Extra: Dream

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Cameron pov's



Eu tinha 99% de certeza que vivia um sonho, pois, afinal de contas, minha última lembrança era ter dormido ao lado de minha esposa em nosso quarto. Sem contar que desde as mortes de Taylor e Sofia eu não pisava na fazenda onde praticamente fui criado ao lado da minha irmã. Não que eu achasse o local amaldiçoado por ter sido frequentado por todos os meus parentes mortos, apenas evitava as lembranças felizes e o amargor trazido por elas. Eu não queria uma lembrança do quão miserável minha vida costumava ser ou poderia ficar caso eu perdesse meus bens mais preciosos: minha esposa e filhos.

Olhei em volta, notando que estava mais precisamente em um antigo campo onde brincávamos de jogar beisebol quando crianças. Uma neblina fantasmagórica encobria boa parte do campo, impedindo-me de ver muito além.

Enquanto pensava em como havia parado ali, senti algo bater na minha cabeça. Atordoado, olhei para o chão, encontrando uma bola de beisebol velha. Peguei aquela bola, reconhecendo-a de imediato. Era a bola antiga que Sofia e eu usávamos em nossos jogos, autografada por um dos jogadores da liga americana preferidos de nosso pai.

–Dá para passar a bola ou está difícil? –Uma voz fina, memorável, disse atrás de mim. Virei-me abruptamente, deparando-me com uma baixinha de cabelos escuros, espetados, trajando uma roupa de beisebol rosa.

Meu coração perdeu uma batida.

Lá estava ela, de pé, parecendo saudável e feliz. Quando a bola escapou da minha mão, indo ao solo, foi ela que se aproximou e juntou a bola. E enquanto eu a encarava, bestificado por ver alguém que jurei estar morta, ela continuou me encarando com diversão, esperando que eu me manifestasse.

–Impossível... –Murmurei abismado. Enquanto isso, minha cabeça trabalhava a mil, relembrando o dia em que perdi de uma só vez o meu cunhado, Taylor, e minha única irmã... –Sofia.

Ela sorriu, travessa, andando vagarosamente e rodeando-me.

–Você não mudou nada. Continua boa pinta. –Parou de frente para mim. E eu ali, estático, sem saber como lidar com aquele fato. O que era tudo aquilo afinal? Minha irmã estava morta! Como poderia ela estar de pé, sorridente, após ter sido vítima de um acidente letal de carro?

–Isso é um sonho. –Afirmei, percebendo então a estranheza dos fatos. Eu não me lembrava como cheguei até ali, o local parecia estranho demais aos meus olhos e minha irmã morta estava de pé diante de mim.

–Claro que sim seu cabeção! Não tenho vocação para assombrar ninguém, não bonita como eu sou! –Estufou o peito, caminhando como um pavão que exibia suas belas penas. Era tão Sofia! Aquela era ela, talvez apenas uma imagem fabricada pelo meu subconsciente, nada mais.

–Mas o fato de ser um sonho não significa que eu não esteja aqui de fato. Fico feliz por este encontro maninho, pois eu precisava falar com você. –Sentou-se no gramado, úmido graças à temperatura que parecia ser baixa. Estranhamente eu não sentia frio, muito embora estivesse apenas de camisa e calça de moletom. Sentei ao seu lado, sem conseguir encará-la. Olhei para frente, onde não se podia ver muita coisa graças à espessa neblina.

–O que quer conversar? –Perguntei, tentando conter toda a agitação que ameaçava me engolir. Eu não queria bancar o racional e analisar o que acontecia ao meu redor. Era mais fácil levar tudo na esportiva.

–Tenho observado você e a sua família. Fico feliz que tudo esteja bem. A Lauren está muito feliz e os pimpolhos crescem felizes e saudáveis. E definitivamente não estou possuindo sua filha. –Ela bufou audivelmente. –Ela não odeia você. Se às vezes está emburrada quando você se aproxima é porque ela está com raiva.

–Raiva? Por quê? –Perguntei curioso. Minha filha Sofia, com dois aninhos, sempre foi o oposto do irmão Taylor. Enquanto meu filho era bastante carinhoso comigo, Sofia parecia sempre aborrecida quando eu estava por perto, preferindo ficar mais com minha mulher a ficar comigo.

