda, porque ele tinha dito que eu era linda, mas não mais posso sonhar com isso, Olhos amarelos é algo que devo deixar para trás, não há mais beleza em mim, e essa liberdade também levou meus sonhos.
Eu sempre soube que ele estava distante, mas agora ele é apenas um sonho bom, porém nada mais que um sonho perdido, porque o tempo passou, as coisas mudaram e eu nunca soube seu nome, tudo o que eu sabia sobre ele se perdeu em mudanças que eu não acompanhei, então mesmo que quisesse não conseguiria informações sobre seu paradeiro.
O som de risadas me tirou de meus pensamentos inquietantes e suspirei agradecida por isso. Cansada de remoer essas perdas, levantei e peguei minha caixa com materiais de pintura.
O líder da vila continuou sentado placidamente, mas eu não queria mais companhia, deixando o cavalete para trás retorno ao meu quarto, fecho a porta e deito.
Talvez dormindo o dia passe mais rápido e amanhã...
Amanhã talvez possa ser um dia melhor.
Capítulo curto né gente. Mas a vantagem de postar aqui é que o autor fica crítico com o próprio capítulo antes de postar e acaba fazendo um copidesque forçadão hsuahsuahuha
Então fui cortando aqui e ali e ficou desse tamanho u.u
Mas é isso, obrigada viu gente, vocês são uns amores. Amo vocês, e sou muito grata por ter vocês sempre comigo.
Até qualquer hora, porque se der a doida trago outro cap antes da semana que vem, maaas se der a louca e eu conseguir um tempinho nessa correria por emprego. Tempos difíceis!
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Tratado dos Párias - Supremo Alfa.
FantasyCelina estava lutando para se encontrar. Após anos fechada em seu próprio mundo e dependente da droga que sua mãe lhe dava, ela estava determinada a recuperar os anos que perdeu, porém suas cicatrizes não lhe permitia ter esperanças no amor. Mas o...