–Ela o ama demais e fica aborrecida por que você não passa muito tempo com ela. Por isso age daquela forma. –Sofia deu um forte tapa na minha nuca. –Seu idiota!

Um vento forte nos atingiu, mas nada conseguia dissipar a névoa que encobria a fazenda. Enquanto o tempo passava e a letargia pelos fatos ocorridos desaparecia, eu percebia que, sendo sonho ou não, era a minha irmã ali ao lado. Ao invés de abraçá-la como eu queria e dizer tudo o que mantive guardado desde a sua morte, coloquei minha cabeça nos joelhos e chorei como uma criança.

Sofia não me repreendeu ou gracejou pelo meu ato. Ao invés disso, acariciou meus cabelos com uma mão, tentando me confortar. Passamos longos minutos dessa forma, até ela sentir a necessidade de dizer algo.

–As coisas aconteceram do jeito que estava previsto.

–Eu não gostei desse rumo. Queria todos vocês de volta. Eu os amo. –Pedi como uma criança birrenta a minha irmã, mesmo sabendo que ela nada poderia fazer. Sofia passou a afagar minhas costas e pelo silêncio em que se encontrava escolhia bem as palavras que diria. Ela, como imaginei, não me decepcionou.

–Também amamos você irmão! Mas todos nós temos uma missão aqui e vivemos para ela. Quando essa missão é cumprida chega a hora de partirmos. Não me sinto triste por ter partido, não mais. Agora eu entendo por que isso aconteceu e aceito. Você também deveria aceitar. Deveria deixar de lado toda essa angústia que o atormenta e o impede inclusive de gozar dos prazeres que a vida quer proporcionar a você. Sei que evita os locais onde vivemos boas recordações e eu quero que evite isso o quanto puder. –A pequenina mão parou de acariciar minhas costas e senti Sofia se levantar.

–E você deveria dar atenção a coisas muito mais importantes! –Esbravejou subitamente, socando-me do ombro enquanto eu me levantava do gramado úmido. O bom humor de minha irmã era contagiante e logo minhas lágrimas e a dor em meu peito desapareceram.

–Que coisas seriam essas, baixinha? –Zombei dela, vendo o rostinho bonito crispar-se em irritação. Tão logo Sofia se recuperou eu a vi sorrir de um jeito misterioso, como se estivesse me escondendo algo.

–Como sua mulher. Nesse momento ela está precisando de uma força e você acordará em 5... 4... 3... 2... 1... E mais uma coisa...

Eu acordei.

A desorientação me manteve na cama por alguns minutos, até eu perceber que sonhara até então. Tateei a cama, não encontrando minha esposa. A luz do toalete estava ligada e rumei para lá, estacando ao vê-la ajoelhada diante do vaso sanitário enquanto vomitava. Me apressei em acudi-la, aflito por vê-la naquele estado. Desde que perdi todos os meus parentes tenho sido muito protetor com minha esposa e filhos, beirando a obsessão.

–Meu amor, o que houve? O que está sentindo? –Segurei seus cabelos gentilmente com uma mão enquanto com a outra afagava suas costas. Lauren parecia esperar para se recompor, respirando pausadamente.

–Não sei querido. Ando sentindo enjoos. –Confessou, permitindo que eu a aconchegasse em meus braços para levanta-la e levá-la à cama. E quando Lauren disse isso, lembrei do que Sofia, em meu sonho, dissera antes de tudo se dissipar...

"... desta vez o nome dela será Luna Sinuhe.".

Após deitar minha esposa, que parecia exausta, em nossa cama, cobrindo-a com o edredom, toquei seu ventre, sentindo algo que não poderia definir.

Eu sabia, e sentia, que tudo o que vivera minutos atrás não havia sido um sonho. Algo crescia no ventre daquela que eu amava, trazendo ainda mais felicidade para o nosso lar.

Enquanto sentia a garganta apertada, beijei o rosto sonolento de Lauren Cabello, pensando que, afinal, eu havia encontrado a verdadeira felicidade.

The ContractOnde histórias criam vida. Descubra agora